Direito Alternativo e Hermenêutica

Direito Alternativo e Hermenêutica

Tem o jurista o papel de transformar a realidade sócio-jurídica, através da defesa de comandos jurídicos que promovam a dignidade da pessoa humana. Para isto, pejorativo que o jurista não caia na tentação da neutralidade diante do sofrimento humano.

O jurista tem um papel transformador da hodierna realidade socio-jurídica do país. É ele que tem a obrigação de defender a utilização dos tratados internacionais referentes à defesa da dignidade humana, a Constituição-Cidadã e as legislações pátrias correspondentes aos direitos e garantias fundamentais em favor da população, que jaz há tempos relegada à miséria e à exclusão social.

Mas isto só será possível com determinação e coragem em enfrentar os obstáculos por quais se submetem aqueles que tentam ultrapassar ou interpretar as entrelinhas das normas cogentes. A hermenêutica é a arma que a população tem no jurista. Uma valiosa arma que depende da decisão do advogado, do promotor, do magistrado, dos desembargadores e ministros de Tribunais Superiores, em optar: ou pelo seu ‘sossego patrimonial’ ou pela sua ‘intranqüilidade psicológica’; pelo Ser ou pelo Ter.

Algumas mudanças já estão ocorrendo, é como podemos observar em decisões dos pretores gaúchos, dos juristas catarinenses, e de alguns juizes pelo país afora. Quando se fala em ‘Direito Alternativo’ já se conquista um voto favorável e um cético contestador. Realmente há muito desvirtuamento do que definitivamente seja o alternativismo jurídico.

Entretanto, o que se observa é que não há nada de alternativo, a não ser a utilização de um direito existente, mas que até então era visto como uma utopia. Utilizar, por exemplo, o art. 5º de nossa Carta Magna de 1988 em sua íntegra, até hoje é considerado para muitos um absurdo, pois é o mesmo que transformar o Brasil no ‘País das Maravilhas’. Isto está mudando, os juristas de punho estão atentos aos desmandos e sofrimentos que a sociedade, em especial a da classe baixa, está passando, se submetendo às mais diversas desumanidades possíveis. Já se aplica e se decide com o uso alternativo do Direito.

Mas o direito orgânico ao qual concebemos, e que pode ser observado nas diversas obras sobre o tema, nada mais é do que o uso e aplicação efetiva da Constituição Federal e de legislações promotoras da defesa do cidadão.

O país padece pelo seu retardamento social em especial da sua conscientização de cidadania, e por vir impulsionado na década passada por uma molecularização de avanços jurídicos, é que está trazendo uma revolta de alguns conservadores e um temor aos detentores do poder, mas que, de outro lado, está promovendo uma esperança à sociedade já sacrificada por demais.

O direito alternativo não pode ser encarado como uma anomia ao Direito Brasileiro, não é um ramo isolado, até por que já se torna presente nos países europeus como França (Sindicato da Magistratura Francesa), Itália (Magistratura Democrática Italiana), Espanha (Juizes para a Democracia),... o que temos que atentar é quanto aos reflexos do que este direito orgânico vêm trazendo em seu bojo. O direito alternativo pode ser encarado como um grito de ‘basta’ dos juristas conscientes que partiram para uma atitude de ação, ou melhor, ataque, um combate às atitudes e decisões que geram a exclusão social, o desrespeito à dignidade humana, a inobservância dos direitos e garantias gerais do homem, etc.

As críticas ferrenhas são de que o magistrado não tem autonomia para legislar, pois não é constituído pelo povo para que exercesse tal função. Sim, nem alguns dos ditos ‘alternativistas’ discordam disto! Lembremos sempre que leis são feitas pelos parlamentares, contudo são aplicadas pelo jurista, e não pelo deputado (federal e estadual), senador ou vereador! Não se está falando em legislar, mas em interpretar, a questão não é de conflito e abuso de poder, mas de hermenêutica e cidadania.

Se observarmos por exemplo o art. 126 do CPC e 8º da CLT, entre outras codificações que atendem ao comando dos arts. 4º e 5º da LICC, veremos que o juspositivismo vigente determina que o magistrado seja livre e esteja atento aos clamores sociais, aplicando a lei com eqüidade e justiça, afim de atender o bem comum e social. Se somarmos tais disposições normativas com as cláusulas pétreas mencionadas na CF/88, veremos que é possível aos magistrados agirem sem tomar como único caminho a lei fria, morta e perversa. Aonde está a legislação ou pretensiosa ditadura judiciária? Em lugar algum! Apenas há uma hermenêutica jurídica, que pode até pecar por deixar a plena imparcialidade pela decisão pelos oprimidos (que diga-se, nem sempre é o hipossuficiente), mas dentro do que a própria lei, do que o próprio legislador permitiu.

Concluí-se que não bastam ‘documentos universais’, normas pátrias, e todo o tipo de legislação que assegure os direitos fundamentais a todo cidadão se não houver uma mudança no agir dos juristas, questionando, propondo, interpretando as normas frias, arcaicas e insensíveis, num profundo trabalho hermenêutico. Igualmente não se obterá a plenitude da eficácia dos direitos fundamentais se a sociedade não se mobilizar, não exercer sua cidadania conscientemente, e não apenas quando impulsionada pela mídia para isto.

Salientamos por fim, que os acadêmicos de Direito exercem também a função de serem conscientizadores da classe universitária para o respeito à dignidade humana, pois é dos bancos universitários que sairão os novos dirigentes e profissionais ativos de nosso país, e é através da conscientização da “elite intelectual” que por meio da cidadania poderemos, num futuro próximo, vislumbrarmos a enorme árvore da “eficácia aos direitos fundamentais de cada brasileiro” que foi (ou deverá ser plantada) “no dia de hoje”!

Sobre o(a) autor(a)
Alexandre Sturion de Paula
Mestre em Direito Processual Civil pela UEL.
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