Reforma Política: O sistema distrital misto e o puro

Reforma Política: O sistema distrital misto e o puro

Discorre sobre a possibilidade real da adoção do sistema distrital misto ou puro e a ineficácia do sistema proporcional (atualmente usado) para as eleições dos Deputados Federais, Deputados Estaduais e Vereadores.

Pretende-se comprovar que o sistema proporcional, atualmente utilizado para as eleições de deputados (federais e estaduais) e vereadores, é um mecanismo evidente de estimulação à corrupção, incentivando o desvio de conduta, além de demonstrar a ineficiência da representatividade popular desses parlamentares. O sistema proporcional, hodiernamente, é um sistema falido! Destarte, fundamental a adoção de outro sistema, que na concepção do autor, para os dias modernos, o sistema mais adequado seria o sistema distrital puro.

Para melhor compreensão do tema, discorreremos a respeito do sistema atual – Proporcional, nas palavras de Luciana Maia ("item 1"), a seguir:

1. SISTEMA PROPORCIONAL[1]

Para os cargos de Deputado Federal, Deputado Estadual e Vereador, as eleições seguem o sistema proporcional (art. 45, Constituição Federal).

Antigamente, esse sistema era chamado de “colorido partidário”, porque pelo sistema proporcional, inicialmente, vale mais a votação que o partido ou a coligação obteve que a votação do candidato individualmente (arts. 105 a 113, Código Eleitoral – Lei 4.737/65).

Pelo sistema proporcional, em primeiro lugar, descobre-se qual o número de votos válidos. Depois, divide-se esse número (votos válidos) pelo número de cadeiras existentes. O produto dessa divisão chama-se “quociente eleitoral” e indica quantos votos são necessários para o preenchimento de um cargo. Após, verifica-se quantos votos o partido obteve, dividindo-se o número de votos obtidos pelo quociente. Dessa divisão resulta o número de cadeiras que o partido terá direito no parlamento (Câmara dos Deputados, Assembléia ou Câmara Legislativa, Câmara de Vereadores).

O partido que não conseguir o quociente eleitoral não terá direito a nenhuma cadeira.

Para melhor compreensão, vamos ilustrar a situação com um exemplo. O Município X:

- Votos válidos: 10.000 - Número de cadeiras de vereadores: 10 - Quociente eleitoral: 1.000 (10.000 : 10) - Partido A: 5.500 votos - Partido B: 3.800 votos - Partido C: 700 votos

O Partido A deverá preencher 5 cadeiras (5.500 : 1.000); o Partido B terá 3 cadeiras (3.800 : 1.000); o Partido C não terá direito a nenhuma cadeira, pois não atingiu o quociente eleitoral. Por enquanto, foram preenchidas apenas 8 cadeiras. As 2 cadeiras restantes serão preenchidas de acordo com a “Técnica da melhor média” explicada abaixo.

Havendo sobras de cadeiras (devido ao número não “cheio” obtido pelo partido), aplica-se a “Técnica da melhor média” para se atribuir as cadeiras restantes entre os partidos. Para isso, deve-se considerar os votos que o partido conseguiu e dividir pelo número de cadeiras já obtidas mais 1. O partido que obtiver a melhor média leva mais uma cadeira. Essa operação deve ser efetuada até que todas as cadeiras sejam preenchidas.

Considerando o exemplo acima, teremos:

- Partido A: 5.500 votos : 5 (cadeiras já obtidas) + 1 = (5.500 : 6) = 916 - Partido B: 3.800 votos : 3 (cadeiras já obtidas) + 1 = (3.800 : 4) = 950

O Partido B obteve a melhor média, assim, ganha mais uma cadeira, passando a ter 4. Ocorre que ainda falta uma cadeira a ser preenchida. Dessa forma, repete-se a operação:

- Partido A: 5.500 votos : 5 (cadeiras já obtidas) + 1 = (5.500 : 6) = 916 - Partido B: 3.800 votos : 4 (cadeiras já obtidas) + 1 = (3.800 : 5) = 760

Dessa vez, foi o Partido A que obteve a melhor média, passando a ganhar mais uma cadeira, totalizando 6 cadeiras.

Achado o número de cadeiras a que o partido tem direito, essas são distribuídas entre os candidatos mais votados do partido até completar o número.

Agora, sim, o número de votos obtidos por cada candidato passa a ter relevância. No exemplo acima, os seis candidatos mais votados do Partido A ocuparão uma cadeira cada e os quatro mais votados pelo Partido B ocuparão as restantes.

Importante ressalvar o número de cadeiras existentes em cada casa parlamentar. 2. Críticas ao sistema proporcional

Enquanto a população não entender inteiramente como funciona o sistema proporcional, jamais poderá ser aplicado de maneira justa e eficaz esse sistema. Tem se verificado, nas últimas eleições, que os eleitores votam no indivíduo (no candidato) e quase nunca no partido. Como vimos, no sistema proporcional o voto é dado ao partido e, após verificado o quociente eleitoral, em seguida, o número de cadeiras disponíveis, aí sim, são verificados os votos dos candidatos daquele partido, ou seja, nós votamos no partido político primeiramente, se será eleito ou não o nosso candidato, será apenas uma mera conseqüência.

Outra crítica que sofre esse sistema, e com muita razão, é em relação às coligações partidárias, pelo simples fato de o eleitor votar em um candidato de um partido e, por conseqüência de seu voto, eleger um candidato de outro partido (partido coligado), que muitas vezes não satisfaz o gosto do eleitor, e para piorar, não consegue eleger o seu candidato. Soa alguma injustiça, não?

Hodiernamente, podemos verificar escândalos e mais escândalos envolvendo deputados federais no Congresso Nacional (inclusive senadores), como mensalão, mensalinho, dança da pizza, sanguessugas, caixa dois, máfia das ambulâncias, entre tantos outros, inclusive aqueles que não foram ainda descobertos.

Mesmo diante da forte fiscalização do Tribunal de Contas, do Judiciário e da Imprensa, a corrupção pública que atinge o Poder Legislativo é intensa, em todas suas esferas (federal, estadual e municipal). Destarte, uma corrente está surgindo dizendo ser fundamental a alteração do sistema eleitoral, apontado como grande causador desses desvios de condutas, pois a população não consegue verificar com eficácia as atividades desses parlamentares, além de favorecer e desfavorecer determinadas regiões.

Este autor também segue nessa corrente, esta de que é fundamental a adoção de outro sistema eleitoral para os deputados (federais e estaduais) e os vereadores. 3. O Sistema Distrital Misto e o Puro

Para a maioria daqueles que estudam Ciências Políticas, Direito e demais setores que estudam os sistemas eleitorais, o sistema distrital misto é o mais cotado em uma eventual reforma política.

O que é o sistema distrital misto? E o sistema distrital puro? Qual a diferença?

O sistema distrital misto é a mistura do sistema proporcional com o sistema distrital puro. O sistema proporcional, podemos verificar no item 1. Aproveitando e respondendo a segunda pergunta, para explicar o que é o sistema distrital misto, imprescindível se torna a explicação do sistema distrital puro, a seguir:

a) O sistema distrital puro – é um modelo eleitoral que visa dividir uma determinada localidade em várias regiões, tantas quantas forem necessárias para o preenchimento de um determinado número de cadeiras disponíveis. Em outras palavras, na esfera federal, o número de cadeiras disponíveis aos Deputados Federais são de 513 cadeiras (art. 45, Constituição Federal e Lei complementar n° 78 de 1993), sendo assim, o Brasil seria dividido em 513 regiões ou distritos, sendo que esses distritos seriam divididos proporcionalmente ao número de eleitores de cada região. Esse é o primeiro passo.

Nesses distritos os partidos políticos lançariam apenas um candidato para tentar a vaga, e a eleição seria feita aos moldes do sistema majoritário naquela determinada região (como é feita, atualmente, com os Senadores). Assim, o candidato mais votado seria eleito e responsável por aquela região que o elegeu, tornando a fiscalização da Justiça local, do Tribunal de Contas local, da Imprensa local e, fundamentalmente, da população que o elegeu, muito mais eficaz. O trabalho do deputado eleito nesses moldes seria, também, mais específico àquela determinada região, e como já mencionado, esses deputados estarão sendo vigiados bem de perto.

Quando a população percebe realmente o desvio de conduta de um determinado deputado, ela não o perdoa e não o reelege. Esse trabalho será muito mais fácil nos moldes do sistema distrital, pois a imprensa poderá vigiar e noticiar nos jornais locais, por conseguinte, a população verificará se o deputado eleito está ou não trabalhando corretamente, conforme as expectativas. Dessa forma, o cidadão irá sentir o poder de sua cidadania, que é muito mais do que um simples voto, é um voto de confiança, esperança e capacidade de avaliar, no futuro, se sua escolha foi acertada ou não.

Podemos verificar que o sistema distrital puro, é um sistema que divide uma determinada localidade em várias regiões, e destas, serão eleitos os candidatos com o maior número de votos (sistema majoritário naquela determinada região).

Sendo assim, podemos analisar, agora, o que é o sistema distrital misto:

b) Sistema distrital misto – Em linhas gerais, como já mencionado, o sistema distrital misto é mistura do sistema proporcional e o sistema distrital puro (e o puro utiliza o sistema majoritário).

3.1 Como é feita essa mistura?

Simples. Verifica-se o número de cadeiras disponíveis em uma determinada região, por exemplo, a câmara dos vereadores da cidade “X”. Vamos supor que essa cidade “X” possui 20 cadeiras disponíveis, portanto divide-se 10 cadeiras para o sistema proporcional e 10 cadeiras para o sistema distrital puro. Assim, o eleitor teria direito a dois votos: um voto para o partido político (proporcional) e outro para o candidato (distrital).

Essas 10 cadeiras disponíveis ao sistema distrital seriam distribuídas da mesma forma que no sistema distrital puro, ou seja, será divida nossa hipotética cidade “X” em 10 regiões, e, em cada uma delas, apenas um candidato por partido, sendo que o mais votado de cada região será o eleito (sistema majoritário).

As demais 10 cadeiras, serão preenchidas pelos partidos que obtiverem maior número de votos, observando-se o quociente eleitoral, como explanado nos itens acima.

A diferença entre o sistema distrital puro e o sistema distrital misto é o simples fato de que no sistema misto, é utilizado o sistema proporcional, e no sistema distrital puro não.

3.2 A briga: Sistema Distrital Puro X Sistema Distrital Misto

O sistema distrital misto é defendido pelo aspecto de dividir os parlamentares em “gerais”, os quais seriam eleitos pelo sistema proporcional, e os “específicos”, que seriam eleitos pelo sistema distrital.

Seria um meio de integração da vontade popular de eleger seu partido e seu candidato específico.

Carlos Fernando Correa de Castro[2], diz que “a adoção do sistema voto distrital misto para eleições para o Legislativo é necessidade imperiosa. Entre muitas razões, pelo efeito moralizador do processo eleitoral e responsabilização dos que venham a ser eleitos”, afirmando, também, que no sistema distrital misto “o eleitor dispõe de dois votos; um para o candidato distrital, outro para um candidato “geral” (ou de toda coletividade)”, apontando essa mistura como ingredientes essenciais para o processo eleitoral do Poder Legislativo (exceto Senadores da República).

Já os defensores do sistema distrital puro, dizem que o sistema distrital misto resolverá somente parte do problema, ou seja, o sistema proporcional utilizado fará com que exista ainda os desvios de condutas, corrupção etc., ou melhor, dizem que, ao invés de solucionar todos os problemas, irão ser mantidos ainda a metade dos problemas que enfrentamos atualmente.

Roberto Pompeu de Toledo[3], diz que “o atual sistema de eleição de deputado caducou, mas o distrital misto pode ser pior”, afirmando ainda que “o voto distrital misto é um frankstein dobrado em esfinge. Além de monstrengo feito de peças incompatíveis, impõe ao eleitor o enigma de entendê-lo ou ser devorado. Com a agravante de que – pobre eleitor – é certo que será devorado”.

Os defensores do sistema puro são notadamente totalmente contra ao sistema proporcional, já os defensores do sistema misto, são um pouco mais conservadores, porém não aceitam a forma que hoje se encontra o sistema eleitoral – somente no sistema proporcional. 4. Conclusão

Tanto os defensores do sistema misto quanto os defensores do sistema puro tem razão em um aspecto: Não é possível as coisas estarem do jeito que estão. Tornou-se insustentável o modelo atual, sendo que se mantido, todos problemas também serão.

Entendo que o sistema distrital puro, atualmente, é o ideal. Pois, não há ainda maturação política da população em escolher um partido político. Muitos nem imaginam quais são as diretrizes e princípios dos partidos políticos, que são fundamentais para a sua escolha.

Para uma melhor adequação do sistema distrital puro (ou misto), poderia ser editada uma nova Lei complementar (além das alterações constitucionais), revogando a Lei Complementar n° 78 de 1993, para ampliar ou reduzir o número de deputados, de forma que seja justa a distribuição de distritos no Brasil.

Devemos lembrar que um dos objetivos da República Federativa do Brasil é construir uma sociedade livre, justa e solidária (art. 3°, I, Constituição Federal). Para existir justiça no sistema eleitoral, o cidadão tem que entender o sistema, mas ao invés disso, dizem ser “confuso” o sistema proporcional. Cada eleição que se passa, constatamos que esse sistema mencionado está totalmente ultrapassado, ou, ainda não chegou sua época para ser implementado, devido a imaturidade política da população brasileira em geral. Diante do exposto, como manter um sistema que não vingou? É mantido por falta de vontade política ou é mantido porque é conveniente para alguns.

Para a adoção do sistema proporcional é necessário maturação política da população, da mesma forma para a adoção do sistema distrital misto. O que podemos observar é que não existe essa consciência, os eleitores não sabem que estão votando no partido, elas acham que estão votando no candidato.

Tudo é uma questão de evolução, passamos pela experiência do sistema proporcional – Não deu certo! Podemos então, adotar um sistema totalmente diferente – O sistema distrital puro. Quando a população atingir uma consciência política considerável, poderemos adotar o sistema distrital misto, pois, como os defensores do sistema distrital misto dizem: deputados “gerais” e “específicos”, integrados, pode nessa mistura ter ingredientes interessantes em busca da ordem e do progresso, talvez assim, finalmente, consigamos cumprir o que nossa maravilhosa bandeira nacional preceitua.

NOTAS [1] MAIA, Luciana. Eleições: quantos votos são necessários para eleger um candidato?. DireitoNet, disponível em <http://www.direitonet.com.br/reportagens/x/17/66/176/>, acessado em 16 de Outubro de 2006.

[2] DE CASTRO, Carlos Fernando Correa. Reforma Política. Voto Distrital Misto: visão jurídica. Revista Eletrônica Par@aná Eleitoral, disponível em <http://www.paranaeleitoral.gov.br/artigo_impresso.php?cod_texto=208>, acessado em 16 de Outubro de 2006.

[3] DE TOLEDO, Roberto Pompeu. Frankenstein e esfinge ao mesmo tempo. Revista Veja. Edição 1997 – ano 39 – n° 40, de 11 de Outubro de 2006. Seção “Ensaio”, pág. 126.

Sobre o(a) autor(a)
Lucas Tadeu Lourencette
Jurista, possui bacharelado em Ciências Jurídicas pela Universidade de Sorocaba (2007). Parceiro do DireitoNet desde 2006.
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