Ausente o autor da publicação, provedor pode defender licitude de conteúdo veiculado em suas plataformas
A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que não há impedimento para que o próprio provedor de aplicação – nas hipóteses em que o autor do conteúdo on-line apontado como ilegal ou ofensivo não faz parte da ação judicial – apresente argumentos em defesa da licitude do material hospedado ou publicado em suas plataformas.
A decisão teve origem em ação de obrigação de fazer ajuizada por um advogado contra a Google do Brasil para que fossem excluídos diversos conteúdos – identificados por meio de seus respectivos localizadores (URLs) – publicados em um blogue com críticas direcionadas a ele.
A sentença determinou a exclusão dos conteúdos indicados, decisão que foi mantida pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ). O tribunal destacou que a Google responde pelos danos causados pelo conteúdo ofensivo se, após notificada e ciente das ofensas, recusa-se a retirá-las de imediato da plataforma.
Em sua defesa, a empresa alegou a licitude das manifestações publicadas pelo blogue e afirmou que as publicações representariam apenas a exteriorização de um debate acalorado sobre assunto polêmico; por isso, tais opiniões deveriam estar protegidas pela liberdade de manifestação.
Hospedagem
Relatora do recurso, a ministra Nancy Andrighi destacou que a Google apenas fornece um serviço de hospedagem de blogues, sendo que o particular pode se manifestar livremente nesses espaços, sem qualquer edição por parte da empresa.
A ministra reforçou a necessidade de indicação do localizador específico (URL) do conteúdo infringente para que se possa determinar sua retirada da internet, condição expressa pelo Marco Civil da Internet (Lei 12.965/2014).
"A jurisprudência do STJ é pacífica no sentido de que, para a configuração da responsabilidade dos provedores de aplicação por conteúdos gerados por terceiros, a indicação clara e específica de sua localização na internet é essencial, seja por meio de uma notificação do particular, seja por meio de uma ordem judicial", afirmou.
Além disso, a ministra ressaltou que, para o deferimento do pedido de remoção de conteúdos da internet, é necessária a constatação de ilegalidade no próprio conteúdo ou na forma de sua divulgação, mesmo sem previsão expressa no artigo 19 da Lei 12.965/2014.
Nada impede
Nancy Andrighi também ressaltou que, como o autor do conteúdo publicado não faz parte do polo passivo do processo, não há qualquer impedimento a que o provedor de aplicação apresente argumentos em defesa da licitude dos conteúdos.
Apesar disso, no voto acompanhado de forma unânime pelo colegiado, a relatora negou provimento ao recurso da Google. Segundo ela, o TJRJ se manifestou exaustivamente sobre a configuração de ofensa à honra do advogado, não sendo possível ao STJ reanalisar essa conclusão, em virtude da vedação imposta pela Súmula 7.
RECURSO ESPECIAL Nº 1.851.328 - RJ (2018/0162998-9)
RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE : GOOGLE BRASIL INTERNET LTDA
ADVOGADOS : RAFAEL BARROSO FONTELLES - RJ119910
EDUARDO BASTOS FURTADO DE MENDONÇA - RJ130532
MARIANA CUNHA E MELO DE ALMEIDA REGO - RJ179876
RECORRIDO : ROBERTO FLAVIO CAVALCANTI
ADVOGADO : ROBERTO FLÁVIO CAVALCANTI (EM CAUSA PRÓPRIA) - RJ163183
EMENTA
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. INTERNET.
RESPONSABILIDADE DE PROVEDORES DE APLICAÇÃO. REMOÇÃO DE
CONTEÚDOS INFRINGENTES. DEFESA DO CONTEÚDO PELO PROVEDOR.
POSSIBILIDADE. REEXAME DE ACERVO FÁTICO-PROBATÓRIO.
IMPOSSIBILIDADE.
1. Ação ajuizada em 07/01/2013, recurso interposto em 11/10/2017 e
atribuído a este gabinete em 12/07/2018.
2. O propósito recursal consiste em determinar a presença de ilegalidade
nos conteúdos, cujos URLs foram devidamente apresentados pelo recorrido,
cuja remoção foi determinada pelo Tribunal de origem.
3. Para o deferimento do pedido de remoção de conteúdos da internet,
pressupõe-se a existência de ilegalidade no próprio conteúdo ou na forma
de sua divulgação.
4. Na ausência no polo passivo da ação judicial da autora do conteúdo
publicado on-line que é apontado como infringente, não há qualquer óbice
de que a própria provedora de aplicação apresente argumentos em defesa
da licitude dos conteúdos que eventualmente hospedar ou publicar em suas
plataformas.
5. Na hipótese dos autos, contudo, infirmar a conclusão contido no acórdão
recorrido, ensejaria obrigatoriamente a necessidade de reexaminar todo o
conteúdo do acervo fático-probatório do processo.
6. Recurso especial desprovido.