Afastada responsabilidade da Blue Tree por atraso em obra de complexo hoteleiro que leva seu nome em SP

Afastada responsabilidade da Blue Tree por atraso em obra de complexo hoteleiro que leva seu nome em SP

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reformou acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) e afastou a responsabilidade solidária da administradora de serviços hoteleiros Blue Tree Hotels & Resorts do Brasil (BTH) em ação sobre o não cumprimento de contrato de compra e venda de unidades de apart-hotel devido à paralisação das obras do empreendimento Blue Tree São Carlos, no estado de São Paulo.

Para o colegiado, apesar de ter seu nome incluído no material publicitário do complexo, a empresa obrigou-se a administrar os serviços hoteleiros apenas após a conclusão das obras, não integrando a cadeia de fornecimento relativa à incorporação imobiliária. Além disso, a turma considerou que a empresa, assim como os compradores das unidades, foi prejudicada pelo atraso das obras, já que esperava atuar na exploração das locações hoteleiras.  

O recurso especial teve origem em ação resolutória e reparatória proposta pela promitente compradora contra a incorporadora, a intermediadora, a promitente vendedora e a BTH, futura administradora de serviços hoteleiros. A ação buscava a resolução de contratos e a indenização por danos morais, em virtude da paralisação das obras por quase dois anos, sem perspectiva de conclusão.

Nome emprestado

Em primeira instância, o juiz acolheu a preliminar de ilegitimidade passiva da BTH e julgou procedente o pedido de resolução dos contratos e de restituição de valores em relação aos demais réus.

Entretanto, ao analisar a apelação da compradora, o TJSP reformou a sentença e reconheceu a responsabilidade solidária da BTH pela inexecução do contrato. Para o tribunal, a Blue Tree contribuiu para a comercialização do empreendimento e para o convencimento dos compradores sobre a segurança do negócio, tendo inclusive emprestado seu nome ao complexo imobiliário e integrado a divulgação publicitária.

CDC

Segundo o relator do recurso da administradora hoteleira, ministro Villas Bôas Cueva, ainda que o negócio imobiliário não seja destinado a moradia, mas a investimento, o adquirente pode ser protegido pelo Código de Defesa do Consumidor (CDC) se tiver agido de boa-fé e não detiver conhecimentos de mercado imobiliário nem experiência em incorporações.

“Em outras palavras, o CDC poderá ser utilizado para amparar concretamente o investidor ocasional (figura do consumidor investidor), não abrangendo, portanto, em seu âmbito de proteção aquele que desenvolve a atividade de investimento de maneira reiterada e profissional”, apontou.

Apesar de entender que o TJSP deveria ter, ao menos, verificado a existência de relação de consumo entre a compradora e as empresas imobiliárias, o relator disse que a questão foi superada em virtude da ilegitimidade da BTH para responder à ação.

“Isso porque a BTH não integrou a cadeia de fornecimento concernente à incorporação imobiliária, porquanto se obrigou a apenas administrar os serviços hoteleiros, a ocorrer apenas após a conclusão do empreendimento, integrando, para esse mister, juntamente com os adquirentes (pool de locações), uma sociedade em conta de participação”, disse o ministro.

Villas Bôas Cueva afirmou que, com a não conclusão do empreendimento, a administradora hoteleira foi tão prejudicada quanto a promitente compradora – a primeira esperava explorar os serviços de hotelaria; a segunda, ganhar rentabilidade com a aquisição e a locação das unidades.

Dessa forma, o relator restabeleceu a sentença e afastou a responsabilidade solidária da administradora hoteleira, “seja por não integrar a cadeia de fornecimento relativa à incorporação imobiliária, seja por não compor o mesmo grupo econômico das empresas inadimplentes, seja por ter sido também prejudicada, visto que foi frustrada a atividade econômica da sociedade em conta de participação formada juntamente com os adquirentes para a exploração comercial do pool de locações”.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.785.802 - SP (2018/0071256-8)
RELATOR : MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA
RECORRENTE : BLUE TREE HOTELS & RESORTS DO BRASIL S/A
ADVOGADOS : WALTER ALEXANDRE BUSSAMARA - SP147588
JOÃO PAULO GUIMARÃES DA SILVEIRA - SP146177
CARLOS FERNANDO MATHIAS DE SOUZA E OUTRO(S) - DF000530
FERNANDA HENGLER DINHI - SP198990
RECORRIDO : MARIA CRISTINA OMETTO PAVAN
ADVOGADO : BRUNO COSTA BEHRNDT E OUTRO(S) - SP305548
INTERES. : PARINTINS EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS LTDA
INTERES. : CARRERI GIGANTE IMOVEIS LTDA
INTERES. : ARVORE AZUL EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS SPE LTDA
ADVOGADO : HERCULES PRACA BARROSO - SP264355
EMENTA
RECURSO ESPECIAL. CIVIL. PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE UNIDADE
DE APART-HOTEL. PARALISAÇÃO DAS OBRAS. AÇÃO RESOLUTÓRIA.
CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. APLICABILIDADE. CONSUMIDOR
FINAL. AFASTAMENTO. INVESTIDOR. TEORIA FINALISTA MITIGADA.
VULNERABILIDADE. AFERIÇÃO. NECESSIDADE. FUTURA ADMINISTRADORA DE
SERVIÇOS HOTELEIROS. LEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM. CADEIA DE
FORNECIMENTO. DESCARACTERIZAÇÃO. OFERTA E PUBLICIDADE.
RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. INEXISTÊNCIA. INFORMAÇÃO CLARA.
ATUAÇÃO ESPECIFICADA. ADQUIRENTE. CIÊNCIA EFETIVA. POOL DE
LOCAÇÃO. SOCIEDADE EM CONTA DE PARTICIPAÇÃO. CONTRATAÇÃO.
1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código
de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ).
2. As questões controvertidas na presente via recursal são: a) definir se o Código
de Defesa do Consumidor se aplica às ações de resolução de promessa de
compra e venda de imóvel não destinado à moradia do adquirente (finalidade de
investimento) e b) delinear se a futura administradora de empreendimento
hoteleiro, cujas obras foram paralisadas, possui legitimidade passiva ad causam,
juntamente com a promitente vendedora, a intermediadora e a incorporadora, em
demanda resolutória e reparatória de contrato de aquisição de unidades de
apart-hotel.
3. O adquirente de unidade imobiliária, mesmo não sendo o destinatário final do
bem e apenas possuindo o intuito de investir ou auferir lucro, poderá encontrar
abrigo da legislação consumerista com base na teoria finalista mitigada se tiver
agido de boa-fé e não detiver conhecimentos de mercado imobiliário nem
expertise em incorporação, construção e venda de imóveis, sendo evidente a sua
vulnerabilidade. Em outras palavras, o CDC poderá ser utilizado para amparar
concretamente o investidor ocasional (figura do consumidor investidor), não
abrangendo em seu âmbito de proteção aquele que desenvolve a atividade de
investimento de maneira reiterada e profissional.
4. O apart-hotel (flat services ou flats) é um prédio de apartamentos com serviços
de hotelaria. No caso, é incontroverso que o empreendimento se destina a
aluguéis temporários. Como não é permitido aos condomínios praticarem
atividade comercial, e para haver a exploração da locação hoteleira, os
proprietários das unidades devem se juntar em uma nova entidade, constituída
comumente na forma de sociedade em conta de participação, apta a ratear as
receitas e as despesas das operações, formando um pool hoteleiro, sob a

coordenação de uma empresa de administração hoteleira.
5. Na hipótese, é inegável que a promissária compradora era investidora, pois
tinha ciência de que as unidades habitacionais não seriam destinadas ao próprio
uso, já que as entregou ao pool hoteleiro ao anuir ao Termo de Adesão e ao
contratar a constituição da sociedade em conta de participação para exploração
apart-hoteleira, em que integraria os sócios participantes (sócios ocultos), sendo
a Blue Tree Hotels a sócia ostensiva. Pela teoria finalista mitigada, a Corte local
deveria ao menos aferir a sua vulnerabilidade para fins de aplicação do CDC.
6. Na espécie, não há falar em deficiência de informação ou em publicidade
enganosa, porquanto sempre foi divulgada claramente a posição da BTH no
empreendimento, tendo se obrigado, nos termos da oferta ao público e dos
contratos pactuados, de que seria tão somente a futura administradora dos
serviços hoteleiros após a conclusão do edifício, sem ingerência na
comercialização das unidades ou na sua construção. Reconhecimento da
ilegitimidade passiva ad causam. 7. Deve ser afastada qualquer responsabilização solidária da recorrente pelo não
adimplemento do contrato de promessa de compra e venda das unidades do
apart-hotel, seja por não integrar a cadeia de fornecimento relativa à
incorporação imobiliária, seja por não compor o mesmo grupo econômico das
empresas inadimplentes, seja por também ter sido prejudicada, visto que sua
pretensão de explorar o ramo hoteleiro na localidade foi tão frustrada quanto a
pretensão da autora de ganhar rentabilidade com a aquisição e a locação das
unidades imobiliárias.
8. Recurso especial provido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide a
Terceira Turma, por unanimidade, dar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do
Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Marco Aurélio Bellizze, Moura Ribeiro (Presidente), Nancy
Andrighi e Paulo de Tarso Sanseverino votaram com o Sr. Ministro Relator.
Brasília (DF), 19 de fevereiro de 2019(Data do Julgamento)
Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA
Relator

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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