Cláusula que restrinja tratamentos médicos é abusiva, ainda que contrato seja anterior à Lei dos Planos de Saúde

Cláusula que restrinja tratamentos médicos é abusiva, ainda que contrato seja anterior à Lei dos Planos de Saúde

É abusiva a cláusula de plano de saúde que limite qualquer procedimento médico, fisioterápico ou hospitalar prescrito para doenças cobertas nos contratos de assistência à saúde, firmados antes ou depois da Lei 9.656/98. Os ministros da Quarta Turma reafirmaram jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e entenderam que, embora a Lei dos Planos de Saúde não retroaja aos contratos celebrados antes de sua vigência, é possível aferir abuso com base nas disposições do Código de Defesa do Consumidor (CDC).

O Ministério Público Federal (MPF) ajuizou ação civil pública contra empresas de plano de saúde visando declarar a nulidade das cláusulas restritivas, além de condená-las a não mais limitar procedimentos contratados. O MPF ainda pediu a divulgação do afastamento de tais restrições aos respectivos contratados e compensação por danos morais.

O juízo federal julgou procedentes os pedidos, com exceção dos danos morais, e a sentença foi mantida pelo Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2). As empresas recorreram ao STJ, e o relator à época, desembargador convocado Lázaro Guimarães, rejeitou monocraticamente os pedidos, entendendo que, “se a seguradora assumiu o risco de cobrir o tratamento da moléstia, não poderia, por meio de cláusula limitativa e abusiva, reduzir os efeitos jurídicos dessa cobertura, tornando, assim, inócua a obrigação contratada”.

As empresas, em agravo interno, sustentaram a inaplicabilidade da Lei 9.656/98 aos contratos firmados antes de sua vigência e alegaram que a limitação de procedimentos fisioterápicos nas apólices não coloca o consumidor em desvantagem exagerada, inexistindo fundamento jurídico para justificar a declaração de abuso feita no acórdão recorrido.

Defesa do consumidor

Para o relator do agravo, ministro Raul Araújo, o TRF2 não determinou a aplicação retroativa da Lei 9.656/98, mas examinou o abuso da cláusula que figurava nos contratos firmados antes da sua vigência a partir do sistema introduzido pelo CDC, especialmente com base no seu artigo 51, IV.

“Nessa linha, à luz do Código de Defesa do Consumidor, devem ser reputadas como abusivas as cláusulas que nitidamente afetam de maneira significativa a própria essência do contrato, impondo restrições ou limitações aos procedimentos médicos, fisioterápicos e hospitalares prescritos para doenças cobertas nos contratos de assistência e seguro de saúde dos contratantes”, entendeu o ministro em seu voto.

Ele ainda destacou que o STJ consolidou o entendimento segundo o qual, se o contrato de assistência e seguro de saúde celebrado entre as partes prevê a cobertura para a doença, “é abusiva a negativa da operadora do plano de saúde quanto aos procedimentos e as técnicas prescritos pelo médico que assiste o paciente”.

AgInt no RECURSO ESPECIAL Nº 1.349.647 - RJ (2012/0218538-6)
RELATOR : MINISTRO RAUL ARAÚJO
AGRAVANTE : GOLDEN CROSS SEGURADORA S/A
AGRAVANTE : BRADESCO SEGUROS S/A
ADVOGADOS : SERGIO BERMUDES E OUTRO(S) - RJ017587
GUILHERME VALDETARO MATHIAS - RJ075643
ERIC CERANTE PESTRE - RJ103840
LUIS FELIPE FREIRE LISBOA - DF019445
ADVOGADA : CAROLINA CARDOSO FRANCISCO MOUTINHO - RJ116999
ADVOGADOS : ANA PAULA ALMEIDA NAYA DE PAULA - DF022915
RAFAELA FILGUEIRAS FUCCI - RJ147427
AGRAVADO : UNIMED-RIO COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO DO RIO
DE JANEIRO LTDA
ADVOGADO : GISELE NEVES CAMERA E OUTRO(S) - RJ099053
AGRAVADO : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
AGRAVADO : UNIÃO
INTERES. : ASSOCIAÇÃO PRÓ SAÚDE DOS SERVIDORES DA JUSTIÇA DO
TRABALHO
INTERES. : CLIMOJ - ASSISTÊNCIA MÉDICA DE JACAREPAGUÁ
EMENTA
AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL E
DO CONSUMIDOR. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PLANOS DE SAÚDE.
LIMITAÇÃO OU RESTRIÇÃO A PROCEDIMENTOS MÉDICOS,
FISIOTERÁPICOS E HOSPITALARES. CONTRATOS ANTERIORES
À LEI 9.656/98. NÃO INCIDÊNCIA. CLÁUSULA ABUSIVA.
RECONHECIMENTO. POSSIBILIDADE. CÓDIGO DE DEFESA DO
CONSUMIDOR. DECISÃO MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO.
1. Não configura ofensa ao art. 535 do CPC/73 o fato de o col. Tribunal de
origem, embora sem examinar individualmente cada um dos argumentos
suscitados, adotar fundamentação contrária à pretensão da parte, suficiente
para decidir integralmente a controvérsia.
2. As regras estabelecidas na Lei 9.656/98 restringem-se ao contratos de
plano de saúde celebrados após sua vigência (art. 35), mas o abuso de
cláusula contratual prevista em avenças celebradas em datas anteriores
pode ser aferido com base no Código de Defesa do Consumidor.
3. À luz do Código de Defesa do Consumidor, devem ser reputadas como
abusivas as cláusulas que nitidamente afetam de maneira significativa a
própria essência do contrato, impondo restrições ou limitações aos
procedimentos médicos, fisioterápicos e hospitalares (v.g. limitação do
tempo de internação, número de sessões de fisioterapia, entre outros)
prescritos para doenças cobertas nos contratos de assistência e seguro de
saúde dos contratantes.
4. Se há cobertura de doenças ou sequelas relacionadas a certos eventos,
em razão de previsão contratual, não há possibilidade de restrição ou
limitação de procedimentos prescritos pelo médico como imprescindíveis
para o êxito do tratamento, inclusive no campo da fisioterapia.
5. Agravo interno não provido.

ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas,
decide a Quarta Turma, por unanimidade, negar provimento ao agravo interno, nos termos do voto
do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Maria Isabel Gallotti, Antonio Carlos Ferreira
(Presidente), Marco Buzzi e Luis Felipe Salomão votaram com o Sr. Ministro Relator.
Brasília, 13 de novembro de 2018 (Data do Julgamento)
MINISTRO RAUL ARAÚJO
Relator

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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