Incidente de resolução de demandas repetitivas e a desconsideração de princípios basilares

Incidente de resolução de demandas repetitivas e a desconsideração de princípios basilares

O NCPC inovou ao incorporar no nosso ordenamento jurídico o incidente de resolução de demandas repetitivas, característico dos países que adotam o sistema Common Law, entretanto, da forma que foi disposto, esse procedimento ignora princípios norteadores o direito, como contraditório e ampla defesa.

O Novo Código de Processo Civil Brasileiro começou a vigorar, trazendo em seu bojo uma proposta de inovação do direito civil instrumental, de forma que, seja célere e eficaz a aplicação das normas, posto que, foram criados diversos institutos voltados para a celeridade processual.

Nesse sentido, surge a ideia de uniformização jurisprudencial, idealizada pelo sistema Common Law e positivada no Código de Processo Civil brasileiro, através do incidente de resolução de demandas repetitivas, que, promete contribuir para “desafogar” e acelerar a prestação jurisdicional, vez que, havendo um entendimento sobre uma matéria e este consequentemente seja solidificado pelos tribunais, será vedado ao juiz de primeiro grau analisar o mérito, devendo apenas aplicar ao caso concreto tal entendimento, de modo que, se assim não o fizer, caberá reclamação por inobservância, que deverá ser proposta pela parte interessada ou Ministério Público, conforme prescreve o art. 985, § 1 e art. 988, inciso II, do NCPC.

Desse modo, sob a ótica do princípio da Celeridade processual, a instauração de incidente de resolução de demandas repetitivas cumprirá o que é proposto, qual seja, celeridade processual. Entretanto, esse novo procedimento, da maneira que foi positivado, exclui consideravelmente do ordenamento jurídico, três dos princípios basilares do direito processual civil brasileiro, quais sejam, o duplo grau de jurisdição, o livre convencimento do juiz e consequentemente o contraditório e a ampla defesa.

O renomado jurista, Oreste Souza Laspro (1995, p.27) caracteriza o instituto do duplo grau de jurisdição “(...) como sendo aquele sistema jurídico em que, para cada demanda, existe a possibilidade de duas decisões válidas e completas no mesmo processo, emanadas por juízes diferentes, prevalecendo sempre a segunda em relação à primeira”.

Dessa forma o incidente de resolução e demandas repetitivas transcorre contra o princípio do duplo grau de jurisdição, vez que, no momento em que o juiz de primeiro grau observa e aplica o entendimento proferido pelos tribunais, não cabe qualquer recurso para reexame da tese aplicada, oposto do que ocorre quando o juiz não observa e não aplica o entendimento proferido, nesta última hipótese, é cabível reclamação, sendo vedado dessa forma, o direito de recorrer da parte que não corroborar com o entendimento positivado, demonstrando assim, a preocupação do legislador em coagir o magistrado de primeira instância à aplicar entendimento firmado por corte superior.

Em decorrência disso, houve também inobservância do princípio o livre convencimento do juiz. Os artigos 370 e 371 do NCPC prescrevem sobre esse princípio, sendo este, um dos poderes que o juiz possui para proferir uma sentença de mérito.

Ocorre que, ao estabelecer o incidente de demandas repetitivas, o Novo CPC retirou do magistrado de primeiro grau a possibilidade de formar seu livre convencimento, vez que, nessa hipótese o mesmo se tornará um mero reprodutor de entendimentos já firmados.

No que tange as partes do processo, o art. 5º, inciso LV, da CF, assegura o princípio do contraditório e ampla defesa, segundo o qual dispõe, “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”. 

Dessa forma, é evidente que a positivação do incidente de demandas repetitivas não levou em consideração um dos princípios basilares, essenciais para a digna prestação jurisdicional, vez que, vedou a possibilidade de recorrer da parte que não corroborar com a tese formulada em instância superior, sendo dessa forma impossível litigar em igualdade, vez que, ficou prejudicada a ampla defesa.

Ao considerar a relação processual em ângulo, qual seja, prestação jurisdicional, partes e juiz, conclui-se que a prestação judiciária será feita a partir de agora de forma sistêmica, vez que, o princípio da celeridade se tornou mais importante que os princípios acima suscitados, além do que, o processo caminha no sentido de que, os entendimentos de tribunais tenham força suprema, assim sendo, o processo melhora por ser célere, porém torna-se obscuro, vez que há dificuldade na obtenção da verdade real, haja vista, ser dispensada toda a produção de provas.

              

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Erisson de Souza Vieira
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