Penas alternativas

Penas alternativas

Disciplina o que é a pena alternativa, sua aplicação e execução, trazendo a lume as considerações dos doutrinadores quanto à sua eficácia no sistema punitivo.

Introdução

As penas alternativas são denominadas atualmente de Direito Penal Mínimo, pois buscam retribuir ao infrator uma pena proporcional ao delito cometido, com penas que sejam alternativas à prisão. Tratam-se, pois, de penas alternativas à prisão, que são concedidas para aqueles crimes considerados de menor potencial ofensivo.

Antes do advento da Lei nº 10.259/2001, eram considerados crimes de menor potencial ofensivo, de acordo com o artigo 61 da Lei 9099/95, aqueles crimes cuja pena máxima não fosse superior a um ano: Art. 61. Consideram-se infrações penais de menor potencial ofensivo, para os efeitos desta Lei, as contravenções penais e os crimes a que a lei comine pena máxima não superior a um ano, excetuados os casos em que a lei preveja procedimento especial. Todavia, a nova lei passou a dispor que crime de menor potencial ofensivo entende-se como sendo aquele crime ao qual a lei comine pena máxima não superior a dois anos: Art. 2º Compete ao Juizado Especial Federal Criminal processar e julgar os feitos de competência da Justiça Federal relativos às infrações de menor potencial ofensivo. (...) Parágrafo único. Consideram-se infrações de menor potencial ofensivo, para os efeitos desta Lei os crimes a que a lei não comine pena máxima superior a dois anos ou multa. As penas substitutivas à prisão foram elencadas primeiramente pela Lei nº 7.209/84, no artigo 43, que previa como penas alternativas à restrição da liberdade: a prestação de serviços à comunidade; interdição temporária de direitos e limitação de fim de semana. Com o advento da Lei 9.714/98, o rol das penas restritivas de liberdade foi ampliado, conforme se verifica no artigo 43 do Código Penal, que a referida Lei reformou: Art. 43. As penas restritivas de direitos são: I – prestação pecuniária; II – perda de bens e valores; III – (vetado), IV – prestação de serviço à comunidade ou a entidades públicas; V – interdição temporária de direitos, VI – limitação de fim de semana.

Desta forma somaram-se ao rol das penas restritivas de direitos as penas de perdas de bens e valores e prestação pecuniária às penas já existentes da Lei 7.209/84.


Espécies de Penas Alternativas

De acordo com o rol das penas restritivas de direitos cinco são as modalidades alternativas à prisão, que conforme a lei são aplicadas de forma autônoma, substituindo as penas restritivas de liberdade, quando a lei assim o determinar.

A primeira espécie de pena alternativa é a Prestação Pecuniária, que consiste no pagamento em dinheiro à vítima, a seus dependentes ou entidade pública ou privada com finalidade social. A quantia a ser paga será fixada pelo juiz e, de acordo com a lei não poderá ser inferior a um salário mínimo nem superior a trezentos e sessenta salários mínimos.

A prestação pecuniária não se confunde com a pena de multa elencada no Código Penal. Embora as duas penas sejam consistentes no pagamento de certa quantia em dinheiro, estas não se igualam, pois, a lei dispõe que o valor da prestação pecuniária pode ter como destinatário a vítima do delito; enquanto que a multa o valor fixado pelo juiz é destinado ao Fundo Penitenciário, além de não admitir a substituição por prestação de outra natureza, como permite a prestação pecuniária.

Não está previsto em lei com que tempo deverá ser efetuado o pagamento da prestação pecuniária, tão pouco quem tem a competência para a execução da pena. Para suprimir a lacuna, estipula-se que a prestação pecuniária deve ser executada dez dias depois de transitada em julgado a sentença e, da mesma forma que a multa, caso o valor da pena não seja pago, a prestação pecuniária será considerada dívida de valor, devendo-se aplicar as normas relativas à dívida ativa da Fazenda Pública.

Com relação a competência para a execução da pena, o que se tem entendido é que o Juiz da Execução da pena é quem tem legitimidade para executa-la. E, nos casos de crimes de menor potencial ofensivo a competência é designada para o Juizado Especial Criminal, de acordo com o disposto no art. 60 da Lei nº 9.099/95: “Art. 60. O Juizado Especial Criminal, provido por Juízes togados ou togados e leigos, tem competência para a conciliação, o julgamento e a execução das infrações penais de menor potencial ofensivo”.

Caso a prestação pecuniária não seja adimplida pelo devedor, em conformidade com Código Penal, a pena restritiva de direitos poderá ser convertida em pena restritiva de liberdade. A substituição se dará, pois, ficou evidente que a pena alternativa não almejou o fim para o qual foi destinada, que era de prevenir a sanção restritiva de liberdade, logo, será válida sua conversão para a sanção correspondente ao tipo penal violado.

Art. 44. (...) § 4º A pena restritiva de direitos converte-se em privativa de liberdade quando ocorrer o descumprimento injustificado da restrição imposta. No cálculo da pena privativa de liberdade a executar será deduzido o tempo cumprido da pena restritiva de direitos, respeitado o saldo mínimo de trinta dias de detenção ou reclusão.

A doutrina, com relação a este artigo, vem se manifestando no sentido de que a conversão não seria adequada, visto que a sentença que determinou o cumprimento da prestação pecuniária é um título executivo judicial, devendo-se realizar a execução de tal título e não a conversão em pena privativa de liberdade.

Ocorre, porém, que assim não é de ser considerado, eis que uma vez substituída a Pena Privativa de Liberdade por Prestação Pecuniária, o comando emergente da decisão judicial impõe ao condenado obrigação consistente numa dívida de valor certo e determinado, representando a sentença, um título executivo judicial, estando a ensejar ao beneficiário, seja a vítima, seus dependentes, entidade pública ou privada com fins sociais, o exercício da pretensão executória resultante, daí porque entendermos que a execução forçada é o meio hábil a exigir a Prestação Pecuniária inadimplida injustificadamente.1

A pena de prestação pecuniária será extinta com o seu total adimplemento por parte do infrator, momento em que o juiz, constata a resolução da prestação, declarará extinta a pena, ante o seu efetivo cumprimento. Caso a pena não seja cumprida e não seja convertida em pena privativa de liberdade, deve a execução da pena manter-se em aberto, aguardando-se as causas de extinção de punibilidade, deste ato resultará que não fluirá o lapso temporal de cinco anos para que o condenado possa novamente beneficiar-se da pena substitutiva à prisão.

Outra espécie de pena restritiva de direito é a Prestação de Serviços à Comunidade ou Entidades Públicas, que possibilita ao condenado exercer atividades gratuitas de acordo com suas aptidões, junto a entidades assistenciais, hospitais, escolas, orfanatos e demais estabelecimentos públicos.

Essas penas são aplicadas para aqueles crimes cuja condenação sejam superiores a seis meses de privação de liberdade. Caso a pena substituída ser superior a um ano, o condenado poderá cumprir a pena em menor tempo, desde que não seja por tempo inferior à metade da pena privativa de liberdade.

Uma observação que a doutrina faz sobre a execução da prestação de serviço à comunidade é em relação à lei dos Crimes Ambientais - Lei nº 9.605/98, que não admitiu a possibilidade da prestação ser cumprida em menor tempo, como a admitiu a Lei nº 9.714/98. Deste fato, o que a doutrina tem entendido é que a Lei nº 9.714/98 deve ser aplicada subsidiariamente à Lei nº 9.605/98, a fim de possibilitar a igualdade de tratamento entre os condenados que receberam a mesma pena, porém em crimes diversos.

Sendo, pois, a Lei nº 9.714/98, embora determinante de regras gerais, posterior à Lei nº 9.605/98, entendemos que as disposições lançadas por aquela norma no Código Penal, no que concerne à execução da pena de prestação de serviços à comunidade ou entidades públicas, devem ser aplicadas subsidiariamente (Lei nº 9.605/98, art. 79) nos crimes ambientais, de modo a permitir o cumprimento da restritiva de direitos em menor tempo que a privativa de liberdade substituída, admitindo-se a remição de uma hora de serviço por um dia de pena privativa de liberdade na hipótese de conversão ou mesmo para fins de extinção da execução da pena.2

Segundo o artigo 43, § 6º do Código Penal, com redação dada pela Lei nº 9.714/98, a execução da pena de prestação de serviço à comunidade deverá ser cumprida pelo período de uma hora de tarefa por dia de condenação, fixadas de modo a não prejudicar a jornada laborativa do condenado.

Contudo a Lei nº 9.605/98 não determina que as atividades do condenado sejam realizadas segundo suas aptidões, apenas informa que as tarefas devem ser realizadas junto a parques, jardins públicos e áreas de conservação. Se o condenado for pessoa jurídica e o crime for de natureza ambiental, a prestação se dará em custeios a programas ambientais, contribuições a entidades ambientais, recuperação de áreas degradadas e manutenção de áreas públicas.

Nota-se que a prestação de serviço elencada na Lei nº 9.605/98, tem caráter mais objetivo, pois busca-se reestabelecer o meio ambiente ao seu estado anterior, em não o sendo, a prestação se reverte em prestação na manutenção de espaços públicos, obras de preservação, na execução de obras de recuperação, a fim de que, de alguma forma por meio da prestação o meio ambiente possa ser preservado.

Assim como na prestação pecuniária, em não sendo cumprida a prestação de serviços à comunidade, a pena restritiva de direitos converte-se em pena privativa de liberdade. Mas, a conversão só será efetivada quando for analisada o motivo que ensejou o não cumprimento da medida.

A comprovação do cumprimento ou não da prestação se dará por meio dos relatórios que a entidade beneficiária encaminhará mensalmente ao juiz da execução, conforme o disposto no artigo 150 da Lei nº 7.210/84.

Art. 150. A entidade beneficiada com a prestação de serviços encaminhará mensalmente, ao juiz da execução relatório circunstanciado das atividades do condenado, bem como, a qualquer tempo, comunicação sobre ausência ou falta disciplinar.

Se a condenação for decretada pelo juiz dos Juizados Especiais Criminais, será deste órgão a comptência para converter a prestação de serviços em restritiva de liberdade.

O tempo em que o condenado houver cumprido a prestação de serviços será compensado na razão de um dia de serviço prestado, por um dia de pena, para os crimes apenados com detenção ou reclusão. Para os crimes apenados em regime semi-aberto ou aberto, o condenado poderá remir, pelo trabalho, a razão de um dia de pena por três de trabalho.

A Interdição Temporária de Direitos também consiste em pena alternativa à prisão, que consubstancia-se na proibição dada ao condenado, de em tempo igual ao da pena restritiva de liberdade decretada em sentença, ser privado de exercer atividade pública, assim como mandado eletivo; exercício de atividade ou profissão que necessite de habilidade específica; suspensão do direito de dirigir e proibição de freqüentar determinados lugares, conforme previsto no artigo 47 do Código Penal.

A proibição do execício de cargo, função, atividade pública ou mandado eletivo inibe que o condenado continue no exercício de sua atividade. O tempo da interdição não poderá ser inferior ao da pena privativa de liberdade substituída. E, havendo o cumprimento da interdição o condenado volta a exercer o cargo, função, atividade ou mandado. Se, o condenado estava em vias de assumir a atividade, este será investido na posse do cargo, todavia, só o exercerá após cumprida a interdição de direitos.

A proibição do exercício de profissão, atividade ou ofício são aplicados para aqueles crimes relacionados com a inobservância às práticas profissionais e, por isso, nega ao condenado realizar determinada conduta laborativa, pelo tempo que lhe fora estipulado na pena privativa de liberdade. Entretanto, deverão ser objeto desta proibição aquelas atividades que careçam de habilidade especial, licença ou autorização do Poder Público, como por exemplo, cargos que exijam cursos técnicos ou profissionalizantes.

A doutrina considera que a proibição do exercício de profissão, atividade ou ofício, deve ser bem analisada antes de sua aplicação, pois se de um lado consiste numa pena alternativa à prisão, que permite ao condenado sua permanência na sociedade; em contrapartida lhe desampara de provimentos pecuniários, não possibilitando meios para sua subsistência.

Sendo finalidade das penas alternativas a reintegração social do condenado, entendemos que deve a pena de proibição de exercício de profissão, ofício ou atividade ser aplicada com reservas, em que pese, lançada tenha sido no sistema, com o objetivo também de prevenir a ocorrência dos delitos derivados da relação de trabalho. Isso porque a interdição temporária de direitos, inibindo o condenado de exercício de atividade v.g. remunerada, deixa-o ao desamparo, empalidecendo sua condição de subsistência, a propiciar-lhe anseios de retornar à prática delitiva, perdendo, via de conseqüência, a pena, seu caráter retributivo e preventivo.3

A suspensão de autorização ou de habilitação para dirigir, outra modalidade da interdição temporária de direitos suspende a autorização de dirigir do condutor habilitado envolvido em crimes culposos de trânsito, pelo período em que cumpriria a pena restritiva de liberdade. Esta modalidade é aplicada para aqueles condutores que no momento do acidente tenham autorização para dirigir. Se, o condenado não houver habilitação, poderá o juiz determinar a proibição de se obter permissão ou autorização para dirigir.

Da mesma forma que na proibição do exercício, atividade ou ofício, a doutrina também assevera que a aplicação da suspensão da autorização ou habilitação para dirigir deve ser executada com cautela, pois em se tratando o suspenso motorista profissional, a aplicação da medida não acarretará apenas a suspensão do direito de dirigir, mas somará a ela a perda do emprego e quando não a suspensão do exercício de atividade laborativa.

(...) a suspensão de autorização ou habilitação enseja presunção de prevenção dos delitos de circulação, por outro lado, como efeito natural da sentença, resta a perda do emprego e/ou mesmo a suspensão do exercício de atividade laborativa (...) assim entendemos que, nos crimes culposos de trânsito, sendo empregado o agente, fazendo do dirigir sua profissão, seu meio de subsistência, a substituição da pena privativa de liberdade por suspensão de habilitação e/ou autorização de dirigir veículo, somente há de operar-se na hipótese de culpa grave.4

Por fim a probição de freqüentar determinados lugares, última modalidade de interdição temporária de direitos, restringe ao condenado sua permanência em bares, boates, casas de jogos, casas de prostituição. A finalidade é que o condenado limitado de freqüentar determinados locais considerados imorais, possa volver sua personalidade para a moralidade e, melhor se adequar ao convívio social.

Tal como as demais penas em não havendo o cumprimento da pena restritiva de direitos converte-se em pena privativa de liberdade, devendo-se ser analisadas as circunstâncias que levaram o condenado ao injustificado descumprimento da medida, que se realizará pelos relatórios encaminhados ao juiz da execução e/ou juiz da sentença, em sendo a condenação decretada pelo Juizado Especial Criminal.

Finalmente, a derradeira espécie de pena restritiva de direitos é a da Limitação de Fim de Semana, a qual determina que o condenado pelo tempo da pena privativa de liberdade substituída, permaneça aos sábados e domingos, pelo período de cinco horas em Casa de Albergado ou estabelecimento similar, onde serão ministrados cursos e palestras de cunho educativo.

Como já explanado no ítem 4.2, o Governo Federal elaborou projeto de reforma à Parte Geral do Código Penal, que pretende fazer alterações nas penas e medidas de segurança e, dentre as modificações inclui a exclusão do regime aberto (na qual se enquadra a limitação de fim de semana) e por conseqüência as Casas de Albergados, por considerarem que estas penas constituem-se ineficazes.

Em que pese, segundo o Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN), em estatísticas realizadas em 02/06/2006, o Brasil conta atualmente com quarenta Casas de Albergado. Portanto, não se pode avaliar a ineficácia de um regime se não houve desde sua implantação condições de viabilizar sua funcionalidade.

Em igualdade com as demais penas restritivas de direitos, não havendo cumprimento da limitação de fim de semana converte-se em pena restritiva de liberdade, após verificada as situações que levaram ao não cumprimento da medida.


Aplicação das Penas Alternativas

As penas de natureza substitutiva são aplicadas em conformidade com os pressupostos estabelecidos no artigo 44 do Código Penal, o qual prevê critérios específicos e condições de aplicabilidade.

Art. 44. As penas restritivas de direito são autônomas e substituem as privativas de liberdade, quando: I – aplicada pena privativa de liberdade não superior a quatro anos e o crime não for cometido com violência ou grave ameaça à pessoa ou, qualquer que seja a pena aplicada, se o crime for culposo; II – o réu não for reincidente em crime doloso; III – a culpabilidade, os antecedentes; a conduta social do condenado, bem como os motivos e as circunstâncias que essa substituição seja suficiente.

Portanto, o primeiro pressuposto é em razão da quantidade da pena aplicada, que nos casos de crimes dolosos a substituição será cabível quando a pena imposta na sentença não for superior a quatro anos; ou nos crimes culposos qualquer que seja a quantidade da pena aplicada a substituição é permita. Assim, não haverá distinção entre crime doloso e culposo quando se tratar de pena até quatro anos.

Ainda no primeiro inciso do artigo 44 do Código Penal, é preciso analisar em que modalidade o crime fora cometido. Pois em virtude da ampliação do cabimento das penas alternativas, para pena não superior a quatro anos, foi imprescindível que aumentasse os critérios de permissibilidade da substituição.

Para tanto, a pena poderá ser substituída se estiver dentro do limite de quatro anos e não for cometido com violência ou grave ameaça à pessoa. O legislador assim dispôs para preservar os crimes de menor valor, daqueles que merecem maior proteção do direito, como no caso dos crimes violentos, pois, estes acarretam maiores conseqüências à vítima e, portanto, não fazem jus à substituição.

Outro pressuposto da substituição é a não reincidência do réu, pois, em tese, as penas restritivas de direitos são inaplicáveis em casos de reincidência que decorram de crimes dolosos. Todavia a reincidência em crime doloso não é em todo impedimento para a substituição, visto que a redação da Lei 9.714/98, dispõe que se a medida for socialmente recomendável, poderá o juiz conceder a substituição, desde que a reincidência não tenha operado em virtude do mesmo crime, ou seja, quando não se tratar de reincidência específica, conforme determina o § 3º do artigo 44 do Código Penal.

§3º. Se o condenado for reincidente, o juiz poderá aplicar a substituição, desde que, em face de condenação anterior, a medida, seja socialmente recomendável e a reincidência não se tenha operado em virtude da prática do mesmo crime.

A reincidência se verificará quando o agente comete novo crime, após transitar em julgado a sentença, sem que, contudo, não tenha entre a data da extinção da punibilidade e a decorrência da nova infração, transcorrido o lapso temporal de cinco anos.

Por fim, serão analisados a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade, bem como os motivos e circunstâncias do fato. Esses critérios são considerados para que não haja arbitrariedade na substituição das restritivas de direitos.

A culpabilidade do agente se conecta com o elemento subjetivo do crime, conferindo se o crime foi praticado com culpa ou dolo. Se com culpa, demonstra que o agente não tinha a intenção de produzir o resultado. Enquanto, que na conduta dolosa, na definição legal, é quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo.

Neste sentido averigua-se se o dolo foi direto ou eventual. Em sendo direto, significa que o agente no momento da prática do crime seu anseio era de obter o resultado, indepedentemente de sua consumação ou tentativa, como por exemplo, o agente que desfere tiros de arma de fogo com intenção de matar seu rival. No dolo eventual, embora a intenção do agente não fosse a de produzir o resultado, este assumiu o risco de eventualmente produzi-lo, como por exemplo, o agente que ‘rinca de roleta russa’ com seu amigo e acaba por desferir-lhe um tiro.

Os antecedentes também basearão a aplicação ou não das penas alternativas, pois, com base nas informações dos antecedentes do acusado, o juiz poderá determinar se o agente é reincidente, se costuma praticar delitos com habitualidade ou se tem personalidade voltada para o crime.

Da mesma forma deve ser considerada a conduta social do agente e sua personalidade, ou seja, seu comportamento na sociedade e comunidade em que vive, o nível de periculosidade que este apresenta no convívio social, o grau de agressividade, suas qualidades morais. Com base nesses elementos o juiz verificará se a substituição será socialmente recomendável; caso não seja aconselhável, o juiz de acordo com a conduta social do agente poderá fazer a dosimetria da pena, a fim de individualiza-la ao seu agente e em relação à gravidade do fato delituoso.

Do mesmo modo, serão examinados os motivos e circunstâncias do crime, para aferir-se a possibilidade de suprir as penas privativas de liberdade pelas restritivas de direitos.

Nos motivos do crime traça-se um perfil psicológico do agente, com o fito de saber se este agiu por motivos torpes, egoísticos, se por inveja, com ódio, se por piedade, ou em razão de necessidade. Constatando-se os motivos, por que razão originou o resultado do crime, também de afere a culpa do agente.

Por circunstâncias do crime a doutrina entende como sendo:

Assim, em doutrina, temos que circunstâncias consistem em particularidades acidentais a que se acrescentam as condições essenciais para a existência do delito, tendo como efeito a modificação da valoração legislativa da quantidade do próprio delito relativamente à ameaça penal. Permanece o delito invariável quanto ao título, porém, a sua quantia em gravidade aumenta ou diminui por força da circunstância. Tal ocorre em razão de que, no delito-base, eleva-se ou diminui-se o grau de negação dos valores éticos tutelados pela lei.5

Assim, as circunstâncias poderão ser agravantes ou atenuantes, ou seja, poderão ser circunstâncias de aumento e diminuição de pena. Podem agravar a pena as circunstâncias: de reincidência; os motivos que levaram o resultado do crime (fútil, ódio, vingança); o concurso de pessoas. Podem diminuir a pena as circunstâncias: ser o agente menor de vinte e um anos quando do cometimento do crime; o desconhecimento da lei; pelos motivos que resultaram a infração (estado de necessidade, coação, confessando à autoridade a autoria de crime).

Todos os pressupostos elencados no artigo 44 do Código Penal devem, no momento da substituição das penas restritivas de liberdade em restritivas de direitos, ser analisados conjuntamente, a fim de que as penas alternativas não sejam aplicadas ao acaso, para condenados que não preencham por completo todos os critérios balizados para a substituição.


Lei 9.099/95 – Juizados Especiais Criminais: breves apontamentos

A Lei 9.099/95 permitiu com a adoção de penas alternativas, a substituição ao rigor desempenhado para os crimes de menor potencial ofensivo, em que antes eram sujeitos à pena de prisão, impondo, portanto, uma nova sistemática de punição para os crimes leves, pressupondo uma compatibilização entre a pena e o delito cometido.

O objetivo proposto pela Lei 9.099/95 é de despenalizar os crimes de menor relevância, substituindo a pena de prisão por penas alternativas; outra proposta foi de aliviar as Varas Criminais, a fim de que estas pudessem solucionar apenas os crimes graves; além de ‘desafogar’ o sistema carcerário.

Não por acaso um dos principais objetivos da adoção dos Juizados Especiais Criminais acabou não alcançando o resultado esperado, qual seja: diminuir substancialmente a carga de trabalho das Varas Criminais Comuns, viabilizando uma maior atenção para os casos considerados graves. (...) A possibilidade de ver realmente resolvido seus problemas por um órgão estatal estimulou a população carente a apresenta-lo, revertendo a tendência natural da omissão. Deste modo, a demanda reprimida por vários anos explodiu no Poder Judiciário pela via dos Juizados.6

Todavia, a população ansiosa por um sistema penal que pudesse resolver seus problemas rapidamente, e que, anteriormente eram omissas no dever de denunciar ante a morosidade da justiça começaram a procurar os Juizados na expectativa de punição, ocorrendo, assim, um aumento de denúncias. Sobre esta questão Raúl Cervini assevera:

As conclusões foram surpreendentes: uma entre duas pessoas admitiu ter sido vítima de um delito durante o ano anterior ao dia da pesquisa (1975), mas somente 22% denunciou o fato, circunstância indicadora de que 4 entre 5 delitos permaneceram na cifra negra e não chegaram ao conhecimento da autoridade (pelo menos mediante delação da vítima). Solicitados a informar as razões que o inibiram a recorrer à autoridade acerca dos fatos, 45% disseram que, levando o fato ao conhecimento da autoridade “só se perde tempo, e as autoridades não fazem nada” .7

Este anseio de solução dos litígios se deu em virtude da rapidez em que os processos são julgados nos Juizados Especiais Criminais, visto que os processos sob sua apreciação procuram orientar-se pela simplicidade, garantindo maior agilidade e prestação eficaz aos danos sofrido pela vítima. Assim, os atos são praticados atendendo a oralidade, informalidade, economia processual e celeridade. A intenção é de que o lapso temporal do fato e da aplicação da pena seja o mais célere possível.

Os atos processuais nos Juizados Especiais Criminais comumente têm seu término logo na primeira audiência. Os crimes considerados de ação condicionada à representação são encerrados pela conciliação, restando esta infrutífera, ouve-se as testemunhas e realiza-se a transação penal em segunda audiência. Os crimes de ação penal incondicionada são submetidos à transação penal ou suspensão condicional do processo na primeira audiência, pois em geral são os crimes praticados contra o Estado. Não sendo possível aplicar a proposta alternativa, em virtude da ausência do autor do fato, ou não estando este de acordo com os requisitos necessários para aplicação da pena restritiva de direito, o Ministério Público oferece denúncia, o que gerará a Ação Penal propriamente dita, em que poderá ser dada a possibilidade de aplicação imediata de pena não restritiva à liberdade.


CONCLUSÃO

A aplicação das penas alternativas vem sendo considerada por grande parte da doutrina e dos aplicadores do direito como a solução para o sistema penitenciário, pois possibilita a regeneração do condenado no convívio social e familiar, evitando o aprisonamento daqueles infratores que tenham cometidos crimes, considerados pela lei, como de menor potencial ofensivo.

Todavia, as penas alternativas não apresentam redução ao número da população carcerária, como grande parte da doutrina afirma. Sua eficácia se projeta para o aspecto social e psicológico, no sentido de se reparar o infrator no tratamento comunitário; contudo, sob o aspecto econômico não tem se demonstrado a solução do sistema carcerário, pois a substituição se dá apenas para os crimes de menor potencial ofensivo e que não geram a prisão do condenado. Desta forma, não há que se falar em redução da massa carcerária com a aplicação das penas alternativas.

Sendo assim, algumas propostas podem ser apontadas:

1. Possibiliar o incentivo à adoção das penas alternativas, apenas nos casos em seja demonstrada sua viabilidade na recuperação do condenado.

2. Criar mecanismos de fiscalização ao efetivo cumprimento das penas alternativas e, em não sendo cumprida a medida, a conseqüente conversão em pena restritiva de liberdade, no caso de injustificado descumprimento, garantindo a aplicação da lei e desmistificação do sentimento de impunidade que gera as penas alternativas.

3. Incentivo aos projetos de profissionalização aos encarcerados, fazendo com que o tempo ocioso em regime fechado seja completado de forma saudável, possibilitando também ao condenado uma forma de sustento quando estiver novamente às ruas.

4. Incentivo da participação da sociedade, seja na fiscalização do cumprimento das penas alternativas, como no trabalho junto às penitenciárias com trabalhos educativos e profissionais.

5. Realização de programas de formação, aperfeiçoamento e profissionalização voltados aos agentes carcerários, proporcionando-lhes condições de ressocilização.

6. Ampliação da capacidade carcerária, a fim de que se possa receber a demanda que lhe é destinada.

7. Programas destinados a assistência à vítima, possibilitando a recuperação emocional, que lhe é retirada em virtude do crime, por meio de psicólogos.

8. Programas de assistência ao condenado por meio de tratamento psicológicos e psiquiátricos, a fim de que se conscientize da conduta delituosa, e possa regenerar-se para o convívio em sociedade.

9. Criação de mais Casas de Albergados e o aprimoramento da fiscalização do cumprimento deste regime e o aperfeiçoamento de programas que destinem-se à recuperação do condenado. Assistência Jurídica junto as penitenciárias, a fim de garantir que presos que já tenham cumprido sua sentença sejam liberados, ou que possam regredir de regime, conforme determina a lei.

10. Intensificação das entrevistas pela Comissão Técnica de Classificação, inclusive para os réus beneficiados com as penas alternativas.



[1] CRUZ, Walter Rodrigues. As penas alternativas no direito pátrio. São Paulo: Editora Direito, 2000. p. 86.

[2] CRUZ, op. cit., p. 107.

[3] CRUZ, op. cit., p. 119.

[4] CRUZ, op. cit., p. 124 e 125.

[5] CRUZ, op. cit., p. 147.

[6] SILVA, José Alfredo de Paula. Juizados Especiais Criminais: expectativas e frustrações. Teresina: Jus Navigandi. Disponível em: http/www.jus.com.br/artigos jurídicos. Acessado em 23 de agosto de 2006.

[7] CERVINI, Raul apud, SILVA, loc. cit.

Sobre o(a) autor(a)
Érica Maria Sturion de Paula
Advogada. Graduada em Direito pela Unopar. Possui pós graduação em Direito Penal e Processo Penal pela UEL/PR.
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