Lojas terão de pagar dano moral coletivo por falta de clareza em propaganda impressa

Lojas terão de pagar dano moral coletivo por falta de clareza em propaganda impressa

O ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Luis Felipe Salomão manteve condenação imposta pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) às empresas Ricardo Eletro, Lojas Insinuante, Via Varejo e Lojas Americanas pela falta de clareza em promoções anunciadas por meio de encartes e outras peças publicitárias impressas. A dificuldade de leitura de informações precisas sobre o prazo e as condições das ofertas levaram o tribunal fluminense a fixar indenização por dano moral coletivo de R$ 20 mil contra cada empresa.

A ação civil pública foi proposta pela Defensoria Pública do Rio de Janeiro, que alegou que as empresas estavam distribuindo propaganda impressa no estado com a utilização de letras diminutas. A Defensoria juntou aos autos cópias das peças publicitárias, nas quais apontou a dificuldade de leitura de termos como o período de validade da oferta, a taxa de juros aplicada às operações, o número de parcelas admitidas, entre outros aspectos.

Letra legível

Em primeira instância, o magistrado estabeleceu a indenização por dano moral coletivo e fixou multa diária de R$ 10 mil caso as empresas não adequassem os anúncios às normas de publicidade fixadas pelo Código de Defesa do Consumidor (CDC).

A sentença foi mantida pelo TJRJ. No acórdão, os desembargadores estenderam a regra estabelecida no artigo 54 do CDC – que determina, no caso dos contratos de adesão, a adoção de letra legível e não inferior ao tamanho 12 – à hipótese das ofertas veiculadas em encartes de jornais. A corte fluminense entendeu que o tamanho da fonte utilizada para o registro das condições das ofertas prejudicava a imediata compreensão do consumidor e violava os princípios da transparência e da boa-fé objetiva.

Lesão ao consumidor

Ao analisar os recursos especiais das empresas de varejo, o ministro Salomão destacou que, segundo o tribunal fluminense, as empresas não comprovaram que os encartes publicitários discutidos na ação civil pública eram suficientemente claros em relação às condições específicas para aquisição dos produtos pelo consumidor.

“Além disso, a corte estadual considera estar comprovado na espécie o ato ilícito, e caracterizado o dano moral coletivo, na medida em que a conduta dos réus consistente na violação de direito coletivo de informação lesionou os interesses dos consumidores”, apontou o ministro.

Ao negar os recursos especiais das empresas, o ministro Salomão também ressaltou que a jurisprudência do STJ considera incompatível com os princípios da transparência e da boa-fé a utilização de letras diminutas, especialmente se a advertência tiver relação com a informação central da peça publicitária.

AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 1.074.382 - RJ (2017/0063513-8)
RELATOR : MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO
AGRAVANTE : RICARDO ELETRO DIVINOPOLIS LTDA
AGRAVANTE : LOJAS INSINUANTE S.A.
ADVOGADOS : LEONARDO DE LIMA NAVES - MG091166
DANIELLA DIAS E OUTRO(S) - RJ104988
AGRAVANTE : VIA VAREJO S/A
ADVOGADOS : ROBERTA FEITEN SILVA - RS050739
GABRIEL ROSA DA ROCHA - RJ123995
LUIZ EDUARDO JARDIM VILAR E OUTRO(S) - RS089217
AGRAVANTE : LOJAS AMERICANAS S/A
ADVOGADOS : VINÍCIUS IDESES E OUTRO(S) - RJ098749
RICARDO SAVIOLO ROCHA FILHO - RJ199172
AGRAVADO : DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
ADVOGADO : DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
DECISÃO
1. Trata-se de agravo interposto por LOJAS INSINUANTE S.A. contra
decisão que inadmitiu recurso especial, com fulcro no art. 105, III, "a" e "c", da
Constituição Federal, em face de acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de
Janeiro, integrado pelo proferido em sede de embargos de declaração, assim ementado:
Ação civil pública. NUDECON. Obrigatoriedade de aplicação da regra
estabelecida no artigo 54, § 3º do CDC às ofertas veiculadas em encartes de
jornais. Dano moral coletivo. O Código de Defesa do Consumidor, em seu
artigo 6º, III, expõe claramente ser direito básico do consumidor o acesso à
informação clara e precisa sobre o produto ou serviço que está adquirindo.
Além disso, a lei consumerista veda também a publicidade enganosa, assim
entendida como qualquer modalidade de informação capaz de induzir o
consumidor em erro a respeito dos dados do produto ou serviço objeto da
publicidade. Em outras palavras, deverá ser observado o princípio da
transparência, garantido no art. 4º do Código de Defesa do Consumidor,
sendo dever do fornecedor informar bem o consumidor sobre todas as
características dos produtos que vai adquirir e dos serviços que vai contratar,
para que saiba exatamente o que deles esperar (art. 31). Ressalte-se,
também, o preceito contido no parágrafo terceiro do artigo 54 do Código de
Defesa do Consumidor, que determina a adoção de caracteres ostensivos e
legíveis nos contratos de adesão, em tamanho de fonte nunca inferior ao
corpo doze, visando facilitar a compreensão pelo consumidor. Isso não
bastasse, o § 4º do mesmo artigo 54 estabelece a obrigatoriedade de
redigir-se com destaque cláusula que implique limitação de direito do
consumidor, de modo a permitir sua imediata e fácil compreensão.
Percebe-se, portanto, a intenção do legislador de assegurar a prestação de
informações corretas, claras, precisas, de forma ostensiva, a fim de evitar
que o fornecedor de produtos e serviços utilize os meios publicitários para
embaraçar, enganar e omitir do consumidor eventuais ônus ou desvantagens
que a aquisição do produto ou a contratação do serviço possa implicar. Na
hipótese dos autos, não obstante as alegações no sentido de que os encartes
publicitários eram claros em relação às condições específicas para se obter o
direito às promoções, os réus não lograram êxito em comprovar que as

vedações eram de fácil compreensão. Pelo contrário, as cópias dos panfletos
anexadas aos autos pela Defensoria Pública demonstram que as
informações relativas ao prazo de validade das ofertas, formas de pagamento
e taxas de juros estavam impressas em caracteres extremamente pequenos,
dificultando a imediata compreensão do consumidor e violando os deveres de
transparência e de boa-fé objetiva. Tem-se, portanto, que os recorrentes
infringiram a legislação consumerista, não prestando informações claras e
precisas sobre os serviços e produtos oferecidos, em flagrante violação aos
deveres de transparência e cooperação, o que lhes impõe o dever de
indenizar os danos morais sofridos. Na hipótese de que se cuida, o lesado é
toda a coletividade, considerando a intranquilidade social que a conduta dos
recorrentes vem provocando. No que tange ao valor da indenização – R$
20.000,00 (vinte mil reais) para cada réu – tenho que foram obedecidos os
princípios da razoabilidade e proporcionalidade, não cabendo falar em
exorbitância, sobretudo se considerado o poderio econômico das empresas
envolvidas, todas grandes lojas de departamento com representação em
vários estados da federação. Correto também o valor das astreintes, não
merecendo prosperar a alegação de prejuízo irreparável. De fato, a multa no
valor de R$ 10.000,00 só incidirá, como visto, se os recorrentes se recusarem
a cumprir o comando judicial, não adotando os parâmetros impostos pela
legislação consumerista em seus encartes publicitários, ou seja, optando por
continuar a infringir as normas do CDC. Em relação à alegação de violação
dos princípios da legalidade, isonomia e livre concorrência, nenhuma razão
assiste aos recorrentes. Como é cediço, a Lei nº 8.078/90 foi instituída como
norma principiológica, tendo como objetivo concretizar os princípios da
dignidade da pessoa humana, valor social do trabalho, da livre iniciativa e,
ainda, os princípios gerais da atividade econômica previstos na Constituição
da República. Assim, o conflito entre o direito à livre iniciativa e o da proteção
e defesa do consumidor – de igual hierarquia constitucional, faz-se mister
ressaltar – deve ser resolvido pela critério da ponderação de interesses, de
tal modo que as normas jurídicas sejam aplicadas de forma coordenada para
proteger o consumidor, tendo-se em conta o valor absoluto da dignidade da
pessoa humana e a solidariedade social. Por fim, merece ser prestigiado o
julgador de primeiro grau também no que tange à determinação de
publicação da decisão recorrida em três jornais de grande circulação e por
três edições consecutivas, pois dita determinação visa dar efetividade ao
princípio da publicidade, garantindo ampla divulgação do resultado e
possibilitando a toda a coletividade lesada tomar ciência dos fatos e da
prestação jurisdicional.
Recursos aos quais se nega provimento.
Nas razões do especial (fls. 1.752/1.799), alega-se violação dos arts. 4º, 31,
37 e 54 do Código de Defesa do Consumidor; art. 1º da Lei n. 6.463/77; art. 461, §§ 4º e
6º, e 462 do Código de Processo Civil/73 e art. 421 do Código Civil, bem como dissídio
jurisprudencial.
O Ministério Público Federal opina pelo não conhecimento do agravo. (fls.
2.429/2.440)
Decido.
2. A irresignação não merece prosperar.
De início, consigne-se que o acórdão recorrido objeto do recurso especial foi
publicado antes da entrada em vigor da Lei 13.105 de 2015, estando o recurso sujeito

aos requisitos de admissibilidade do Código de Processo Civil de 1973,
conforme Enunciado Administrativo 2/2016 do Plenário do Superior Tribunal de Justiça
(AgRg no AREsp 849.405/MG, Quarta Turma, Julgado em 5/4/2016).
3. Outrossim, observa-se que a matéria relativa ao art. 421 do CC e art. 461,
§ 6º, do CPC/73, não foi objeto de análise pelo acórdão recorrido, uma vez que não
houve manifestação sobre: a liberdade de contratar e a função social do contrato;
tampouco sobre a exorbitância ou a necessidade de imposição de prazo às astreintes. Na
verdade, a Corte a quo limitou-se a salientar que a multa por descumprimento da
obrigação de fazer somente incidirá se os recorrentes se recusarem a cumprir o comando
judicial, optando por infringir as normas consumeristas.
A inexistência de carga decisória a respeito da matéria impede que ela seja
apreciada na presente via recursal, tendo em vista a falta de prequestionamento.
Por outro lado, o Superior Tribunal de Justiça não reconhece o
prequestionamento pela simples oposição de embargos de declaração. Persistindo a
omissão, é necessária a interposição de recurso especial alegando-se afronta ao art. 535
do CPC/73 (Súmula 211/STJ), o que, no caso, não ocorreu.
4. Ademais, o Tribunal de origem, ao apreciar a presente ação civil pública,
registra que o recorrente não comprovou que os encartes publicitários nos quais foram
veiculadas promoções eram suficientemente claros em relação às condições específicas
para os consumidores obtê-las.
Destaca que as vedações que foram impostas não eram de fácil
compreensão, notadamente quanto ao prazo de validade das ofertas, formas de
pagamento e taxas de juros, sendo que tais informações foram veiculadas em
caracteres extremamente pequenos, em letras diminutas, o que dificultou a imediata
compreensão do consumidor e violou os deveres de transparência e boa-fé objetiva.
Além disso, a Corte Estadual considera estar comprovado na espécie o ato
ilícito, e caracterizado o dano moral coletivo, na medida em que a conduta dos réus
consistente na violação de direito coletivo de informação, lesionou os interesses dos
consumidores.
No particular, cumpre reafirmar a situação fático-jurídica subjacente, que é
bem sintetizada no seguinte trecho do acórdão recorrido:
"(...) Ressalte-se, também, o preceito contido no parágrafo terceiro do artigo
54 do Código de Defesa do Consumidor, que determina a adoção de
caracteres ostensivos e legíveis nos contratos de adesão, em tamanho de
fonte nunca inferior ao corpo doze, visando facilitar a compreensão pelo
consumidor. Eis o teor do citado dispositivo, verbis :
Art. 54. Contrato de adesão é aquele cujas cláusulas tenham sido
aprovadas pela autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente
pelo fornecedor de produtos ou serviços, sem que o consumidor possa
discutir ou modificar substancialmente seu conteúdo.
............ § 3o Os contratos de adesão escritos serão redigidos em termos
claros e com caracteres ostensivos e legíveis, cujo tamanho da fonte
não será inferior ao corpo doze, de modo a facilitar sua compreensão
pelo consumidor. (Redação dada pela nº 11.785, de 2008). 

Isso não bastasse, o § 4º do mesmo artigo 54 estabelece a obrigatoriedade
de redigir-se com destaque cláusula que implique limitação de direito do
consumidor, de modo a permitir sua imediata e fácil compreensão.
Percebe-se, portanto, da leitura dos dispositivos citados, a intenção do
legislador de assegurar a prestação de informações corretas, claras,
precisas, de forma ostensiva, a fim de evitar que o fornecedor de produtos e
serviços utilize os meios publicitários para embaraçar, enganar e omitir do
consumidor eventuais ônus ou desvantagens que a aquisição do produto ou a
contratação do serviço possa implicar.
Feitas estas considerações, passa-se à apreciação da pretensão da
Defensoria Pública em estender a aplicação do comando do artigo 54, § 3º do
CDC, relativo à redação dos contratos de adesão, à oferta e à publicidade
veiculadas pelos fornecedores de produtos e serviços que compõem o polo
passivo da presente demanda, tendo em conta o princípio da vinculação da
oferta ao contrato.
De fato, não obstante as alegações no sentido de que os encartes
publicitários eram claros em relação às condições específicas para se
obter o direito às promoções, os réus não lograram êxito em comprovar
que as vedações eram de fácil compreensão. Pelo contrário, as cópias
dos panfletos anexadas aos autos pela Defensoria Pública (fls. 53/110)
demonstram que as informações relativas ao prazo de validade das
ofertas, formas de pagamento e taxas de juros estavam impressas em
caracteres extremamente pequenos, dificultando a imediata
compreensão do consumidor e violando os deveres de transparência e
de boa-fé objetiva.
Tem-se, portanto, que os recorrentes infringiram a legislação consumerista,
não prestando informações claras e precisas sobre os serviços e produtos
oferecidos, em flagrante violação aos deveres de transparência e
cooperação, o que lhes impõe o dever de indenizar os danos morais sofridos.
Na hipótese de que se cuida, o lesado é toda a coletividade, considerando a
intranquilidade social que a conduta dos recorrentes vem provocando. De
fato, o consumidor que não consegue divisar as vedações e limitações
redigidas em letra diminuta na publicidade impressa se vê frustrado em sua
expectativa ao descobrir os reais termos do contrato na hora de adquirir a
oferta, experimentando sentimentos de frustração e angústia. Ora, a boa-fé
objetiva, como é cediço, deve ser observada desde a fase das tratativas. Por
outro lado, aqueles que não chegam a celebrar o contrato e adquirir as
mercadorias e serviços também são lesados, pois a conduta dos réus viola a
boa-fé objetiva, que nada mais é que uma norma de conduta imposta pela lei
aos particulares de acordo com a honestidade esperada do ser humano.
Trata-se de um padrão objetivo de conduta, imposto por lei, no intuito de
zelar pelo dever recíproco de lealdade contratual máxima.
Saliente-se, ainda, que o dano moral coletivo consiste na violação de
direito difuso ou coletivo, causando dor, angústia ou sentimento de
desconsideração à sociedade de forma difusa ou a um grupo, classe ou
categoria de pessoas ligadas por vínculo jurídico. No caso de que se
cuida, o dano moral coletivo está consubstanciado na conduta ilícita
dos réus e lesiva aos interesses dos consumidores, sendo certo que
seu atuar provocou uma repulsa coletiva, ensejando um ressarcimento
também de forma coletiva." - (fls. 1.273/1.274).
Portanto, a reforma do aresto, neste aspecto, demanda inegável

necessidade de reexame de matéria fático-probatória, providência inviável de ser adotada
em sede de recurso especial, ante o óbice da Súmula 7 desta Corte.
Nesse sentido, confira-se os seguintes precedentes deste Tribunal Superior
a respeito de campanhas publicitárias grafadas em letras diminutas, que lesionam o
direito do consumidor:
RECURSO ESPECIAL. CONSUMIDOR. AÇÃO CIVIL PÚBLICA.
TELEFONIA. PROPAGANDA ENGANOSA. INFORMAÇÕES
INSUFICIENTES ACERCA DAS RESTRIÇÕES DOS SERVIÇOS
OFERECIDOS COM DESTAQUE EM CAMPANHA PUBLICITÁRIA.
1. Ação civil pública movida pelo Ministério Público de São Paulo contra a
empresa Vivo Participações S/A, imputando-lhe a veiculação de mensagem
publicitária capaz de induzir em erro o consumidor a respeito das
características dos serviços prestados, indicando como vantagem a
possibilidade, divulgada em grande destaque, de o usuário falar por até
quarenta e cinco (45) minutos e pagar apenas três (3) minutos, mas
informando a restrição dessa forma de uso, por meio de letras grafadas
em fonte de tamanho reduzido, apenas para ligações locais realizadas
para telefone fixo da própria Vivo entre as 20h e as 8h do dia seguinte de
segunda a sábado e, em qualquer horário, aos domingos e feriados.
2. A empresa líder do grupo econômico (Vivo Participações S.A.) possui
legitimidade passiva "ad causam" para constar do polo passivo da ação civil
pública em que se discute a campanha publicitária executada por empresa
por ela controlada (Vivo S.A).
3. Reconhecimento pelo acórdão recorrido da natureza enganosa da
propaganda veiculada (art. 37, § 1º, do CDC).
4. Aferir se a campanha publicitária, objeto da ação civil pública, teve
aptidão para induzir o consumidor em erro exigiria desta Corte Superior
a revaloração do conjunto fático-probatório dos autos, o que lhe é
vedado, nos termos da Súmula 07/STJ.
5. Doutrina e jurisprudência acerca do tema.
6. RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO.
(REsp 1599423/SP, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO,
TERCEIRA TURMA, julgado em 22/11/2016, DJe 28/11/2016) - 

PROCESSUAL CIVIL E CONSUMIDOR. OFERTA. ANÚNCIO DE VEÍCULO.
VALOR DO FRETE. IMPUTAÇÃO DE PUBLICIDADE ENGANOSA POR
OMISSÃO. ARTS. 6º, 31 E 37 DO CÓDIGO DE DEFESA DO
CONSUMIDOR. PRINCÍPIOS DA TRANSPARÊNCIA, BOA-FÉ OBJETIVA,
SOLIDARIEDADE, VULNERABILIDADE E CONCORRÊNCIA LEAL.
DEVER DE OSTENSIVIDADE. CAVEAT EMPTOR. INFRAÇÃO
ADMINISTRATIVA NÃO CARACTERIZADA.
1. É autoaplicável o art. 57 do Código de Defesa do Consumidor - CDC, não
dependendo, consequentemente, de regulamentação. Nada impede, no
entanto, que, por decreto, a União estabeleça critérios uniformes, de âmbito
nacional, para sua utilização harmônica em todos os Estados da federação,
procedimento que disciplina e limita o poder de polícia, de modo a fortalecer
a garantia do due process a que faz jus o autuado.
2. Não se pode, prima facie, impugnar de ilegalidade portaria do Procon
estadual que, na linha dos parâmetros gerais fixados no CDC e no decreto
federal, classifica as condutas censuráveis administrativamente e explicita

fatores para imposição de sanções, visando a ampliar a previsibilidade da
conduta estatal. Tais normas reforçam a segurança jurídica ao estatuírem
padrões claros para o exercício do poder de polícia, exigência dos princípios
da impessoalidade e da publicidade. Ao fazê-lo, encurtam, na medida do
possível e do razoável, a discricionariedade administrativa e o componente
subjetivo, errático com frequência, da atividade punitiva da autoridade.
3. Um dos direitos básicos do consumidor, talvez o mais elementar de todos,
e daí a sua expressa previsão no art. 5o, XIV, da Constituição de 1988, é "a
informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com
especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade
e preço" (art. 6º, III, do CDC). Nele se encontra, sem exagero, um dos
baluartes do microssistema e da própria sociedade pós-moderna, ambiente
no qual também se insere a proteção contra a publicidade enganosa e
abusiva (CDC, arts. 6º, IV, e 37).
4. Derivação próxima ou direta dos princípios da transparência, da confiança
e da boa-fé objetiva, e, remota dos princípios da solidariedade e da
vulnerabilidade do consumidor, bem como do princípio da concorrência leal, o
dever de informação adequada incide nas fases pré-contratual, contratual e
pós-contratual, e vincula tanto o fornecedor privado como o fornecedor
público.
5. Por expressa disposição legal, só respeitam o princípio da transparência e
da boa-fé objetiva, em sua plenitude, as informações que sejam "corretas,
claras, precisas, ostensivas" e que indiquem, nessas mesmas condições, as
"características, qualidades, quantidade, composição, preço, garantia, prazos
de validade e origem, entre outros dados" do produto ou serviço, objeto da
relação jurídica de consumo (art. 31 do CDC, grifo acrescentado).
6. Exigidas literalmente pelo art. 31 do CDC, informações sobre preço,
condições de pagamento e crédito são das mais relevantes e decisivas na
opção de compra do consumidor e, por óbvio, afetam diretamente a
integridade e a retidão da relação jurídica de consumo. Logo, em tese, o tipo
de fonte e localização de restrições, condicionantes e exceções a esses
dados devem observar o mesmo tamanho e padrão de letra, inserção
espacial e destaque, sob pena de violação do dever de ostensividade.
7. Rodapé ou lateral de página não são locais adequados para alertar o
consumidor, e, tais quais letras diminutas, são incompatíveis com os
princípios da transparência e da boa-fé objetiva, tanto mais se a
advertência disser respeito à informação central na peça publicitária e a
que se deu realce no corpo principal do anúncio, expediente astucioso
que caracterizará publicidade enganosa por omissão, nos termos do art. 37,
§§ 1º e 3º, do CDC, por subtração sagaz, mas nem por isso menos danosa e
condenável, de dado essencial do produto ou serviço.
8. Pretender que o consumidor se transforme em leitor malabarista (apto a
ler, como se fosse natural e usual, a margem ou borda vertical de página) e
ouvinte ou telespectador superdotado (capaz de apreender e entender, nas
transmissões de rádio ou televisão, em fração de segundos, advertências
ininteligíveis e em passo desembestado, ou, ainda, amontoado de letrinhas
ao pé de página de publicação ou quadro televisivo) afronta não só o texto
inequívoco e o espírito do CDC, como agride o próprio senso comum, sem
falar que converte o dever de informar em dever de informar-se,
ressuscitando, ilegitimamente e contra legem, a arcaica e renegada máxima
do caveat emptor (= o consumidor que se cuide).
9. A configuração da publicidade enganosa, para fins civis, não exige a
intenção (dolo) de iludir, disfarçar ou tapear, nem mesmo culpa, pois se está

em terreno no qual imperam juízos alicerçados no princípio da boa-fé
objetiva.
10. Na hipótese particular dos autos, contudo, a jurisprudência do STJ,
considerando as peculiaridades do caso concreto sob análise, é no sentido
de que o anúncio publicitário consignou, minimamente, que o valor do frete
não estava incluído no preço ofertado, daí por que inexiste o ilícito
administrativo de publicidade enganosa ou abusiva. Desnecessário prevenir
que tal conclusão soluciona o litígio apenas e tão somente no âmbito do
Direito Administrativo Sancionador, isto é, de punição administrativa imposta
na raiz do poder de polícia, sem que se possa, por conseguinte, fazer
repercuti-la ou aproveitá-la em eventuais processos reparatórios civis, nos
quais a análise da matéria ocorre à luz de outros regimes e princípios.
11. Agravo Regimental não provido.
(AgRg no AgRg no REsp 1261824/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN,
SEGUNDA TURMA, julgado em 14/02/2012, DJe 09/05/2013) - g.n.
5. De outra senda, o Tribunal de origem registra a inexistência de perda do
objeto em razão do encerramento das atividades da recorrente no Estado.
Ocorre que a conduta lesiva aos deveres de boa-fé e transparência ocorreu
quando a recorrente ainda atuava no Rio de Janeiro, persistindo o dever de indenizar.
Assim, não há como acolher a alegação de ofensa ao art. 462 do CPC/73,
pois o provimento pretendido necessita reexaminar matéria fático-probatória, atraindo,
mais uma vez, o veto da Súmula 7 desta corte.
6. Por outro lado, o conhecimento do recurso fundado na alínea “c” do
permissivo constitucional pressupõe a demonstração analítica da alegada divergência.
Para tanto, faz-se necessário a transcrição dos trechos que configurem o dissenso, com
a indicação das circunstâncias que identifiquem os casos confrontados. (Nesse sentido:
REsp 441.800/CE, Rel. Ministro JORGE SCARTEZZINI, DJ 2.8.04).
No caso em tela, a parte agravante traz à colação ementa de julgados,
contudo não procede ao cotejo destes com o caso dos autos; apenas traça uma
conclusão conveniente em face dos enunciados estampados nas ementas, não sendo
aferível a similitude fática entre esses acórdãos e o do caso em julgamento.
A falta de cotejo analítico impede o acolhimento do apelo, pois não foram
demonstradas em quais circunstâncias o caso confrontado e os arestos paradigmas
aplicaram diversamente o direito, sobre a mesma situação fática.
Importante salientar que a análise do apelo especial fundado em alegado
dissídio jurisprudencial deve ser demonstrado nos moldes exigidos pelos artigos 541,
parágrafo único, do CPC e 255, § 2º, do Regimento Interno do Superior Tribunal de
Justiça, o que não ocorreu.

7. Ante o exposto, nego provimento ao agravo interposto por LOJAS
INSINUANTE S.A.
Publique-se. Intimem-se.
Brasília (DF), 11 de outubro de 2017.
MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO
Relator

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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