Revogação posterior de liminar não exige que beneficiário de boa-fé devolva dinheiro ao plano de saúde

Revogação posterior de liminar não exige que beneficiário de boa-fé devolva dinheiro ao plano de saúde

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) aplicou entendimento adotado para as demandas previdenciárias e estabeleceu que a análise sobre a necessidade de devolução de valores pagos por operadora de plano de saúde, em cumprimento a antecipação de tutela posteriormente revogada, deve ser realizada sob o prisma da boa-fé objetiva.

Com base nessa orientação, o colegiado negou recurso de uma operadora de saúde que buscava a devolução dos valores dispendidos no tratamento de uma beneficiária. Os pagamentos foram determinados em decisão liminar, que foi revogada com a morte da paciente no decorrer do processo judicial.

O pedido da empresa já havia sido indeferido em primeiro grau e pelo Tribunal de Justiça do Ceará. Para o tribunal, por não ter havido má-fé da beneficiária, o plano de saúde não deveria ser ressarcido.

Valores legítimos

O relator, ministro Paulo de Tarso Sanseverino, lembrou que o colegiado, em julgamento referente à benefício previdenciário, firmou entendimento de que "a tutela antecipada é um provimento judicial provisório e, em regra, reversível, devendo a repetibilidade da verba previdenciária recebida, antecipadamente, ser examinada sob o prisma da boa-fé objetiva".

O ministro também lembrou que, de acordo com precedente da Segunda Seção, os valores recebidos precariamente são legítimos enquanto vigorar o título judicial antecipatório, caracterizando a boa-fé do autor – embora essa conclusão não resulte na presunção de que tais verbas, ainda que alimentares, integrem o seu patrimônio em definitivo.

Na hipótese dos autos, o ministro verificou que não houve a demonstração de má-fé da demandante, que faleceu no transcurso do processo, motivo pelo qual foi decretada a extinção da ação pela perda superveniente do seu único objeto: a concessão de assistência à saúde.

"Ressalte-se que a revogação da antecipação de tutela não decorreu da inexistência do direito da postulante", enfatizou o ministro ao concluir que, em razão da flagrante boa-fé da beneficiária, seria indevida a restituição dos valores.

Dupla conformidade

Em relação aos precedentes, Sanseverino destacou que, no julgamento do EREsp 1.086.154, a Corte Especial firmou o entendimento de que a dupla conformidade entre a sentença e o acórdão gera a estabilização da decisão de primeira instância, dando ao vencedor a legítima expectativa de que é titular do direito reconhecido na sentença e confirmado pelo tribunal de segunda instância.

"Essa mesma solução merece ser aplicada nas hipóteses de saúde suplementar, como o caso dos autos. Por isso, deve ser reconhecida a irrepetibilidade de parcelas pagas por decisão precária, em face da dupla conformidade entre sentença e acórdão, visto que o tribunal de origem não reformou o teor decisório de primeiro grau", concluiu o ministro.

RECURSO ESPECIAL Nº 1725736 - CE (2018/0039765-0)
RELATOR : MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO
RECORRENTE : UNIMED FORTALEZA SOCIEDADE COOPERATIVA
MÉDICA LTDA
ADVOGADOS : DAVID SOMBRA PEIXOTO E OUTRO(S) - CE016477
NATHALIA APARECIDA SOUSA DANTAS - CE022248
MAYARA DE LIMA PAULO - CE027304
DAYENA PONTES CRUZ - CE020405
RECORRIDO : MARIA GADELHA DOS REIS - ESPÓLIO
REPR. POR : MONICA GADELHA DOS REIS MALVEIRA
ADVOGADO : JOSÉ GADELHA DOS REIS - CE008085
EMENTA
RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. SAÚDE
SUPLEMENTAR. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C.C. PEDIDO DE
ANTECIPAÇÃO DA TUTELA. SERVIÇO DE HOMECARE. TUTELA
DEFERIDA. PACIENTE PORTADORA DE MAL DE ALZHEIMER. MORTE
DA AUTORA NO DECORRER DO PROCESSO. EXTINÇÃO DO
PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. REVOGAÇÃO DA TUTELA
ANTECIPADA. EFEITOS EX TUNC. RESTITUIÇÃO DOS VALORES
DESPENDIDOS COM FÁRMACOS, ALIMENTAÇÃO E MATERIAIS
HOSPITALARES. DESCABIMENTO. BOA-FÉ DA DEMANDADA
EVIDENCIADA.
1. O cerne da controvérsia situa-se em torno do pedido de restituição dos
gastos suportados para o cumprimento da decisão interlocutória concessiva
da tutela provisória à parte autora, tendo em vista a posterior revogação da
medida quando da prolação da respectiva sentença.
2. Em relação aos benefícios previdenciários complementares,
o posicionamento da Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça é no
sentido de que há direito à devolução dos valores percebidos, em razão da
revogação da antecipação dos efeitos da tutela pela sentença de mérito.
3. Entretanto, a repetibilidade da verba recebida, com base em antecipação
de tutela, deve ser examinada sob o prisma da boa-fé objetiva.
4. Consoante destacado pelo acórdão recorrido, na hipótese dos autos, não
há evidência de conduta contrária à boa-fé na postura da paciente falecida
ou de sua família.
5. A revogação da antecipação de tutela não decorreu da inexistência do
direito da postulante, tendo o processo sido extinto apenas em razão da morte
da demandante e a inexistência de conteúdo condenatório que aproveitasse
aos herdeiros da requerente, pois o objeto da demanda era apenas a
concessão de assistência à saúde em favor da paciente falecida.
6. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E DESPROVIDO.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas,
acordam os Ministros da TERCEIRA TURMA do Superior Tribunal de Justiça,
por unanimidade, negar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do(a)
Sr(a). Ministro(a) Relator(a).
Os Srs. Ministros Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze,
Moura Ribeiro e Nancy Andrighi votaram com o Sr. Ministro Relator.
Brasília, 27 de abril de 2021.
Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO
Relator

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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