Banco terá de ressarcir cliente por vender máquinas e equipamentos alienados a outros
O Banco Industrial e Comercial S/A, de Minas Gerais, terá que reembolsar o comerciante Wanderley Alves de Miranda, a quantia de R$ 26 mil, mais juros e correção monetária desde 15.10.1997, por ter vendido a ele máquinas e equipamentos de construção civil, que haviam sido alienados fiduciariamente a outros bancos. A decisão é da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que decidiu, no entanto, reduzir os juros de mora de 6% ao mês para 6% ao ano.
Em 15 de outubro de 1997, o comerciante negociou a compra de equipamentos, realizando o pagamento à vista. Posteriormente, no entanto, não encontrou quatro dos equipamentos adquiridos do banco, que havia garantido que estavam nos canteiros de obra da Ceesa Construtora de Estradas e Estruturas, falida, que dera em garantia da dívida com o banco.
Após vários meses de procura, o comerciante ficou sabendo que os equipamentos tinham sido apreendidos pelo banco Multiplic S/A, que também havia recebido os equipamentos da construtora em garantia de empréstimo. "O banco réu já sabia de tal fato, mesmo assim vendeu os equipamentos ao autor, agindo com dolo e má-fé", afirmou o advogado. Outra das máquinas tinha sido apreendida pelo Itaú.
Na ação contra o banco, o comerciante pediu indenização, com juros e correção monetária, das horas paradas de três máquinas. "O autor não pôde alugar os equipamentos, sendo que constituiu firma (registrada em 24/10/1997) com tal intuito", justificou a defesa. Requereu, ainda, ressarcimento do preço total pago pelas máquinas em 15/10/1997, com juros e correção pelo mesmo índice que praticava o banco réu para empréstimos pessoais, ou de bancos similares, que na média anual estaria em 6% ao mês.
Além da citação do banco réu, pediu a notificação ao Banco Central, para que ficasse ciente da questão e tomasse "as providências legais que a Lei lhe confere e determina, como órgão fiscalizador do sistema financeiro nacional".
O banco se defendeu, alegando, preliminarmente, incompetência do juízo, já que a presença do Banco Central no processo deslocaria a competência para a Justiça Federal. No mérito, argumentou que não praticou nenhuma conduta prejudicial ao autor, não tendo, portanto, a obrigação de indenizá-lo. Afirmou, ainda, que houve má-fé do autor ao entrar com a ação, pois duas máquinas, ditas não encontradas, estariam em poder do comerciante.
Em primeira instância o banco perdeu. O juiz José Marçal dos Santos descartou, primeiramente, a alegação de incompetência. "O Banco Central apenas foi notificado e, obviamente não apresentou resposta. Destarte, descarto a alegada incompetência deste juízo para processar e julgar o pedido", afirmou. Quanto ao mérito, considerou as provas suficientes para condenar o banco, nos termos do pedido do autor. "Face ao conjunto probatório restou, induvidosamente, provado que o réu, por sua desorganização, vendeu bens que nunca poderia entregar", justificou. "No caso, correta a aplicação de juros de 6% ao mês, pois se o banco utiliza referida taxa, às vezes até maiores, em seus empréstimos pessoais, cheque especial etc, nada mais justo que reembolse o autor com as mesmas taxas de juros de suas aplicações", considerou.
A sentença foi mantida pelo Tribunal de Alçada do Estado de Minas Gerais, que negou provimento à apelação. "Estando caracterizado nos autos que o vendedor não entregou parte dos bens a que se obrigou em contrato de compra e venda desprovido de condições especiais, revela-se justo e correto que o comprador, que pagou o preço ajustado, seja reembolsado dos valores correspondentes aos bens por ele não recebidos", afirmou o Tribunal. Reconheceu, no entanto, que houve equívoco na sentença a respeito da aplicação dos juros, mas não reformou, alegando não ter sido suscitado na apelação do banco.
No recurso para o STJ, o banco protestou, afirmando que os juros de mora foram estabelecidos em 6% ao mês desde a data do reembolso pelo recorrido, ferindo o artigo 1.062, do Código Civil, que prevê tais juros em 6% ao ano, se não houver estipulação em contrário.
Para o ministro Aldir Passarinho, relator do recurso, o Tribunal mineiro deveria ter reparado o equívoco do juiz singular, que estabeleceu os juros muito acima do limite legal, mesmo que a apelação não tenha tocado no tema. "Ocorre que os juros moratórios são objeto de norma legal (art. 1.062, do Código Civil), de ordem pública, pelo que cabível a sua aplicação ex officio pelo Tribunal ad quem", afirmou o ministro.
Ao dar provimento apenas para a redução dos juros, o relator afirmou que não há o que modificar na decisão quanto ao marco inicial para a fluição dos juros. "Havendo o pagamento indevido, caracterizado o procedimento ilícito do banco réu, os juros correm desde aquela data, tal como fixado pela instância ordinária, isto é, do evento danoso", concluiu Aldir Passarinho.