Credor fiduciário pode permanecer na posse do imóvel, sem devolver valores, após leilões em que não tenha havido lances

Credor fiduciário pode permanecer na posse do imóvel, sem devolver valores, após leilões em que não tenha havido lances

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que, em caráter excepcional, o credor fiduciário pode permanecer na posse do imóvel objeto de alienação em garantia, extinguindo-se as obrigações existentes entre ele e o devedor, no caso de não haver lances nos leilões para venda do bem.

No recurso especial, uma companhia de seguros pedia a aplicação do artigo 27, parágrafo 5°, da Lei 9.514/97, segundo o qual, havendo frustração nos dois leilões para alienação do imóvel em garantia, a dívida deverá ser extinta e o credor exonerado da obrigação de entregar ao devedor a quantia referente ao valor do imóvel menos o valor da dívida.

A credora assumiu a propriedade do imóvel em questão após a inadimplência do devedor no pagamento das parcelas do negócio. O devedor ajuizou ação para manter a posse do bem, além de pedir a condenação da companhia ao pagamento da diferença entre o valor da avaliação do imóvel e o montante que já havia desembolsado.

O magistrado de primeiro grau deu parcial provimento ao pedido e condenou o credor a restituir ao devedor essa diferença. Na apelação, a companhia alegou que, tendo havido dois leilões do imóvel – frustrados por ausência de lances –, a dívida deveria ser extinta e ela não precisaria devolver os valores.

No entanto, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) entendeu que a situação não se enquadraria no disposto na Lei 9.514/97, pois esta teria como pressuposto a existência de lance, o que não ocorreu, já que os leilões do imóvel não receberam nenhuma oferta.

Insucesso

Para o relator do recurso no STJ, ministro Villas Bôas Cueva, está configurada a hipótese descrita no dispositivo legal, pois “o que importa é o insucesso dos leilões realizados para a alienação do imóvel objeto do contrato de alienação fiduciária, com ou sem o comparecimento de possíveis arrematantes”.

Em seu voto, o ministro explicou que a lei entende como consequência da alienação fiduciária o "desdobramento da posse, tornando-se o fiduciante possuidor direto e o fiduciário possuidor indireto da coisa imóvel". O negócio se resolveria com o pagamento integral da dívida garantida.

Dessa forma, se o devedor não cumprir com os pagamentos, a propriedade pode ser consolidada em nome do credor fiduciário, com o intuito de satisfazer a obrigação. Com o não pagamento do débito, disse o relator, a lei prevê a realização de dois leilões; sendo ambos frustrados, a dívida será extinta e o credor, exonerado da obrigação, ficará com o imóvel.

Segundo Villas Bôas Cueva, a lei considera inexitoso o segundo leilão na hipótese em que o maior lance oferecido não for igual ou superior "ao valor da dívida, das despesas, dos prêmios de seguro, dos encargos legais, inclusive tributos, e das contribuições condominiais".

“Com mais razão, o dispositivo também abrange a situação em que não houver interessados na aquisição do imóvel, frustrando a alienação do bem por falta de apresentação de lance. Tanto a existência de lances em valor inferior ao estabelecido como a ausência de oferta em qualquer quantia geram a frustração do processo de leilão”, entendeu.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.654.112 - SP (2017/0002602-8)
RELATOR : MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA
RECORRENTE : BRAZILIAN SECURITIES COMPANHIA DE SECURITIZACAO
ADVOGADOS : GRAZIELA SANTOS DA CUNHA - SP178520
MARCOS CAVALCANTE DE OLIVEIRA E OUTRO(S) - SP244461
NATALIA LIMA NOGUEIRA - SP365335
RECORRIDO : SIMON ZAIDMAN
ADVOGADOS : DANIELLE ANNIE CAMBAUVA - SP123249
CLAUDIA PRETURLAN RIBEIRO E OUTRO(S) - SP150115
LUIZ JOSÉ RIBEIRO FILHO - SP230099
EMENTA
RECURSO ESPECIAL. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA. IMÓVEL.
LEILÕES. FRUSTRAÇÃO. PRETENSOS ARREMATANTES. NÃO
COMPARECIMENTO. LANCES. INEXISTÊNCIA.
1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código
de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ).
2. Cinge-se a controvérsia a definir se o § 5º do art. 27 da Lei nº 9.514/1997 é
aplicável às hipóteses em que os dois leilões realizados para a alienação do
imóvel objeto da alienação fiduciária são frustrados, não havendo nenhum lance
advindo de pretensos arrematantes.
3. Vencida e não paga a dívida, o devedor fiduciante deve ser constituído em
mora, conferindo-lhe o direito de purgá-la, sob pena de a propriedade ser
consolidada em nome do credor fiduciário com o intuito de satisfazer a obrigação.
Precedente.
4. Inexistindo a purga da mora, o credor fiduciário terá o prazo de 30 (trinta) dias,
contado do registro de averbação da consolidação da propriedade na matrícula
do respectivo imóvel, para promover o leilão público com o objetivo de alienar o
referido bem.
5. O § 5º do art. 27 da Lei nº 9.514/1997 abrange a situação em que não houver,
no segundo leilão, interessados na aquisição do imóvel, fracassando a alienação
do bem, sem a apresentação de nenhum lance.
6. Na hipótese, frustrado o segundo leilão do imóvel, a dívida é compulsoriamente
extinta e as partes contratantes são exoneradas das suas obrigações, ficando o
imóvel com o credor fiduciário.
7. Recurso especial provido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide a
Terceira Turma , por unanimidade, dar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do
Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Marco Aurélio Bellizze, Moura Ribeiro (Presidente), Nancy
Andrighi e Paulo de Tarso Sanseverino votaram com o Sr. Ministro Relator.
Brasília (DF), 23 de outubro de 2018(Data do Julgamento)
Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA
Relator

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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