Da responsabilidade civil do empregador no acidente de trabalho

Da responsabilidade civil do empregador no acidente de trabalho

Quando o empregador incorrer em culpa ou dolo de qualquer grau, ou então, quando oferecer atividade de risco, cabe indenização à vítima de acidente do trabalho. O instituto jurídico que oferece suporte para o direito à indenização é a responsabilidade civil.

O empregador é civilmente responsável pela segurança daqueles que compõem a sua força de trabalho. Tal responsabilidade decorre do dever de zelo que o empregador possui face aos seus empregados, posto que a manutenção constante do ambiente do trabalho é obrigação inerente ao contrato de trabalho firmado entre os polos financeiro e profissional.

Ocorre que nem sempre foi assim. É preciso destacar que à saúde do empregado, nem sempre foi dada a proteção jurídica que hoje possui.

Até a edição do Dec. 7.036/44, não havia sequer uma norma que tratasse do tema responsabilidade do empregador. Exatamente por esta lacuna normativa apontada, não se cogitava a responsabilidade do patrão face os acidentes ocorridos com seus empregados. Todavia, com a publicação do citado Dec. 7.036/44, passou- se a responsabilizar o empregador pelos infortúnios ocorridos com os obreiros que se ativavam no ambiente de trabalho, desde que aquele tivesse agido com dolo. Essencial se faz a transcrição do artigo 31, do Decreto. 7.036/44 (CAMARA DOS DEPUTADOS, 2013):

O pagamento da indenização estabelecida pela presente lei exonera o empregador de qualquer outra indenização de direito comum, relativa ao mesmo acidente, a menos que este resulte de dolo seu ou de seus prepostos.

De outra monta, o Supremo Tribunal Federal, fez editar em 13/12/1963 a Súmula 229, cujo teor passa-se a colacionar:

Súmula nº 229, STF - Indenização Acidentária - Exclusão do Direito Comum - Dolo ou Culpa Grave do Empregador.

A indenização acidentária não exclui a do direito comum, em caso de dolo ou culpa grave do empregador.

Com efeito, percebe-se que o entendimento sumulado da corte constitucional pátria fez ampliar a responsabilidade patronal, posto que, segundo tal enunciado, o pagamento da indenização pelo empregador por acidente do trabalho não mais decorria tão somente de quando este agisse com dolo, mas também nos casos em que agisse com culpa grave.

É quase desnecessário mencionar que tal entendimento era de complicada aplicação, já se tratava de difícil tarefa diferenciar a culpa grave, média e leve. Não por outro motivo que o Superior Tribunal de Justiça passou a adotar o posicionamento de que a responsabilidade do empregador passaria a decorrer - além do dolo - da mera culpa (e não mais da culpa grave).

Note-se que a responsabilidade decorrente de culpa do empregador decorria de construção jurisprudencial, já que a única norma escrita continuava sendo o Dec. 7.036/44 que, como já frisado, condicionava o pagamento de indenização patronal por infortúnios laborais à atuação dolosa do empregador.

Todavia, dada a essa construção dos tribunais nacionais, o constituinte teve a sensibilidade de fazer constar na nova Carta o direito ao trabalhador de perceber indenização reparatória do empregador por acidentes do trabalho que decorressem de dolo ou culpa. Tem-se, pois, que o constituinte de 1988 apenas positivou o posicionamento demonstrado pelos tribunais superiores. Mandamental, pois, a transcrição do art. 7º, XVVIII, da Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 2013):

Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

[...] XXVIII - seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa;

Percebe-se que, se em um primeiro momento havia uma completa irresponsabilidade do empregador pela higidez física dos seus empregados, atualmente é ponto pacífico que é direito destes serem indenizados por práticas patronais culposas ou dolosas, que lhes causem danos.

Por fim, destaque-se que a jurisprudência atual tem evoluído no sentido de, em alguns casos, sequer perquirir a existência de conduta dolosa ou culposa do empregador, como nos casos em que a atividade econômica seja de risco, o que será discutido adiante.

Responsabilidade civil e suas teorias

O estudo da responsabilidade civil remonta ao Código de Hamurabi (1870 a.C.), o qual possuía como um dos pontos principais o princípio de talião - resumida no brocardo "olho por olho, dente por dente" - sendo que foi apenas no direito romano que o tema ganhou os contornos que possui hoje, sustentando a moderna acepção de responsabilidade civil.

O tema em apreço é de importância tamanha que o legislador infraconstitucional reservou título específico no Código Civil para versar sobre a matéria. Cuida-se do Título IX, que se inicia pelo artigo 927, cuja transcrição se faz oportuna: “Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo” (PELUSO, 2013).

Infere-se da leitura do citado dispositivo que a ideia de responsabilidade civil compreende a noção de resposta. Nada mais razoável, posto que uma vez invadida a ordem jurídica de uma pessoa (física ou jurídica), a restituição ao seu status quo ante se faz imperiosa.

Ensina José dos Santos Carvalho Filho (2013):

Quando o Direito trata da responsabilidade, induz de imediato a circunstância de que alguém, o responsável, deve responder perante a ordem jurídica de algum fato precedente. Esses dois pontos - o fato e a sua imputabilidade a alguém - constituem pressupostos inafastáveis do instituto da responsabilidade. De um lado, a ocorrência do fato é indispensável, seja ele de caráter comissivo ou omissivo, por ser ele o verdadeiro ferrador dessa situação jurídica. Não pode haver responsabilidade sem que haja um elemento impulsionador prévio. De outro, é necessário que o indivíduo a que se impute responsabilidade tenha aptidão jurídica de efetivamente responder perante a ordem jurídica pela ocorrência do fato.

Percebe-se que o prejuízo causado a terceiros é imprescindível para a existência da responsabilidade civil. Noutro dizer, ausente o dano, não há o que se falar em responsabilidade.

Destarte, havendo prejuízo ou dano, invoca-se a responsabilidade civil para ensejar a pretensão de ressarcimento por aquele que sofreu o acidente do trabalho.

Quando o empregador incorrer em culpa ou dolo de qualquer grau, ou então, quando oferecer atividade de risco, cabe indenização à vítima de acidente do trabalho. O instituto jurídico que oferece suporte para o direito à indenização é a responsabilidade civil.

Com efeito, partindo da premissa acima, foram desenvolvidas as duas teorias que predominam no estudo da matéria em questão: objetiva e subjetiva.

1. Responsabilidade subjetiva

O ordenamento jurídico brasileiro sempre adotou, via de regra, a responsabilidade subjetiva. Essa teoria tem como fundamento a culpa, sendo de extrema importância no estudo daquela.

De acordo com os ensinamentos do jurista Roberto de Ruggiero (2005):

Culpa é aqui, em sentido lato, qualquer comportamento injusto, quer seja um fato positivo (comissão), quer negativo (omissão), quer um fato praticado com o deliberado propósito de prejudicar outrem ou de violar a esfera jurídica alheia, quer um fato praticado sem tal propósito e consistente numa negligência. Abraça, pois tanto o dolo como a culpa em sentido técnico e exprime que o fato seja imputável à pessoa de modo que os dois pontos fundamentais para se ter responsabilidade são por um lado a imputabilidade do fato e, por outro, um dano produzido.

O dano, além da culpa, é o ponto de partida para o cabimento da indenização. Portanto, só haverá direito e obrigação de indenizar se ficar comprovado que o empregador teve alguma culpa no infortúnio, mesmo que a natureza dessa seja leve ou levíssima.

Na responsabilidade civil subjetiva por acidentes de trabalhos caberá indenização apenas nos casos que estiverem presente a culpa ou dolo do empregador, o ato ilícito, o dano (caracterizado pelo acidente ou pela doença) e o nexo de causalidade do evento com o trabalho desenvolvido pelo empregado. Assim, se faz necessária a presença dos quatros requisitos (ato ilícito, dolo ou culpa, dano e nexo causal) para caracterizar tal responsabilidade.

De acordo com Sílvio de Salvo Venosa (2013):

O dano consiste no prejuízo sofrido pelo agente. Pode ser individual ou coletivo, moral ou material, ou melhor, econômico ou não econômico. Na noção de dano está sempre presente a noção de prejuízo. Somente haverá possibilidade de indenização, como regra, se o ato ilícito ocasionar dano.

O artigo 927 do Código Civil faz menção ao artigo 186 do mesmo diploma, o qual descreve as formas de cometimento do ato ilícito, sendo elas: a) negligência: abstenção de um ato, é o não fazer, caracterizado pela omissão ou então a falta de cuidados essenciais para se evitar o dano; b) comissiva: é a ação que afronta a norma jurídica; c) omissiva: caracterizada pela abstenção em casos em que há o dever previamente determinado de agir; d) imperícia: não cumprimento de cuidados que devem ser observados em determinados atos no desempenho de profissão, arte ou ofício; e) imprudência: prática de ato com a não observância de cautelas comuns (SILVA, 2013).

De acordo com os ensinamentos de Pereira, os requisitos para se caracterizar um ato ilícito são: 1) uma conduta previsível (culpa) ou intencional (dolo) de um resultado; 2) a violação de um ordenamento jurídico; 3) imputabilidade - possibilidade de se atribui o resultado à consciência do agente, mesmo que por culpa; 4) ofensa à esfera jurídica alheia , podendo ser um dano moral ou material (PEREIRA, 2013).

Pode-se dizer então que não basta o ato ilícito para a obrigação de indenizar existir, visto que somente terá importância para o mundo jurídico aquele que causar danos a outrem.

De acordo com o art. 21-A, "caput" da Lei 8.213/1991, o nexo causal deve ser "decorrente da relação entre a atividade da empresa e a entidade mórbida motivadora da incapacidade elencada na Classificação internacional de Doenças - CID." O referido nexo é o vínculo entre a conduta e o resultado. Não decorre de conceito jurídico, deriva de leis naturais, sendo por isso o elemento mais difícil de ser determinado. Vejamos o posicionamento jurisprudencial:

Para estabelecer-se o nexo causal entre o fato e o dano, nos acidentes do trabalho por equiparação (doença profissional), não se exige prova cabal e inconteste. Há situações em que a prova não é seara de suave colheita. Essa a razão pela qual o Direito se conforma e admite os indícios como suficientes à procedência das ações que tais. Em certas situações, quando a atividade exercida não permite uma reminiscência histórica; em que o liame etiológico é remoto, tênue e quase imperceptível, mas as circunstâncias demonstram que está lá jacente e assegurando o elo crível e estabelecedor de pontes ou ligação entre o fato, ou seja, essas condições de trabalho e dano, impõe-se reconhecê-lo se a outra parte não lograr a contraprova. (2º TACSP - 12ª C. - Ap. 745.993 - 0/0 - Rel. Rui Stocco - J. 03.06.2004 - Voto 4.453/2004)

A responsabilidade civil subjetiva também está juridicamente respaldada na Constituição Federal, note-se (BRASIL, 2013):

Artigo 7º, CF. São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

XXVIII - seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa.

O legislador constitucional, não só normatizou a segurança e proteção nas atividades e nos ambientes de trabalho, como também previu garantias pecuniárias quando o trabalhador sofre agressões em virtude da prestação do serviço subordinado ou então do seu do desempenho, devendo receber valor econômico proporcional ao dano sofrido. É a garantia de seguro contra acidente do trabalho, a cargo do empregador, com a obrigatoriedade de indenização quando este incorrer em culpa ou dolo (MORAES, 2002).

2. Responsabilidade objetiva

É de grande importância destacar que a marca característica da teoria objetiva é a ausência de necessidade de o lesado provar a existência de culpa ou dolo do agente que praticou o ato ilícito.

Assim, para a caracterização deste tipo de responsabilidade é necessária a presença de três pressupostos: ato ilícito, resultado danoso e nexo causal entre ambos. Há de se notar a ausência do elemento anímico na teoria em apreço, sendo esta a principal diferença entre as duas teorias de responsabilidade civil.

O artigo 927 § único do Código Civil preconiza a responsabilidade objetiva para as atividades de risco, vejamos (PELUSO, 2013):

Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.

Verifica-se, portanto, que a reparação do dano é fundada na teoria do risco, a qual se leva em conta a possibilidade de ocasionar danos, sendo a conduta ou atividade do agente que resulta por si só na exposição de um perigo. Deste modo, o que é avaliado é o perigo da atividade desenvolvida causadora do dano por sua natureza ou pela natureza dos meios adotados (VENOSA, 2013).

O risco profissional é aquele que o dever de indenizar decorre de uma atividade ou profissão, o que explica a responsabilidade objetiva no acidente do trabalho. Fica a critério do julgador definir quais atividades se enquadram como sendo de risco.

Vejamos algumas jurisprudências:

RECURSO DE REVISTA. ACIDENTE DE TRABALHO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. CERCEAMENTO DO DIREITO DE DEFESA. JULGAMENTO EXTRA PETITA. NÃO CONFIGURAÇÃO. Não se constata o alegado julgamento extra petita, pois as instâncias percorridas limitaram-se a analisar o pedido formulado pelo reclamante, levando em consideração os fatos e circunstâncias constantes dos autos para formar sua convicção, com adoção de tese que entenderam pertinente. O julgador, ao decidir, não está obrigado a adotar integralmente a tese da petição inicial, ou a tese defendida na contestação, podendo apreciar livremente a prova e chegar às suas próprias conclusões, o que ocorreu no caso dos autos. Esse procedimento encontra amparo no art. 131 do CPC. Intactos os arts. 128, 264 e 460 do CPC. Recurso de revista de que não se conhece. EMPRESA DE TRANSPORTE DE CARGAS. MOTORISTA DE CAMINHÃO. ACIDENTE DE TRABALHO. AMPUTAÇÃO DE MEMBRO SUPERIOR. PERDA IRREVERSÍVEL DA CAPACIDADE LABORATIVA PARA A FUNÇÃO. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA. ATIVIDADE DE RISCO. Uma vez que o caput do art. 7º da Constituição Federal constitui tipo aberto, prevendo, genericamente, a possibilidade de reconhecimento de direitos que visem a melhoria da condição social do trabalhador, a responsabilidade subjetiva do empregador, prevista logo após, no inciso XXVIII, surge como direito mínimo assegurado pela Constituição. Trata-se de regra geral que não exclui ou inviabiliza outras formas de alcançar o direito à melhoria social do trabalhador. Tratando-se de atividade empresarial, ou de dinâmica de trabalho, que acarrete risco acentuado ao trabalhador envolvido, incide a exceção do art. 927, parágrafo único, do Código Civil, que torna objetiva a responsabilidade da empresa por danos decorrentes de acidentes no exercício de função com risco. Recurso de revista a que se nega provimento. (RR - 2024-74.2010.5.18.0082, Relatora Ministra: Kátia Magalhães Arruda, Data de Julgamento: 07/08/2012, 6ª Turma, Data de Publicação: 17/08/2012).

RECURSO DE REVISTA - ESTABILIDADE PROVISÓRIA ACIDENTÁRIA - DOENÇA OCUPACIONAL. Quando a doença ocupacional é detectada após a dispensa do empregado, basta existir relação de causalidade entre a moléstia e as atividades laborais desenvolvidas pelo obreiro para o direito à estabilidade provisória acidentária. Na hipótese, o Tribunal Regional atestou que a reclamante teve a sua capacidade de trabalho reduzida e que é portadora de doença ocupacional que guarda nexo de causalidade com as tarefas desempenhadas na empresa. Nesse contexto, irrelevante que a autora não tenha sido afastada para gozo de benefício previdenciário, uma vez que a Súmula nº 378, II, segunda parte, do TST, dispensa esse requisito quando configurado o nexo de causalidade entre a doença profissional detectada após a extinção do vínculo empregatício e o labor desempenhado perante a reclamada. Recurso de revista conhecido e provido. DOENÇA PROFISSIONAL - DANO MORAL - RESPONSABILIDADE CIVIL - SISTEMAS OBJETIVO E SUBJETIVO. Nos termos do art. 927, caput, do Código Civil, aquele que, culposamente, lesar a esfera juridicamente protegida de outrem, causando-lhe dano, fica obrigado a repará-lo. Trata-se do sistema de responsabilidade civil subjetiva, cujos elementos constitutivos são: a conduta culposa, o nexo causal e o dano. Atento à evolução das relações sociais, o legislador infraconstitucional, ao lado do mencionado sistema de responsabilidade civil, instituiu, no parágrafo único do referido dispositivo de lei, a responsabilidade objetiva daquele cujas atividades normalmente desenvolvidas causarem riscos a direito de outrem. A responsabilização objetiva parte do pressuposto de que, em uma sociedade de massas, as pessoas encontram-se sujeitas a lesões que não podem ser atribuídas à falha humana, e sim ao mau funcionamento dos modernos equipamentos utilizados pelo empresário para o desempenho de sua atividade. Daí a necessidade de se responsabilizar aquele que se aproveita dos lucros auferidos pela atividade empresarialmente desenvolvida, sob pena de se criar uma nova gama de lesões não indenizáveis, por não poderem ser atribuídas ao gênio humano e que, em si, pressupõem a existência de risco. Assim, a partir da análise do sistema de responsabilidade objetiva, impõe-se observar que foi registrado o nexo de causalidade entre a patologia - -tendinite do supra-espinhoso- - e as atividades desenvolvidas como operadora de malharia, o que aponta a existência de riscos ergonômicos nas atividades realizadas, motivo pelo qual, diversamente do que decidido, impunha à reclamada comprovar que foram tomadas todas as cautelas para eliminação ou redução dos riscos ergonômicos. Portanto, entendendo-se aplicável o sistema de responsabilidade objetiva decorrente do fato das atividades desempenhadas pela autora estarem inseridas na atividade principal da reclamada, com a constatação de riscos ergonômicos, ou, ainda, aplicando-se a responsabilidade civil subjetiva, pelos elementos consignados pela Corte regional, necessário se faz reconhecer que houve incorreto enquadramento jurídico da questão. Recurso de revista conhecido e provido. (RR - 181300-93.2003.5.05.0463, Relator Ministro: Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, Data de Julgamento: 15/08/2012, 4ª Turma, Data de Publicação: 17/08/2012).

Tendo em vista que o parágrafo único do artigo 927 do Código Civil não está subordinado ao "caput", alguns autores, como Carlos Alberto Menezes Direito e Sérgio Carvalieri Filho, entendem que o tema deveria ter sido disciplinado em artigo autônomo. Assim, não se deve entender que há um caráter de exceção ou residual na responsabilidade civil objetiva. Neste diapasão (MORAES, 2006):

De acordo com as previsões do Código civil de 2002 pode-se dizer que, comparativamente, a responsabilidade subjetiva é que se torna residual, tantas são as hipóteses de responsabilidade que independem da culpa. Assim, cumpre mencionar, além da cláusula geral do parágrafo único do art. 927, as previsões relativas à responsabilidade do amental (art. 928), do empresário (art. 931), do transportador (art. 734), as diversas hipóteses de responsabilidade indireta (arts. 932 e 933), a responsabilidade pelo fato dos animais (art. 936), a responsabilidade decorrente da ruína (art. 937), isto é, inteiras searas do direito de danos, antes vinculadas à culpa, hoje cumprem o objetivo constitucional de realização da solidariedade social, através da ampla proteção aos lesados, cujos danos sofridos, para sua reparação, independem completamente de negligência, imprudência, imperícia ou mesmo da violação de qualquer dever jurídico por parte do agente. São danos (injustos) causados por atos ilícitos, mas que segundo o legislador, devem ser indenizados.

Existem duas correntes entre os doutrinadores em relação à responsabilidade civil objetiva. A primeira, que é majoritária, entende que é aplicável a responsabilidade objetiva nos acidentes do trabalho àquelas atividades consideradas como de risco. A segunda, minoritária, defende que não se pode aplicar a responsabilidade objetiva, cabendo somente a objetiva nos acidentes do trabalho (OLIVEIRA, 2011).

O argumento dos doutrinadores, que entendem não caber a responsabilidade objetiva do empregador nos casos do acidente do trabalho, é que a Constituição Federal tem norma expressa que estabelece como pressuposto da indenização a ocorrência de dolo ou culpa do empregador (art. 7, XXVIII) (OLIVEIRA, 2011).

A segunda corrente, sustenta o inverso, que é aplicável ao acidente do trabalho a responsabilidade objetiva do empregador, caracterizada no art. 927 § único do C.C. Entende-se que o disposto no inciso XXVIII do art 7º da CF deve ser interpretado de forma harmônica com o que estabelece o "caput" do mesmo artigo. Deste modo, é meramente exemplificativo os direitos elencados, sendo admitida complementação (OLIVEIRA, 2011).

Nesse sentido conclui José Affonso Dallegrave Neto (2010):

Nem se diga, contudo, que o parágrafo único do art. 927 do novo Código Civil é inconstitucional por suposta afronta à parte final do art. 7º, XXVIII, da Constituição Federal. A melhor exegese sistêmica da ordem constitucional garante legitimidade ao parágrafo único do art. 927 do novo Código Civil, uma vez que o caput do art. 7º da Constituição Federal assegura um rolde direitos mínimos sem prejuízo de outros que visam à melhor condição social do trabalhador. 

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