Iminência de greve no Judiciário Paulista

Iminência de greve no Judiciário Paulista

Explanação sobre a possível deflagração de nova greve dos sevidores do TJSP.

Atualmente tenho recebido e-mails sobre o meu artigo: "A greve da justiça estadual de São Paulo - A greve do Judiciário é legal?", postado em 08/jul/2004 (http://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/1658/A-greve-da-justica-estadual-de-Sao-Paulo). O artigo em questão foi escrito antes da última greve, ou seja, não se refere a atual greve (apesar de seus argumentos serem válidos para a presente) e os serventuários do Judiciário Paulista sabem disso por já o terem citado durante a última greve.

Assim, descobri (da pior maneira possível) que a ASSETJ divulgou recentemente em informativo eletrônico a todos os servidores do Judiciário Paulista meu artigo anterior sobre a greve (http://www.assetj.org.br/portal/?secao=lendonews&taskCat=5&taskNot=2168) e isso não me foi comunicado oficialmente e, muito menos, me foi dado o direito de resposta ou de expor a minha opinião ou versão da questão. Em razão disso é que venho recebendo e-mails e "questionamentos" presenciais por parte dos servidores que sentiram ofendidos e que pensam que o artigo foi redigido e postado recentemente.

Eu compreendo a situação e posição dos servidores, mas, por óbvio que, como eu não sou servidor do Judiciário Paulista, não sinto na pele a questão. Logicamente cada um defende seus próprios interesses e têm prioridade nas questões que lhe dizem respeito. O egocentrismo é natural do ser humano.

Eu sou profissional liberal, ou seja, não tenho salário, contra-cheque ou holerite. Assim, não tenho vencimentos certos todo quinto dia útil do mês. E, pior, muito do meu ganho vem de ações condicionais, ou seja, eu somente ganho se meu cliente ganhar e isso somente no final do processo. Outras ações são nomeações da Defensoria Pública do Estado, onde, também, o advogado somente ganha meses depois do trânsito em julgado da ação. Agora imagine como fica o advogado numa greve do Judiciário. Quando o advogado vai receber seus honorários? E quanto as despesas, contas e sustento do advogado nesse período? O advogado não pode se preparar durante vários meses economizando e reservando um dinheiro para poder estar preparado para a greve (leia-se período sem vencimentos), mas os servidores do Judiciário Paulista sim.

Para um advogado poder trabalhar tem que apagar uma anuidade absurda da OAB, recolher INSS e ISS, pagar taxa de fiscalização à Prefeitura, o escritório tem diversas despesas (aluguel, IPTU, energia elétrica, água e saneamento básico, coleta de lixo, combate à incêndio, alvará de funcionamento, telefone, papel, tinta/tonner da impressora, livros, periódicos de atualização jurídica, Internet, manutenção do computador, faxina, transporte, uniforme de trabalho, etc).

Nada para o advogado é de graça. Tudo ele tem que pagar e necessita de muitas ferramentas de trabalho. As pessoas não compreendem que o que o advogado ganha numa ação judicial tem que levar em conta quanto tempo demorou a ação judicial e quais foram as despesas que ele teve naquele processo, ou seja, o que o advogado ganha não é líquido, vez que tem que deduzir várias despesas que ele teve durante todo esse tempo. Assim trata-se de um tremendo ato de ignorância um cartorário pensar que se ele ganhasse R$ 1,00 (um real) por cada processo que ele atua, estaria rico. Explica-se. O escrevente possui remuneração, ou seja, ele não receberia somente o R$ 1,00 por processo e, se assim o fosse, nunca poderia outro funcionário trabalhar no mesmo processo, sob pena de terem que dividir o R$ 1,00 por todos os servidores que atuaram no processo. Ainda mais, o escrevente não gasta nenhum centavo com ferramenta de trabalho, já o advogado tem que bancar tudo. Desse modo, e se o escrevente tivesse que deduzir desse R$ 1,00 por processo o gasto que ele teve com o papel, tinta, energia elétrica, telefone, Internet, etc? Quanto iria sobrar? Sobraria alguma coisa? E se o escrevente tivesse que cumprir religiosamente todos os seus prazos sob pena de sofrer descontos em seus vencimentos? Seria um absurdo não? Mas é isso o que ocorre todos os dias com os advogados, porque se ele perde prazo, prejudica seu cliente e afeta seus honorários.

Acredito que antes de uma greve deveria tentar outros meios menos drásticos, tais como, num único dia de paralisação como aviso, fazer uma passeata na Av. Paulista até a cúpula do Judiciário e usar a Mídia para pressionar e esclarecer a população. Simples notas em jornais locais não possuem o mesmo efeito.

E, mesmo durante uma greve, haveria de ser respeitar os trâmites de ações essenciais, tais como: de Execuções de Alimentos, separação de corpos, despejos, reintegrações de posse, pedidos de liminares e tutelas antecipadas, etc (art. 173 e 174), e, principalmente, as certificações de trânsito em julgado nos processos que somente faltam isso (pois muitos honorários dos advogados são recebidos após essa fase processual) e as expedições de certidões de honorários dos advogados nomeados pela Defensoria Pública, pois o direito de um não pode se sobrepor ao direito do outro, ou seja, mesmo que a greve seja um direito e tenha uma reivindicação justa, a população não pode ser prejudicada com isso e, como isso seria impossível, haveria de se manter um mínimo de funcionamento do Judiciário durante eventual greve, o que não foi respeitado na última greve. Quem tem o poder de dizer se a petição é urgente ou emergente é, em primeiro lugar, o CPC (art. 173 e 174) e a legislação extravagante que regulamentam a questão processual e, em segundo lugar, o patrono da parte e não o cartorário.

De nada adianta o Tribunal decretar que os prazos estarão suspensos durante a greve, pois isso não fará os advogados receberem seus honorários em dia e não fará com que pessoas necessitadas recebam suas pensões alimentícias em dia. É uma hipocrisia dizer aos advogados que os prazos estão suspensos durante a greve, pois a correção monetária, juros de mora, multa moratória, etc, dos seus débitos e de seus clientes não estarão com a contagem dos prazos suspensos. Desse modo, os credores do advogado e dos clientes do advogado não vão "dar a mínima" para a greve dos servidores do Judiciário Paulista, ou seja, eles vão querer receber seus créditos com todos os acréscimos legais. Agora imagine se o advogado teve que usar o cartão de crédito para poder sobreviver durante a greve. Quem irá pagar os juros do cartão de crédito do advogado?

Muitos (claro que não são todos) servidores possuem raiva ou inveja dos advogados pensando que eles ganham muito mais do que eles e trabalham muito menos do que eles, o que não é verdade. Muitos e muitos advogados trabalham de manhã, tarde, de noite, sábados, domingos e feriados (e não recebem hora extra por isso), pois possuem prazos a cumprir e não podem tirar férias, dias de licença, abonarem, terem substitutos ou poderem darem a desculpa de excesso de serviço ou de falta de funcionários para poderem apresentarem as petições fora do prazo. Se o advogado não faz as coisas no prazo está "fudido"! E, muitas das ações o advogado acaba só tendo despesa, trabalho, perda de tempo, dores de cabeça, etc, porque ou acabou perdendo a ação condicional, ou acabou levando calote do cliente ou não encontrou algo (bem, crédito, etc) penhorável do devedor executado.

Quando é o advogado que está lutando pelo seu "ganha pão", os servidores costumam não dar a mínima para isso, pois não é problema deles; mas, agora, quando falam em greve querem o apoio dos advogados que eles menosprezam e têm prazer em ferrar? Muitos escreventes, apesar de saberem muito bem a data limite dos advogados apresentarem as certidões de honorários da Defensoria Pública, fazem questão de somente expedi-las após esse prazo somente para o advogado demorar mais um mês para poder receber seus honorários. Outros, apesar de saberem que ao advogado passa por privações, necessidades e dificuldades financeiras, sentem prazer em obstruírem a concessão dos benefícios da Justiça Gratuita quando militam em causa própria, principalmente quando estão entrando em juízo justamente para poderem receber seus honorários pendentes.

Qualquer pessoa que pega uma petição do advogado ou olha um processo, ao analisar superficialmente achará que o advogado está recebendo muito dinheiro por pouco trabalho, mas ela não sabe quanto tempo de leituras, estudos, pesquisas, debates... estão por trás daquela petição e qual é o custo operacional para poder fazer uma petição daquela. Não há "modelinhos prontos" para tudo. O advogado tem que criar, inventar, bolar, raciocinar, especular... Nenhuma ação, causa ou processo é idêntico a outro. Há detalhes pormenores que os diferenciam e as leis mudam com muita frequência. Um processo não envolve somente petições, mas produções de prova. Um “modelinho” não resolve o problema de quais são, quantas são, quando são, como são e por quem são as provas a serem produzidas para o êxito da demanda. A pessoa somente saberia o que é isso se advogasse e pudesse "sentir na pele" o que é ser advogado.

Exemplificando: Numa grande empresa havia uma máquina que parou de funcionar e ninguém sabia a causa e, muito menos, como consertá-la. Muitos curiosos, intrometidos, encheridos, palpiteiros, sabidões, espertalhões... mexeram na máquina e nada. Então o gerente resolveu solicitar os serviços de um profissional habilitado na questão. O técnico chegou, analisou a máquina por cinco minutos, pegou uma chave de fenda e deu duas voltas e meia num parafuso e a máquina voltou a funcionar perfeitamente. Maravilhado com o resultado, o gerente perguntou quanto eram os honorários do técnico, o qual respondeu que eram R$ 300,00. O gerente ficou estarrecido e retrucou se não estaraia muito caro por um simples apertão de parafuso e então o técnico respondeu que, pelo contrário, não estava nada caro, pois pelo simples aperto do parafuso estava cobrando apenas R$ 10,00 e o restante era pelo conhecimento técnico, o qual teve que pagar e estudar por anos e continuar a se atualizando e ter empresa aberta com várias despesas (aluguel, IPTU, água, luz, telefone, ISS, alvará de funcionamento, anuidade da entidade de classe, tributos, manutenção do veículo, combustível, ferramentas, livros, funcionários, materiais de escritório, produtos de limpeza, uniforme, etc) para poder trabalhar legalmente e poder saber qual foi o problema, qual ou quais dos oitocentos parafusos era para ser mexido, se era para retirar, trocar, lubrificar, lixar, vedar, apertar ou afrouxar e quantas voltas eram para se dar...

O cliente do advogado chora no preço, cobra serviço, tem sempre pressa, quer tudo na hora, reclama da demora, culpa o advogado por tudo, quer atendimento VIP, enrola para pagar e nunca está satisfeito, achando que o advogado não fez mais do que sua obrigação e que poderia ter feito melhor do que fez. Além do que, pensa que o advogado é instituição de caridade, assistente social, psicólogo, ministro religioso, terapeuta, etc.

O juiz sempre procura colocar defeito nas petições e nas ações do advogado. Sempre analisa aquilo que o advogado não juntou aos autos ou aquele argumento que ele não usou para utilizar como desculpa para indeferir a pretensão do cliente.

Assim, por exemplo, se o advogado juntou o documento “A”, o juiz alega que deveria ter juntado o documento “B”. Se juntou o documento “B”, o juiz alega que deveria ter juntado o documento “A”. Se o advogado juntou os dois documentos (“A” e “B”), o juiz alega que deveria ter juntado o documento “C”, ou que os documentos “A” e “B” juntados não preenchem todas as formalidades e requisitos legais ou que o advogado está tumultuando o processo ao juntar tantos documentos. Se não junta documento nenhum, o juiz alega que deveria ter juntado. Se junta, o juiz alega que não havia necessidade. E cada juiz entende de um jeito. Um que a prova é o documento “A”, outro que é o documento “B”, outro que são os documentos “A” e “B”, outro que é o documento “C”, outro que é o documento “D”, outro que são os documentos “A”, “B”, “C” e “D”, outro que não precisa de documento nenhum... Tal prática também ocorre com as teses e dispositivos legais, assim, se quando o advogado usa a tese “A”, o juiz alega que deveria ter sido a tese “B”... Quando cita a norma “X”, o juiz alega que deveria ter sido a norma “Y”...

Cada vez mais o Estado atribui ao advogado um encargo que não lhe pertence, tais como, por exemplo, fazer a função de procurador do INSS e das Receitas Federais e Estaduais ao informar, calcular e zelar pelos recolhimentos devidos; fazer as vezes de contador judicial e apresentar cálculos e planilhas de valores; fazer as vezes de Oficial de Justiça e pessoalmente ir em órgãos públicos e empresas realizar diligências e protocolar ofícios etc.

Sobre o(a) autor(a)
Marcio Adriano Caravina
Advogado em Presidente Prudente/SP, Coordenador do Projeto A OAB Vai a Escola e Presidente da Comissão de Informática Jurídica da 29ª Subsecção da OABSP.
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