Juros de mora sobre cheque não apresentado incidem a partir do primeiro ato para satisfação do crédito

Juros de mora sobre cheque não apresentado incidem a partir do primeiro ato para satisfação do crédito

A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que, no caso de cheque prescrito não apresentado ao banco para pagamento, os juros de mora devem incidir a partir do primeiro ato do beneficiário tendente à satisfação do crédito, o que pode se dar por protesto, notificação extrajudicial ou pela citação.

A decisão teve origem em ação monitória para cobrança de cheque emitido em julho de 1993, cujo valor atualizado pela Taxa Referencial (TR) até outubro de 2007 correspondia a mais de R$ 5 milhões. O tribunal de segunda instância determinou que os juros incidissem a partir do vencimento (data de emissão) constante no cheque.

No recurso ao STJ, o réu sustentou que os juros devem incidir a partir do momento em que o devedor é constituído em mora – o qual, no caso, seria a citação na ação monitória.

Apresentação do cheque ao banco não é requisito para a cobrança

O relator, ministro Marco Buzzi, destacou que o STJ, ao julgar o REsp 1.556.834, no rito dos recursos repetitivos, fixou a tese de que, seja qual for a ação utilizada pelo portador para cobrança de cheque, os juros de mora incidem a partir da primeira apresentação à instituição financeira sacada ou à câmara de compensação – entendimento alinhado com o artigo 52, inciso II, da Lei 7.357/1985, a chamada Lei do Cheque.

Porém, o magistrado observou que o cheque não foi apresentado ao banco. A apresentação – acrescentou – não é indispensável para que se possa cobrar do emitente a dívida posta no cheque, mas, se ela ocorre, os juros têm incidência a partir dessa data, conforme a lei.

De acordo com Marco Buzzi, a questão central do recurso estava em saber se, não tendo havido a apresentação ao sistema bancário, "os encargos moratórios incidentes ficariam protraídos para termo futuro ou retroagiriam para a data do vencimento da dívida ou da assinatura do título".

Inércia do credor não deve ser premiada

O relator ponderou que a tese do tribunal de origem, segundo a qual os juros devem incidir a partir do vencimento – no caso, da data de emissão –, contrasta com o mencionado dispositivo da Lei do Cheque, que é regra especial, e "não observa o instituto duty to mitigate the loss" (o dever de mitigar o próprio prejuízo).

"A inércia do credor jamais pode ser premiada, motivo pelo qual o termo inicial dos juros de mora deve levar em conta um ato concreto do interessado tendente a satisfazer o seu crédito", destacou o ministro, lembrando que o credor deixou passarem mais de 15 anos para ajuizar a ação monitória do cheque prescrito.

Além disso, Marco Buzzi citou precedente recente em que a Corte Especial do STJ concluiu que "não é o meio judicial de cobrança da dívida que define o termo inicial dos juros moratórios nas relações contratuais, mas sim a natureza da obrigação ou a determinação legal de que haja interpelação judicial ou extrajudicial para a formal constituição do devedor em mora" (EAREsp 502.132).

Com base nessas premissas, o relator concluiu que "a melhor interpretação a ser dada quando o cheque não for apresentado à instituição financeira sacada, para a respectiva compensação, é aquela que reconhece o termo inicial dos juros de mora a partir do primeiro ato do credor no sentido de satisfazer o seu crédito, o que pode se dar pela apresentação, protesto, notificação extrajudicial ou, como no caso concreto, pela citação".

RECURSO ESPECIAL Nº 1.768.022 - MG (2018/0243790-8)
RELATOR : MINISTRO MARCO BUZZI
RECORRENTE : WALTER BARBOSA FEROLLA - ESPÓLIO
REPR. POR : WALTER BARBOSA FEROLLA JUNIOR
ADVOGADOS : SÉRGIO MURILO DINIZ BRAGA - MG047969
MARCO ANTONIO MENDES DE ARAUJO - MG100559
RECORRIDO : GERALDO MARTINS DO CARMO
ADVOGADOS : GENTIL PORTELA CORDEIRO - RJ047505
RODRIGO RESENDE CERQUEIRA - MG093213N
ELIAS CALIL DAHER - MG098803
EMENTA
RECURSO ESPECIAL - EMBARGOS À MONITÓRIA - TERMO
INICIAL DOS JUROS DE MORA DO CHEQUE NÃO
APRESENTADO PARA A COMPENSAÇÃO JUNTO AO BANCO
SACADO - INSURGÊNCIA RECURSAL DO EMBARGANTE.
1. Segundo entendimento do STJ, em regra, o peticionamento
nos autos por advogado destituído de poderes especiais para
receber citação não configura comparecimento espontâneo apto
a suprir a sua necessidade. Precedentes.
1.1 Aplicando-se ao caso o princípio da instrumentalidade das
formas sob o enfoque de que "não há nulidade sem prejuízo" (pas
de nullité sans grief), e considerando, ainda, ter havido a citação
da parte e de terem sido os embargos à monitória julgados no
mérito, não deve o feito retornar à origem para eventual repetição
de atos, pois todas as matérias arguidas na peça de defesa/ação
impugnativa foram efetivamente analisadas e levadas em
consideração quando do julgamento da controvérsia decorrente
do conflito estabelecido entre as partes contendoras.
Relator. Os Srs. Ministros Luis Felipe Salomão (Presidente), Raul Araújo, Maria Isabel
Gallotti e Antonio Carlos Ferreira votaram com o Sr. Ministro Relator.
Dr(a). DIOGO JOSÉ DA SILVA, pela parte RECORRENTE: WALTER
BARBOSA FEROLLA
Brasília (DF), 17 de agosto de 2021 (Data do Julgamento)
MINISTRO MARCO BUZZI
Relator
2. Em consonância ao entendimento firmado no Recurso
Repetitivo nº 1.556.834/SP, no novo pronunciamento da Corte
Especial no que concerne à mora do devedor e seus
consectários (EAREsp 502.132/RS), com base no regramento
especial da Lei nº 7.357/85, a melhor interpretação a ser dada
quando o cheque não for apresentado à instituição financeira
sacada para a respectiva compensação, é aquela que reconhece
o termo inicial dos juros de mora a partir do primeiro ato do credor
no sentido de satisfazer o seu crédito, o que pode se dar pela
apresentação, protesto, notificação extrajudicial, ou, como no
caso concreto, pela citação (art. 219 do CPC/73 correspondente
ao art. 240 do CPC/15).
3. Recurso especial provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima
indicadas, acordam os Ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por
unanimidade, dar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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