Controle de convencionalidade

Controle de convencionalidade

Dispõe sobre as peculiaridades do controle de convencionalidade, segundo orientações do mestre Valerio Mazzuoli.

No dia 03 de dezembro de 2003, o Pleno do Supremo Tribunal Federal reconheceu que os tratados de direitos humanos valem mais do que lei ordinária (HC 87.585-TO e RE 466.343-SP). Estavam em pauta a tese do ministro Gilmar Mendes, que defendia o valor supralegal dos tratados de direitos humanos, e a tese do Ministro Celso de Mello, que sustentava o valor constitucional desses tratados. A primeira tese venceu a segunda por cinco votos a quatro.

Assim, de acordo com o artigo 5º, § 3º da Constituição Federal, se um tratado de direitos humanos for aprovado pelas duas casa legislativas com quórum qualificado, e ratificado pelo Presidente da República, terá valor de Emenda Constitucional. Os demais tratados vigentes no Brasil terão valor supralegal, ou seja, valerão mais que lei e menos que a Constituição. 

Por consequência desta alteração da Pirâmide de Kelsen, que anteriormente era composta apenas pelas leis ordinárias na base e pela Lei Maior no topo, toda lei que for contrária aos tratados de direitos humanos não possui validade. Inclusive o STF já decidiu que não há o que se falar em prisão civil do depositário infiel, tendo em vista que todas as leis ordinárias em oposição à Convenção Americana de Direitos Humanos (art. 7º, 7) foram derrogadas.

Note-se, portanto, que toda lei ordinária deverá ser compatível com a Constituição Federal e com os tratados internacionais de direitos humanos. Porém, não se deve confundir o controle de constitucionalidade com o de convencionalidade, já que no primeiro analisa-se a compatibilidade do texto legal com a Constituição, ao passo que no segundo verifica-se a compatibilidade do texto legal com os tratados internacionais de direitos humanos. 

Teoria do controle de convencionalidade por  Valerio Mazzuoli

No Brasil, o controle de convencionalidade foi objeto da tese de doutorado de Valerio Mazzuoli, mestre de Direito Internacional, que acredita que todos os tratados internacionais de direitos humanos ratificados pelo Estado e em vigor no Brasil têm nível de normas constitucionais, tanto por hierarquia material ("status de norma constitucional"), quanto por hierarquia material e formal ("equivalência de emenda constitucional").

Sendo assim, "que os tratados internacionais de direitos humanos em vigor no Brasil são também (assim como a Constituição) paradigma de controle da produção normativa doméstica. É o que se denomina de controle de convencionalidade das leis, o qual pode se dar tanto na via de ação (controle concentrado) quanto pela via de exceção (controle difuso), como veremos logo mais" - Valerio Mazzuoli.

Os demais tratados possuem  status de supralegalidade. Com isso, "o sistema brasileiro de controle da produção normativa doméstica também conta (especialmente depois da EC nº 45/04) com um controle jurisdicional da convencionalidade das leis (para além do clássico controle de constitucionalidade) e ainda com um controle de supralegalidade das normas infraconstitucionais".

Em suma, para Mazzuoli existem quatro modalidades de controle: de legalidade, de supralegalidade, de convenionalidade e de constitucionalidade. Além disso, a produção normativa doméstica passa a se valer de um duplo limite vertical material: o da constituição e dos tratados internacionais de direitos humanos; e os tratados internacionais comuns. 

Na primeira situação, se os tratados não forem aprovados como emenda constitucional, seu status será de norma materialmente constitucional, constituindo paradigma  de controle difuso de convencionalidade, somente. Em contrapartida, se forem aprovados pela maioria qualificada, os tratados serão material e formalmente constitucionais, e consistiram paradigma do controle concentrado de convencionalidade.

Desse modo, os tratados de direito humanos paradigmas do controle concentrado autorizam que os legitimados elencados no artigo 103 da Constituição Federal proponham ação que vise a retirada da validade da norma interna que viole tratado de direitos humanos vigente no país, ainda que em conformidade com a Lei Maior. 

Segundo o autor, o controle de convencionalidade das leis independe de autorização internacional, sendo que qualquer juiz ou tribunal poderá se manifestar sobre o assunto. "Os tratados internacionais incorporados ao direito brasileiro passam a ter eficácia paralisante (para além de derrogatória) das demais espécies normativas domésticas, cabendo ao juiz coordenar essas fontes (internacionais e internas) e escutar o que elas dizem. Mas, também, pode ainda existir o controle de convencionalidade concentrado no Supremo Tribunal Federal, como abaixo se dirá, na hipótese dos tratados (neste caso, apenas os de direitos humanos) internalizados pelo rito do art. 5º, § 3º da Constituição".

Apontamentos gerais 

De fato, o controle difuso de convencionalidade dos tratados internacionais com status supralegal deve ser suscitado em preliminar, em cada caso concreto, devendo ser analisado pelo magistrado antes do mérito do pedido principal. Além disso, o controle de convencionalidade concentrado equivale ao controle de constitucionalidade concentrado, já que os tratados aprovados correspondem a emendas constitucionais.

Outrossim, quando se tratar de controle concentrado de convencionalidade, serão cabíveis todas as ações do controle concentrado, como a ADIn, para invalidar a norma infraconstitucional por inconvencionalidade; a ADECON, para garantir à norma infraconstitucional a compatibilidade vertical com um tratado de direitos humanos formalmente constitucional; e a ADPF, para exigir cumprimento de um "preceito fundamental" previsto em tratados de direitos humanos formalmente constitucionais.  Todas as ações deverão ser propostas perante o Supremo Tribunal Federal.

Ademais, diz-se que o tratado internacional tem "eficácia paralisante", tendo em vista que se houver conflito entre o tratado internacional de direitos humanos e a lei ordinária, valerá o primeiro, não importando se a lei é precedente ou posterior. Ressalta-se que o tratado não revoga, tecnicamente, a lei, apenas paralisa o seu efeito prático, sua validade. 

Importante dizer ainda que, quando um tratado de direitos humanos se opuser à Constituição Federal, via de regra, essa última valerá, já que se trata de norma superior. Porém, tal regra ficará excepcionada quando a lei inferior for mais favorável. Isso porque em matéria de direitos humanos, o critério da hierarquia não é absoluto.

Dessa forma, segundo opinião de Mazzuoli, a norma de direitos humanos que for melhor proteger a pessoa deverá prevalecer sobre outra norma de hierarquia inferior, igual, ou até mesmo superior. Neste caso, não há o que se falar em ilegalidade, já que a própria Constituição determina que quando se tratar de direito do ser humano a norma mais benéfica a ele deverá prevalecer. 

Referências bibliográficas 

GOMES, Luiz Flávio. Controle de convencionalidade: Valerio Mazzuoli "versus" STF. Disponível em: http://www.lfg.com.br/public_html/article.php?story=20090615165108665. Acessado em 19-08-2009.

GOMES, Luiz FlávioMAZZUOLI, Valerio Oliveira. Constituição brasileira e os tratados de direitos humanos: conflitos e os critérios de solução. Disponível em: http://www.parana-online.com.br/canal/direito-e-justica/news/375735/. Acessado em 19-08-2009.

MAZZUOLI, Valerio Oliveira. O controle de convencionalidade das leis. Disponível em: http://pronline.orangotoe.com.br/canal/direito-e-justica/news/348659/. Acessado em 19-08-2009.

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