Morte: uma pena irreversível

Morte: uma pena irreversível

Aborda pesquisa atinente à aplicação da pena de morte no Brasil e no Exterior, a incompatibilidade jurídica de sua adoção no Brasil e sua insignificância como meio de combate à criminalidade.

A pena de morte, também chamada pena capital, consiste na retirada da vida de forma legal, a uma pessoa condenada pelo Poder Judiciário por crime grave.

Pesquisa publicada pelo jornal Folha de São Paulo indica que os brasileiros querem a pena de morte no Brasil como solução para acabar com a violência no país.

O assassinato do menino João Hélio, no Rio de Janeiro, aumentou a mobilização popular para a instituição da pena de morte. A repercussão do caso na mídia, abriu discussão sobre o fato. Opiniões favoráveis a este tipo de punição têm causado polêmica em todos os setores da sociedade.

Segundo o DataFolha, 55% dos brasileiros são favoráveis à punição em epígrafe, enquanto que apenas 40% são contra. Interessante frisar que a maior parte dos defensores da pena capital tem renda familiar superior a dez salários mínimos. O menor número está entre os que ganham até dois salários mínimos mensais.

No entanto, a Anistia Internacional (movimento mundial independente que desempenha um papel muito específico na prevenção das violações dos direitos humanos por parte dos governos e fundada em 1961 pelo advogado inglês Peter Benenson) pede o fim da pena de morte no mundo. Segundo a secretária-geral deste movimento, Irene Khan, a Anistia pede uma coalizão global de governos, acompanhada de uma estratégia diplomática sólida e eficaz. Países onde não existe este tipo de sentença devem se unir dando um sinal claro de liderança política para isolar as nações que ainda usam este recurso.

Nos últimos anos, tem-se notado uma redução nas execuções. Em 2006 foram executadas 1.591 pessoas, em 2005 foram 2.145 e em 2004, 3.400.

Só seis países no mundo são responsáveis por mais de 90% das penas capitais. China e Iraque que lideram a lista, Irã, Paquistão, Sudão e os Estados Unidos. As demais nações não utilizam deste método desumano. A União Européia, a Suíça, entidades de direitos humanos e grande parte da comunidade internacional, também engajadas na campanha, pedem uma suspensão global da pena de morte.

Como corolário, os legisladores do estado americano de Nova Jersey aprovaram um projeto de lei que prevê o fim desta pena, substituindo-a pela prisão perpétua sem possibilidade de livramento condicional. Nova Jersey é o primeiro estado americano a abolir a pena capital, em vigor desde 1976 quando foram retomadas por decisão da suprema corte dos Estados Unidos. Em quarenta anos houve cerca de 1.099 condenações que determinaram a aplicação pena de morte. Atualmente, há no corredor da morte nos Estados Unidos, cerca de 3.350 condenados à espera da execução, sendo 42% de negros e 11% de hispânicos, que poderão ser salvos se outros estados americanos seguirem o mesmo exemplo de Nova Jersey, abolindo a pena.

No Brasil, a Constituição da República, em seu artigo 5º, veda expressamente a pena de morte, salvo em caso de guerra, devidamente declarada pelo Presidente da República, como forma de punição a traidores da pátria.

A segurança pública é um direito de todo cidadão brasileiro, garantido pelo Estado, assim como são também tutelados os direitos à vida e à liberdade, entre outros. Punir é dever do estado como também o é, dar proteção à vida. Neste diapasão seria incoerente, o Estado, que tem a obrigação de defender a vida, direito fundamental do ser humano, tirá-la.

Condenar uma pessoa à morte serviria apenas para satisfazer o lado ruim do ser humano, o lado vingativo, que se aflora toda vez que depara com crimes absurdos, desumanos e covardes. Revoltado, passa então a desejar que o autor do crime seja punido de forma que o faça sofrer. Assim há uma satisfação do ser, que alimenta o seu lado cruel. É tão ruim aquele que deseja a morte do outro como punição para seu crime, quanto o próprio criminoso. Este é ruim por ter cometido um crime bárbaro, aquele é ruim por se sentir satisfeito com o sofrimento imposto ao criminoso.

A pena de morte de nada serviria para a diminuição da violência. Em países que adotam esta pena não houve diminuição da criminalidade pelo medo de ser morto.

O medo de algum tipo de pena não inibe o indivíduo de cometer crimes. Prova disso é o sistema carcerário brasileiro, um dos piores do mundo, com celas superlotadas, prédios velhos e mofados onde impera a violência. Mesmo sabendo que ficar preso em um ambiente assim não é nada agradável, os presídios estão superlotados. As péssimas condições prisionais não impedem que o criminoso cometa seus crimes. Muitos daqueles que já cumpriram penas privativas de liberdade e sentiram na pele o inferno que é uma prisão, continuam cometendo crimes, haja vista o grande número de reincidência. Portanto, a solução para a redução da violência e da criminalidade não está na aplicação de penas desumanas.

Dificilmente a pena de morte será instituída no Brasil por se tratar de vedação de cláusula pétrea. Caso acontecesse, as maiores vítimas seriam os negros e os pobres de todas as raças que são justamente os perfis predominantes nos cárceres brasileiros. Por se tratar de uma pena irreversível, se posteriormente for detectada a inocência de um executado nada mais poderá ser feito.

Destarte, não me parece razoável que a instituição da pena capital seria a solução para a redução da violência. Talvez, grandes investimentos para a erradicação da miséria e conseqüentemente de inclusão social possam surtir maiores efeitos a longo prazo do que tirar a vida de um miserável criminoso, pois permanecendo a miséria, novos miseráveis criminosos nasceriam para ficar no lugar daqueles que por ventura tenham sido condenados à pena de morte. Portanto, não haveria redução da violência, apenas a substituição de um criminoso por outro.

Sobre o(a) autor(a)
Amaury Silva
Juiz de Direito Professor de Direito Penal e Direito Processual Penal Autor dos livros Interrogatório e Lei de Drogas Anotada
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