Execução provisória da medida socioeducativa: pressupostos

Execução provisória da medida socioeducativa: pressupostos

A medida socioeducativa pode ser executada imediatamente, independente de trânsito em julgado, somente se a sentença confirmar a internação provisória e for proferida dentro de 45 dias.

Debate-se na doutrina e jurisprudência se a apelação contra aplicação de medida socioeducativa pode ser imediatamente executada, independente do trânsito em julgado.

Além do efeito devolutivo, o recurso tem, em regra, efeito suspensivo (art. 198 do ECA e 1.012 do CPC/2015), salvo se a sentença, cumulativamente:

(a) “confirmar” a internação provisória (STJ: RHC 65.368 (5T), HC 345.549 (6T) e HC 301.135 (6T): trata como tutela provisória ou a antiga tutela antecipada) e;

(b) for proferida dentro do prazo de 45 dias (art. 108). Se o adolescente já estiver em liberdade, o ideal é aguardar o trânsito em julgado.

Quando o STJ equipara a internação provisória à antecipação de tutela – para fins de afastar o efeito suspensivo (anterior art. 520, VII, CPC/73; atual art. 1.020, § 1º, V, CPC/15) -, precisamos ter em mente que a “tutela antecipada” (antigo art. 273 do CPC/73, atuais arts. 294 do CPC/2015) vigora até a sentença. Ou seja, não haveria sentido em conceder efeito suspensivo ao recurso contra decisão exauriente (mérito), sustando-se os efeitos da decisão liminar (cognição sumária), que vigorou durante todo o processo. A internação provisória, diferentemente, tem prazo definido e não necessariamente estará em vigor quando da prolação da sentença.

Assim, a justificativa do item (b) supra: se a medida provisória ainda estiver em vigor quando for confirmada na sentença de mérito, recomenda-se o efeito meramente devolutivo, mantendo-se a internação; caso ultrapassado o prazo de 45 dias, a medida provisória perde a vigência, de modo que a sentença, ainda que a confirme, deve ter efeito suspensivo, pois já houve alteração da situação fática.

Há quem defenda que, mesmo após a Lei n. 12.010/2009, somente há efeito suspensivo aos recursos, para evitar dano irreparável à parte (art. 215, ECA) e que, aguardar o trânsito em julgado, causaria prejuízo ao adolescente. Outros afirmam que a Lei n. 12.010/2009 tem com foco o regime da adoção, de modo que a alteração no art. 198 do ECA não afetaria o procedimento de aplicação das medidas socioeducativas. Com respeito, não convencem esses argumentos.

Primeiro, porque o art. 198 do ECA aplica-se expressamente a todos “procedimentos afetos à Justiça da Infância e da Juventude, inclusive os relativos à execução das medidas socioeducativas” e seu inciso IV, que previa apenas o efeito devolutivo aos recursos, foi revogado pela Lei n. 12.010/2009. Ou seja, passou-se à regra do CPC de também ter efeito suspensivo. Somente a sentença que deferir a adoção produz efeito desde logo, salvo se internacional ou houver algum perigo de dano irreparável (art. 199-A).

Segundo, porque o art. 215 é específico para aplicação de sanções aplicadas nas ações de responsabilidade por ofensa aos direitos assegurados à criança e ao adolescente, referentes ao não oferecimento ou oferta irregular de diversos direitos previstos no art. 208 (“Capítulo VII - Da Proteção Judicial dos Interesses Individuais, Difusos e Coletivos”). Nessas ações, se o ato ilegal ou abusivo for praticado por autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do poder público, cabe ação mandamental (art. 212, § 2º). Se a obrigação for de fazer ou não fazer, cabe a aplicação de tutela específica (art. 213). Nessas circunstâncias, a exigibilidade é imediata, por isso o art. 215 admite a concessão de efeito suspensivo a recurso, para evitar dano irreparável ao sujeito violador da proteção do menor especificada no capítulo, nada se relacionando a adolescente infrator. Observe-se que eventual multa só será exigível do réu após o trânsito em julgado da sentença favorável ao autor (art. 213, § 3º).

Terceiro, embora a aplicação da medida deva ser precoce (próxima à data da infração) e atual (art. 100, único, VI e VIII, ECA), o adolescente não pode receber tratamento mais gravoso do que o conferido ao adulto (art. 35, I, Lei n. 12.594/2012 - SINASE). Para o adulto solto, a execução da pena depende do trânsito em julgado (art. 5º, LXII, CF; art. 283, CPP), embora recentemente o STF tenha autorizado sua antecipação e, mesmo assim, somente se houver condenação em segunda instância (Pleno, HC 126.292, rel. Teori Zavascki, julg. 17/02/2016, maioria 7x4), alterando o entendimento consolidado no HC 84.078.

Por fim, o ônus de o Estado-juiz não conseguir sentenciar em 45 dias ou julgar o recurso em tempo hábil não pode ser atribuído ao adolescente infrator, mediante antecipação da execução da medida socioeducativa antes do trânsito em julgado. Ademais, na realidade, essa execução provisória acaba tendo caráter definitivo, pois é satisfativa (alcança diretamente a medida aplicada) e irreversível (em caso de reforma da sentença, não há como retornar ao status quo ante, sem prejuízo ao adolescente).

Assim, o recurso contra a aplicação de medida socioeducativa, em regra, tem duplo efeito. E, pelos princípios destacados, não teria cabimento o pedido de concessão de efeito suspensivo, previsto nos §§ 3º e 4º do art. 1.020 do novo CPC. Ressalte-se que o novo CPC eliminou o juízo de admissibilidade dos recursos em primeiro grau (art. 1.010, § 3º), dispensando-se que o juiz declare os efeitos, que são automáticos.

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Augusto Yuzo Jouti
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