Decisão reconhece responsabilidade objetiva da Uber por acidente que vitimou motorista do aplicativo

Decisão reconhece responsabilidade objetiva da Uber por acidente que vitimou motorista do aplicativo

A Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) decidiu por unanimidade reconhecer a responsabilidade civil objetiva da Uber do Brasil Tecnologia Ltda. pela morte de um motorista de aplicativo após discussão no trânsito. A turma entendeu que o desentendimento no trânsito não poderia ser equiparado ao caso fortuito externo de caráter imprevisível e determinou o retorno dos autos ao Tribunal Regional do Trabalho da 7ª Região (CE), para o prosseguimento do julgamento em relação aos pedidos de dano moral e material pleiteados pelos herdeiros do motorista.

Na reclamação trabalhista, foi narrado que o motorista passou a trabalhar única e exclusivamente como motorista de aplicativo para a empresa Uber, tirando da atividade a sua fonte de sustento para esposa e filho. Ocorre que, em setembro de 2018, o motorista foi assassinado a tiros enquanto prestava serviço para a empresa. Segundo informações das autoridades de segurança, o motorista teria sido alvejado e morto após se desentender com um motoqueiro, no bairro de Jacarepaguá, na cidade do Rio de Janeiro (RJ). Ainda segundo informações colhidas por jornalistas na hora da ocorrência, o aplicativo do Uber Motorista encontrava-se ligado.

A Uber, em defesa, sustentou a incompetência em razão de matéria da Justiça do Trabalho para a análise do pedido, sob o argumento de que exerce atividade relacionada apenas a intermediação digital, não mantendo qualquer relação de trabalho, mas relação comercial de natureza civil.

Relação de trabalho e culpa de terceiro

O Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (RJ) rejeitou a preliminar de incompetência da Justiça do Trabalho e reconheceu a relação de emprego estabelecida entre o motorista e a Uber. Entretanto, o regional manteve a sentença da 2ª Vara do Trabalho de Fortaleza (CE), que julgou improcedente os pedidos de danos morais e materiais sob o entendimento de o infortúnio decorrer por culpa exclusiva de terceiro, não tendo sido a conduta da Uber a responsável pelo acidente que vitimou o motorista.

Inconformada com a decisão, a defesa dos herdeiros recorreu ao TST por meio de recurso de revista, pedindo a reforma da decisão regional, a fim de imputar a Uber a responsabilização pela morte do motorista.

A Uber, por sua vez, recorreu em relação à competência da Justiça do Trabalho e ao reconhecimento da relação de emprego com o motorista.

Competência da JT

Na turma, o relator ministro Alexandre Agra Belmonte destacou que a competência da Justiça do Trabalho é definida pelo pedido e causa de pedir a partir da natureza da relação mantida pelas partes. No caso, o pedido de danos morais e materiais decorrente de acidente que vitimou um motorista que tinha uma relação de trabalho estabelecida com a empresa Uber “na condição de trabalho autônomo, na execução de serviço prestado com pessoalidade”. Dessa forma, não se pode afastar, no entendimento do magistrado, a competência da Justiça do Trabalho no caso.

Em seu voto, o ministro ressalta não desconhecer que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já decidiu ser da Justiça Comum a competência para o exame de controvérsias estabelecidas entre motoristas e a empresa Uber. No entanto, segundo destaca, tal competência refere-se aos pedidos de danos morais decorrentes do desligamento e reativação de contas de motoristas no aplicativo de plataforma digital, e não da execução de serviços prestados com pessoalidade, como no caso analisado.

Fato de terceiro X responsabilidade da Uber

O relator ressalta que o Uber não possui frota, utilizando-se de motoristas com veículos próprios para o transporte de pessoas por intermédio de aplicativo. No que tange ao relacionamento dos motoristas, já ficou declarada a existência de relação de trabalho, prestando atividade a Uber em atividade de risco por ela criada.

Agra Belmonte destaca, ainda, que o artigo 927, parágrafo único, do Código Civil, trata de responsabilidade objetiva, ou seja, sem culpa “fundada na teoria do risco e que atribui a obrigação de indenizar a todo aquele que exerce alguma atividade que cria risco ou perigo de dano a terceiro”, como trata o caso analisado.

O magistrado ainda lembra em seu voto que o artigo 735 do Código Civil consagra a responsabilidade do transportador, e que esse tem a sua responsabilidade afastada nos casos em que o acidente decorrer de fato de terceiro, inevitável e imprevisível, não guardando relação com o transporte, por se equiparar ao caso fortuito externo.

Entretanto, como assevera o magistrado, o caso em concreto não pode ser equiparado a caso fortuito externo, de caráter previsível, pois “guarda relação direta com a atividade perigosa e estressante de transporte em grandes cidades caracterizadas pela violência”, não podendo, dessa forma, ser afastada a responsabilidade da Uber pelo acidente que vitimou o motorista.

Processo: 849-82.2019.5.07.0002

I-INVERSÃO DA ORDEM DE JULGAMENTO. Em
razão do caráter prejudicial das matérias
constantes do agravo de instrumento em
recurso de revista adesivo da reclamada Uber
do Brasil Tecnologia Ltda., inverte-se a ordem
de julgamento previsto no artigo 997, § 2º, do
CPC/15. Referido procedimento encontra
respaldo no âmbito desta Corte Superior, em
precedentes tanto da SBDI-1 como de Turmas
deste Tribunal.
II-AGRAVO DE INSTRUMENTO DA
RECLAMADA UBER DO BRASIL TECNOLOGIA
LTDA. EM RECURSO DE REVISTA ADESIVO.
ACÓRDÃO REGIONAL NA VIGÊNCIA DA LEI
13.467/2017. COMPETÊNCIA MATERIAL DA
JUSTIÇA DO TRABALHO. RELAÇÃO DE
TRABALHO.
1. A competência material da Justiça do
Trabalho é fixada pelo pedido e pela causa de
pedir. É definida a partir da existência de
relação de trabalho (lato sensu) mantida pelos
litigantes, quanto aos conflitos dela
decorrentes, considerando a ampliação trazida
pela Emenda Constitucional nº 45/2004, que
atribuiu a esta Justiça especializada a
competência para processar e julgar todas as
ações oriundas da relação de trabalho,
inclusive as que versem sobre indenização por
danos moral e material (art. 114, I e VI, da CR).
2. No caso, a pretensão autoral, de pagamento
de indenização por danos moral e material
decorrentes de acidente sofrido por motorista
de aplicativo, está fundada na relação de
trabalho estabelecida com a empresa UBER, na
condição de trabalhador autônomo, na
execução de serviço prestado com
pessoalidade. Sendo assim, não há como
afastar a competência da Justiça do Trabalho
para o exame do pedido, até porque a Súmula
392 desta Corte estabelece que: “Nos termos do
art. 114, inc. VI, da Constituição da República, a
Justiça do Trabalho é competente para processar
e julgar ações de indenização por dano moral e
material, decorrentes da relação de trabalho,
inclusive as oriundas de acidente de trabalho e
doenças a ele equiparadas, ainda que propostas
pelos dependentes ou sucessores do trabalhador
falecido”.
3. Este Relator não desconhece que o Superior
Tribunal de Justiça, dirimindo o conflito
negativo de competência nº 164.555/MG,
decidiu ser da Justiça Comum o exame de
controvérsia estabelecida entre um motorista
de aplicativo e a empresa UBER. No entanto,
deve ser destacado que o referido julgado
tratou apenas do pedido de motorista atinente
à reativação de sua conta no aplicativo e ao
consequente ressarcimento por danos morais
e materiais. Ou seja, a pretensão examinada
pelo STJ se funda tão somente no desligamento
do motorista da plataforma digital ou aplicativo
oferecido pela empresa, e não como no caso
sub judice, em questão decorrente da execução
do trabalho. Incólume, pois, o art. 114, I, da CR.
Agravo de instrumento conhecido e
desprovido.

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (TST - Tribunal Superior do Trabalho) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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