Procedimento do inquérito policial

Procedimento do inquérito policial

Instauração e atos iniciais, instrução, indiciamento, indiciado menor (menor de 21 e maior de 18 anos), incomunicabilidade, deveres da autoridade policial, encerramento, arquivamento.

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Instauração e atos iniciais

Diante da notitia criminis, a autoridade policial deverá instaurar o inquérito policial para investigação do crime. A existência de causa excludente de antijuridicidade não impede a instauração. A antijuridicidade só poderá ser apreciada após a denúncia, ou quando da oportunidade para seu oferecimento, não sendo lícito antes disso trancar-se o inquérito policial sob alegação de que a prova nele produzida induz a inexistência de relação jurídico-material, em verdadeiro julgamento antecipado do indiciado.

Inicialmente, a autoridade policial deve proceder de acordo com o art. 6º/CPP (diligências). Deve "dirigir-se ao local, providenciando para que não se alterem o estado de conservação das coisas, até a chegada dos peritos criminais" (art. 6º, I, do CPP).

Deve a autoridade "apreender os objetos que tiverem relação com o fato, após liberados pelos peritos" (art. 6º, II, do CPP). Esses objetos serão submetidos a exames a fim de verificação da natureza e eficiência (art. 175/CPP). Serão recolhidos ao museu criminal se houver interesse (art. 124/CPP).

Cabe à autoridade "colher todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e suas circunstâncias" (art. 6º, III), devendo-se observar os direitos e as garantias individuais constitucionais quando diligenciar.

Instrução

- Oitiva da vítima

A autoridade deve ouvir o ofendido, se possível (art. 6º, IV). Embora seja relativo o valor probatório das declarações da vítima, são informações muito úteis. O ofendido deve ser notificado para comparecer e prestar suas declarações e, diante do não atendimento sem motivo justo, ser conduzido à presença da autoridade (art. 201, §1º, do CPP), podendo esta determinar, caso necessário, a busca e apreensão (art. 240, § 1º, g).

- Reconhecimento e acareação

Quando necessário, a autoridade deve "proceder o reconhecimento (arts. 226 a 228/CPP) de pessoas e coisas e a acareação" (art. 6º, VI). A acareação deverá ser efetuada quando houver divergências entre as declarações prestadas no interrogatório, depoimento de testemunhas, declarações da vítima etc. (arts. 229 a 230/CPP). É evidente que a acareação só poderá ser feita quando a divergência incidir sobre fatos ou circunstâncias relevantes.

- Exame de corpo de delito

A autoridade deve "determinar, se for o caso, que se proceda o exame de corpo de delito e quaisquer outras perícias" (art. 6º, VII), de conformidade com os arts. 158 a 184/CPP. O exame é indispensável quando o crime deixa vestígios, constituindo-se na verificação dos elementos exteriores ou da materialidade da infração. Cabe ao perito o exame do fato delituoso, de suas causas, consequências etc.

- Simulação dos fatos

A autoridade pode proceder a simulação dos fatos, desde que não contrarie a moralidade ou ordem pública (art. 7º/CPP). O indiciado, porém, não está obrigado a participar da reconstituição, ainda que tenha confessado o crime, pela mesma razão do direito que tem de permanecer calado (art. 5º, LXIII/CF).

Indiciamento

É a imputação a alguém, no inquérito policial, da prática do ilícito penal, ou "o resultado concreto da convergência de indícios que apontam determinada pessoa ou determinadas pessoas como praticantes de fatos ou atos tidos com típicos, antijurídicos e culpáveis". O indiciamento exige que existam indícios razoáveis de autoria.

- Identificação do acusado

A autoridade deve ordenar a identificação do indiciado "pelo processo datiloscópico (impressão digital), se possível, e fazer juntar aos autos sua folha de antecedentes" (art. 6º, VIII).

A CF/88 (art. 5º, LVIII) estabelece que o civilmente identificado não será submetido a identificação criminal, salvo nas hipóteses previstas em lei (Lei nº 12.037/09 - Identificação criminal).

Sendo legal a identificação, a autoridade pode conduzir coercitivamente o indiciado para esse fim desejado, podendo autuá-lo em flagrante pelo crime de desobediência em caso de recusa injustificada. Da mesma forma, pode a autoridade policial enquadrá-lo no crime de falsa identidade quando, ao se identificar, o indiciado fornece dados falsos com a intenção de ocultar a sua verdadeira identidade (existe posicionamento jurisprudência contrário).

- Interrogatório do indiciado

Indiciado o provável autor do fato delituoso, deve a autoridade ouvi-lo, ou seja, interrogá-lo, devendo o respectivo termo ser assinado por duas testemunhas que lhe tenham ouvido a leitura (art. 6º, V). No interrogatório promovido na fase de inquérito policial, não é necessária a presença de advogado, pois o inquérito é inquisitivo e não contraditório (na fase judicial, é imprescindível a presença do advogado no interrogatório).

O indiciado pode ser coercitivamente conduzido para ser interrogado, no entanto, poderá abster-se de responder perguntas (art. 5º, LVIII da CF).

Deve a autoridade "averiguar a vida pregressa do indiciado, sob o ponto de vista individual, familiar e social, sua condição econômica, sua atitude e estado de ânimo antes e depois do crime e durante ele, e quaisquer outros elementos que contribuírem para apreciação de seu temperamento e caráter" (art. 6º, IX).

Quando necessária, poderá ser feita a tomada fotográfica do indicado, para reconhecimento em juízo quando o réu for revel.

Indiciado menor (menor de 21 e maior de 18 anos)

O art. 15 do CPP determina que se o indiciado for menor deverá ser-lhe nomeado um curador. Este artigo se refere ao menor de 21 anos e maior de 18 anos, pois os menores de 18 anos são penalmente inimputáveis.

Como a maioridade civil passou a ser de 18 anos, o art. 15 do CPP perdeu sua aplicabilidade, uma vez que, quando foi criado, o menor de 21 e maior de 18 anos era considerado relativamente incapaz, de modo que precisava ser assistido. Mas como hoje o maior de 18 anos já é considerado plenamente capaz, não existe mais razão para se nomear um curador para quem completou essa idade.

Incomunicabilidade

A fim de impedir-se que o indiciado prejudicasse as investigações comunicando-se com amigos, comparsas do crime etc., previa o art. 21/CPP a incomunicabilidade, exceto com seu advogado.

Esse artigo foi revogado pela CF/88 que proclama: "É vedada a incomunicabilidade do preso" (art. 136, §3º, IV). Se até no estado de defesa (quando o governo deve tomar atitudes severas para preservar a ordem pública ou a paz social) se proíbe a incomunicabilidade, com mais razão não há que se falar em incomunicabilidade na fase de inquérito policial.

Deveres da autoridade policial

Além das providências dos arts. 6º e 7º/CPP, deve a autoridade se incumbir de outras providências referidas no art. 13. Deve:


  • I - "fornecer às autoridades judiciárias as informações necessárias à instrução e julgamento dos processos". Especialmente em seu relatório final, incumbe à autoridade prestar todas as informações e considerações que possam ter utilidade no esclarecimento do crime.
    II - "realizar as diligências requisitadas pelo juiz ou MP". Somente quando forem ilegais haverá oportunidade para a recusa ao cumprimento das requisições.
    III - "cumprir os mandados de prisão expedidos pelas autoridades judiciárias". Mandados referentes às prisões provisórias ou decorrentes de condenação transitada em julgado a pena privativa de liberdade.
    IV - "representar acerca da prisão preventiva". Estando presentes os pressupostos dos arts. 312 e 313/CPP, a autoridade deve representar para a decretação da prisão preventiva, fundamentando o pedido sobre sua necessidade ou conveniência cautelar.
    - Outras providências: proceder novas pesquisas após o encerramento do inquérito policial (art. 18).

Encerramento

Concluídas as investigações, autoridade policial deve fazer minucioso relatório do que tiver sido apurado no inquérito policial (art. 10, §1º, 1ª parte/CPP). Não pode, em sua exposição, emitir nenhum juízo de valor, opiniões ou julgamento. Pode, porém, exprimir impressões deixadas pelas pessoas que intervieram no inquérito: indiciado, vítima, testemunhas etc.

Na instauração do inquérito policial, a autoridade pode classificar o crime. Se após realizada as investigações apurar-se que o crime é diverso do classificado na portaria, o delegado deve alterá-la. No entanto, a classificação do inquérito policial não vincula o MP para o oferecimento da denúncia ou ao querelante para propositura da queixa.

Concluído o inquérito policial e elaborado o relatório, a autoridade deverá remeter os autos ao juiz competente (art. 10, §1º, do CPP), devendo os objetos de crime (provas) acompanhar os autos (art.11). Ao remeter os autos, a autoridade deve oficiar ao Instituto de Identificação e Estatística, ou repartição congênere, mencionando o juízo que tiverem sido distribuídos, e os dados relativos à infração penal e à pessoa do indiciado (art. 23).

Segundo o art. 10, o prazo é de 30 dias para a conclusão do inquérito policial se o indiciado estiver solto, mediante fiança ou sem ela, contando-se o lapso de tempo da data do recebimento pela autoridade da requisição, requerimento ou portaria, que deve ser expedida quando da notitia criminis. Estando o réu preso, o prazo é de 10 dias, contados da data da prisão (flagrante ou preventiva).

A autoridade pode requerer ao juiz a devolução dos autos para realizar diligências ulteriores (quando o réu estiver solto), necessárias a conclusão do inquérito policial.

O MP também pode requerer a devolução do inquérito policial à autoridade para que se realize novas diligências imprescindíveis ao oferecimento da denúncia (art. 16, a contrario sensu). Proposta a ação penal, o MP e querelante poderão requerer ao juiz que, em autos apartados, a autoridade realize diligências importantes para a instrução do processo.

O juiz, ao deferir o pedido de dilação do prazo, deve fixar outro, não podendo exceder 30 dias. A demora, porém, não causa nulidade nos autos, podendo causar apenas punição disciplinar da autoridade, quando o indiciado estiver solto.

Estando o indiciado preso, o prazo não pode ser prorrogado. Excedido tal prazo, haverá constrangimento ilegal à liberdade de locomoção do indiciado, o que leva ao deferimento do habeas corpus, sem prejuízo do prosseguimento do inquérito policial. Tratando-se de prisão processual, o prazo deve ser contado nos termos do art. 798, § 1º, do CPP: começa a fluir do dia imediato à prisão, e os devem ser remetidos a juízo no dia imediato ao término do prazo.


Arquivamento

Mesmo que não fique provada a existência ou autoria do crime, a autoridade policial não pode mandar arquivar o processo (art. 17). Tal providência cabe ao juiz, a requerimento do MP, que deve formular um juízo de valor e fundamentar sua decisão (art. 28).

Discordando o juiz da manifestação do MP, deverá encaminhar os autos ao Procurador-geral para preservar a titularidade da ação penal pública (art. 28/CPP por analogia).

O inquérito policial referente a crime de ação penal pública não pode ser arquivado pelo juiz, ou pelo tribunal, sem a manifestação do MP, cabendo correição parcial (do despacho) ou agravo ao tribunal.

Tratando-se de ação privada, os autos aguardarão a iniciativa do ofendido ou de seu representante legal, ou serão entregues ao requerente, se o pedir, mediante traslado. Se a vítima não oferecer a queixa dentro do prazo, extingue-se a punibilidade. Se pedir o arquivamento, renúncia tácita, também extinguirá a punibilidade.

O juiz não está obrigado a atender ao pedido de arquivamento do MP (art. 28/CPP). É o princípio da devolução, em que o juiz transfere a apreciação do caso ao chefe do MP (procurador-geral). O juiz atua, nesta hipótese, numa função anormal, a de velar e fiscalizar o princípio da obrigatoriedade da ação penal pública. A não apreciação do pedido de arquivamento enseja nulidade do processo a partir do momento em que deveria ser considerado pelo juiz.

O Procurador-geral do MP poderá oferecer a denúncia ou designar outro membro do MP para oferecê-la. Porém, insistindo, o Procurador no arquivamento do inquérito policial, o juiz é obrigado a atendê-lo. O mesmo ocorre com os tribunais, em competência originária. O despacho que arquiva o inquérito policial é irrecorrível: não cabe apelação, recurso em sentido estrito, mandado de segurança etc.

Segundo a Súmula 524/STF: depois de arquivado o inquérito policial, a ação penal não pode ser iniciada se não houver novas provas. O arquivamento do inquérito policial não cria preclusão. A nova prova há de ser substancialmente inovadora. Mas se o inquérito policial foi arquivado em decorrência da atipicidade do fato, é inadmissível a instauração da ação penal.

É inadmissível a instauração da ação penal em inquérito policial arquivado a pedido do MP, mediante ação penal privada subsidiária.

Bibliografia:

TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de Processo Penal. Editora Saraiva. 8ª edição - 2006.
MIRABETE, Júlio Fabbrini. Processo Penal. Editora Atlas S.A., 11ª ed. - 2001.
NORONHA, E. Magalhães. Curso de direito processual penal. 19ª ed. – 1989.

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Perguntas & Respostas

Dúvidas comuns sobre este conteúdo

Pode ser arguida a suspeição da autoridade policial os autos do inquérito?

Não se pode opor suspeição às autoridades policiais nos autos do inquérito, mas o delegado de polícia tem o dever de declarar-se suspeito (artigo 107 do CPP). O interessado poderá provocar a atuação do superior hierárquico da autoridade policial.

Respondida em 09/01/2022
Nos autos do inquérito, é possível opor exceção de suspeição às autoridades policiais?

O artigo 107 do Código de Processo Penal prevê que não se poderá opor exceção de suspeição às autoridades policiais nos autos do inquérito, mas deverão elas declarar-se suspeitas quando ocorrer motivo legal. Assim, caso a autoridade não o faça, caberá à parte interessada pleitear o afastamento do delegado considerado suspeito ao seu superior hierárquico e não perante o juiz.

Respondida em 25/06/2019
É possível a determinação de arquivamento do inquérito, de ofício, pela Autoridade Policial quando não vislumbrar a ocorrência de crime?

Não. A questão deve ser submetida à análise judicial, mediante requerimento do membro do Ministério Público, quando este não se convencer da existência do delito ou de sua autoria

Respondida em 09/04/2018
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