Polícia comunitária reduz drasticamente mortes

Polícia comunitária reduz drasticamente mortes

Num país tão acostumado com desgraças no campo das relações sociais conflitivas (um milhão e 200 mil pessoas foram assassinadas nos últimos 32 anos no Brasil), o título do artigo soa estranho: em qual país isso estaria ocorrendo?

Num país tão acostumado com desgraças no campo das relações sociais conflitivas (um milhão e 200 mil pessoas foram assassinadas nos últimos 32 anos no Brasil – cf. nosso delitômetro no institutoavantebrasil.com.br), o título do artigo soa estranho: em qual país isso estaria ocorrendo? No nosso país é que não está (alguém diria). Mas quem vê o vídeo anexo (absolutamente imperdível, se você ainda não perdeu a esperança de viver no nosso território) se depara com uma inusitada experiência de polícia comunitária no Jardim Ângela, em São Paulo.

Ainda que, na prática, o resultado possa não ser tão romântico e otimista quanto o apresentado, não há como negar o valor quase heróico da iniciativa. Para ela eu tiro o chapeu!

Num país em que as cabeças estão midiaticamente formatadas (só) para tragarem sangue, violência e mortes no trabalho policial, o vídeo surpreende (e muito), dando a sensação, ainda que momentaneamente, de que o Brasil tem jeito! Será?

A polícia comunitária não é uma ideia nova (foi formulada em 1829 por sir Robert Peel, na Inglaterra). Desde os anos 80 vem se desenvolvendo fortemente nos EUA. Até hoje não existe consenso na criminologia sobre o modelo ideal de polícia comunitária (Medina Ariza, Prevencion del delito e seguridad ciudadana), que apresenta uma estratégia e uma filosofia organizativa diferentes, porque envolve a comunidade e seus problemas, não somente criminais, senão, sobretudo, sociais, educacionais, sanitários etc.

O Jardim Ângela tem cerca de 50 mil habitantes e, em 1999, contava com 55 mortes por mês, sendo considerado um dos lugares mais perigosos do mundo. Agora tem 4 mortes, pasmem, por ano! A quem se deve essa revolução? À iniciativa da polícia e da comunidade, destacando-se o trabalho de dois policiais, Adolfo Lóra e Milton Vieira da Silva, que afirmam: “devemos combater a violência com inteligência e educação”.

A propósito, o bairro ganhou uma biblioteca, com vários terminais de computador. A população frequenta o local com prazer e segurança e começa a descobrir o valor da educação, cujo objetivo “é substituir uma mente vazia por uma mente aberta” (Malcolm Forbes). O grafiteiro da comunidade escreveu na parece da biblioteca: “País se constrói com livros”.

Criou-se uma aparentemente sólida base comunitária, fundada na convicção de que a prevenção vale mais que a repressão. A repressão vem tarde demais, depois que o delito já ocorreu. A polícia está transmitindo uma outra imagem, que em nada se corresponde à clássica trilogia da repressão, violência e corrupção.

O ganho para a comunidade também foi extraordinário: menos violência, ninguém está morrendo com balas perdidas, diminuição drástica na discriminação contra os moradores do bairro, cujos créditos antes eram cortados, somente por serem do Jardim Ângela, etc.

Como se constrói uma comunidade sadia? Com “harmonia e amor”. Um encontro musical no bairro, por exemplo, reuniu mais de 300 cantores e bandas. Sempre que criticamos a “solução” repressiva monocórdia do Estado nos perguntam: e qual é a solução? Agora já temos uma resposta na ponta da língua: Jardim Ângela, polícia comunitária!

Sobre o(a) autor(a)
Luiz Flávio Gomes
Doutor em Direito Penal pela Universidade Complutense de Madri – UCM e Mestre em Direito Penal pela Universidade de São Paulo – USP. Diretor-presidente do Instituto Avante Brasil. Jurista e Professor de Direito Penal e de...
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