O estupro de vulnerável na recente alteração penal

O estupro de vulnerável na recente alteração penal

O presente trabalho visa demonstrar o surgimento de recentes alterações ocorridas no Código Penal, tecendo criticas quanto ao dispositivo que cuida do estupro de vulnerável (artigo 217-A do CP).

Introdução:

O assunto ora proposto tece criticas quanto à abordagem do tema referente ao estupro praticado contra os menores de 14 anos, posto que o legislador não conseguiu dirimir a divergência que se dava à possibilidade de comprovação da vontade do menor para a pratica sexual.

Conteúdo:

A lei 12.015, de 07 de agosto de 2.009 trouxe importantes modificações para o atual e vigente Código Penal, alterando os crimes definidos, até então, no título VI “Dos Crimes Contra os Costumes”, que ganhou nova terminologia, qual seja, “Dos Contra a Dignidade Sexual”. Tal atualização foi bastante abrangente, oportunidade na qual se criaram novas condutas típicas, excluindo-se outras entendidas como desatualizadas, havendo inclusive inserção de novos núcleos em tipos penais já existentes.

Após breve análise, pode-se verificar que agiu bem o legislador quanto a algumas alterações, assim como deixou a desejar no tocante a outras, como no atual artigo 217-A “caput”, que tipifica o “Estupro de vulnerável”, que passo a comentar.

O citado artigo substituiu o revogado artigo 224, que trazia hipóteses de presunção de violência no estupro, seja pela idade não maior de 14 anos da vítima, por apresentar ela problemas mentais quando conhecidos pelo agente, ou mesmo ante a impossibilidade de resistência. Tal artigo era aplicando juntamente com o artigo 213, antiga figura do estupro. Hoje, trata-se de tipo penal autônomo: “Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos Pena – reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos”.

No tocante à menoridade, a doutrina e jurisprudência sempre discutiram se a presunção estipulada pelo dispositivo anterior era absoluta (juris et de jure) ou relativa (júris tantum). Significa dizer se o réu poderia ou não provar a validade do consentimento da vítima menor de 14 anos para o ato sexual, de modo a não se configurar crime. O STF interpretava restritivamente (RT 410/118, 127, 466/331), assim como a doutrina majoritária.

Pois bem. Com a alteração, o legislador retirou o vocábulo “presunção”, tipificando que se configurará crime a conjunção carnal ou prática de outro ato libidinoso com menor de 14, chamado de “vulnerável”.

A leitura do dispositivo demonstra o desejo do legislador em findar as diversas interpretações acerca do termo “presunção”, trazendo regra absoluta para tipificação do delito. Todavia, a tentativa do legislador foi em vão, posto que nunca conseguirá mudar uma realidade existente na sociedade por meio de palavras postas. Ora, é sabido que o ingresso de adolescentes se dá cada vez mais cedo na vida sexual, cabendo à própria sociedade e ao Estado realizarem políticas públicas em busca da solução para o problema.

Punir a pessoa que manteve relações sexuais ou prática de atos libidinosos com menor de 14 anos, sem qualquer análise detalhada do ocorrido, implicaria em conceder punição arbitrária ao agente, penalizando-o pela omissão daqueles que não zelaram pelo menor, ou pela falta de políticas sociais que preservassem o crescimento e bem-estar deste, propiciando olhares a sua educação, tratamento familiar e convivência sadia na sociedade.

A punição deverá efetivamente ocorrer na hipótese de não consentimento do menor de 14 anos, constatada sua imaturidade no assunto, ou mesmo quando existir o dolo no agente, sabendo tratar-se de menor abarcado pela norma e que não possua uma vida sexual ativa, tampouco experiência no assunto. Com razão, assinala o professor Guilherme de Souza Nucci que a citada dúvida acerca do consentimento válido do menor continuará aberta, uma vez que este deverá ser comprovado.

Segue ainda afirmando que o artigo 217-A do código penal poderia trazer modernidade ao sistema, refletindo nossa realidade, o que não ocorreu. A lei aplicada de maneira idêntica em diferentes casos implicaria em ofensa à dignidade da pessoa humana, não levando em consideração as diferentes realidades econômicas, geográficas e culturais de nosso país.

Certamente, fatores sociais e individuais do réu e do menor (maturidade, personalidade, etc.) indicariam uma correta aplicação da pena ou a absolvição, observando-se o principio da indivualizacao da pena.

Conclusões:

Na elaboração do presente trabalho, revelou-se falta de técnica do legislador ao modificar o diploma penal, demonstrando falta de adequação à realidade social em que vivemos. Indubitavelmente, novos posicionamentos doutrinários e entendimentos jurisprudenciais irão se formar acerca do artigo 217-A, para que o dispositivo tenha plena aplicação, atingindo os seus fins.

Referências:

NUCCI, G. DE SOUZA. Crimes contra a Dignidade Social. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009.

MIRABETE, J. F. Manual de Direito Penal. 18. ed. v.2. São Paulo: Atlas, 2001.

ESTEFAM, A. Crimes sexuais. São Paulo: Saraiva, 2009.

Sobre o(a) autor(a)
Elton Fernando Rossini Machado
Advogado integrante do escritório Abramides Gonçalves Advogados, em Bauru-SP. Mestrando em Direito pela Unimar. Professor universitário.
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