Audiência Preliminar e suas controvérsias

Audiência Preliminar e suas controvérsias

Disserta acerca das vantagens e desvantagens da audiência preliminar.

A reforma do código de processo civil de 1994 introduziu na sistemática processual a figura da audiência preliminar. Esta tem como requisitos de validade a não ocorrência de algumas hipóteses, tais quais, de extinção do processo (art. 329 CPC), previstos nos casos de indeferimento da petição inicial, quando o processo ficar parado por mais de um ano por negligencia das partes, quando não promover os atos e diligencias que lhe competir, o autor abandonar a causa por mais de 30 dias, quando se verificar a ausência dos pressupostos de constituição e de desenvolvimento do regular do processo, quando o juiz acolher a alegação de perempção, litispendência ou coisa julgada, quando não concorrer quaisquer das condições da ação, pela existência de convenção de arbitragem, quando o autor desistir da ação, quando a ação for considerada intransmissível por disposição legal, quando ocorrer confusão entre o autor e o réu, quando o réu reconhecer a procedência do pedido, quando as partes transigirem, quando o juiz pronunciar a decadência ou a prescrição ou quando o autor renunciar ao direito sobre que se funda a ação, e de julgamento antecipado da lide (art. 330 CPC), ocorrendo nos casos em que a questão de mérito for unicamente de direito ou sendo de direito e de fato, não houver necessidade de produzir prova em audiência e quando ocorrer os efeitos materiais da revelia.

Além da não ocorrência dessas hipóteses é necessário avaliar ainda se a causa versa sobre direito que se admite transação. São direitos que não se admitem transação (art. 82 CPC) as causas em que há interesse de incapazes, nas causas concernentes ao estado da pessoa, ao pátrio poder, tutela, curatela, interdição, casamento, declaração de ausência e de última vontade, nas ações que envolvam litígios coletivos de terra rural e nas demais causas em que há o interesse público evidenciado pela natureza da lide ou qualidade da parte.

Verificada esta etapa, o juiz designará a audiência preliminar a se realizar no prazo de 30 dias para qual serão as partes intimadas a comparecer, podendo fazer-se representar por procurador ou preposto, com poderes para transigir. Note que quem é intimada é a parte, podendo ir sozinhas, acompanhadas de seu procurador ou fazer-se representar por seu procurador, neste último caso é fundamental que o procurador tenha poderes para transigir, pois caso contrário, a audiência não se realizará, passando-se para a fase processual seguinte.

Existe a possibilidade de as duas partes estarem presentes à audiência e não chegarem a um acordo, de alguma delas ou as duas faltarem ou estar presente somente o procurador e este não ter poderes para transigir. Nesses casos ou em qualquer outro que não se consiga chegar a uma conciliação, o juiz fixará os pontos controvertidos, decidirá as questões processuais pendentes e determinará as provas a serem produzidas, designando audiência de instrução e julgamento, se necessário (art. 331, §2º CPC).

O intuito do legislador ao criar a audiência preliminar foi de tentar desafogar o judiciário com processos que poderiam terminar com um simples acordo entre as partes, entretanto a eficiência deste dispositivo é questionada por alguns doutrinadores como Costa Machado (2007) que afirma que a figura da audiência preliminar representa uma duplicação de atos, ocasionando uma complicação do procedimento. O autor cita também a falta de sanção para aquele que falta a audiência, o que realmente não deve existir, mas que por vezes, estando o réu em clima de beligerância, tendo em vista a contestação e a réplica, não se encontra muito propenso a fazer acordo.

Por outro lado existem fortes defensores da audiência preliminar, como é o caso do doutrinador processualista Humberto Theodoro Júnior, que afirma que a reforma de 2002 (lei 10.444 de 07.05.2002) andou na contramão das legislações processuais mais avançadas ao retirar a obrigatoriedade da audiência preliminar com a inserção do § 3º ao artigo 331 do Código de Processo Civil. Em suas palavras:

A lei do menor esforço conduzirá um grande número de juízes a seguir a velha rotina de se marcar a audiência de instrução e julgamento sem tentar a conciliação e sem, infelizmente, efetuar a triagem que a lei destinou à audiência preliminar.”

Em análise diferenciada, peço vênia aos ilustres mestres, pois entendo ser o atual sistema uma mistura entre o tradicional direito luso-brasileiro que sempre admitiu o saneamento por meio de decisão interlocutória escrita após a fase postulatória, e o sistema germânico que adotava a audiência preliminar para, oralmente, resolver questões preliminares. Temos, então, um sistema formado por ideologias estrangeiras e aplicado em uma nação sui generis, que necessita de algo próprio, feito exclusivamente para ela. Portanto, temos uma audiência preliminar que não se resume apenas à busca pela conciliação entre as partes e a conseguinte solução do conflito, mas busca também completar a fase saneadora, onde o juiz fixará os pontos controversos, decidirá as questões processuais pendentes e determinará as provas a serem produzidas, designando a audiência de instrução e julgamento, se necessário.

Em contra partida, vemos que essa audiência de conciliação não é obrigatória, pois se as circunstâncias da causa evidenciarem uma improvável obtenção da conciliação, o juiz poderá sanear o processo e ordenar a produção de provas e designar a audiência de instrução e julgamento.

Se a análise se der de forma pontual e superficial, podemos chegar a conclusão de que o artigo 331 e seus parágrafos oferecem um instrumento importantíssimo para o direito processual Brasileiro, pois não há duvida que o magistrado possui discernimento suficiente para detectar se aquela ação é ou não é passível de conciliação e ademais, estando imbuído do sentimento inerente a sua função pública, buscando sempre a justiça e velando pela rápida solução do litígio, não se deixará levar por amenidades, generalizando sua atividade e se esquecendo de tão virtuoso instituto.

Contudo, devemos realizar uma interpretação sistemática da norma processual, visto que nosso código de ritos nada mais é que um sistema organizado. Assim, dada a existência do artigo 125, IV do mesmo diploma legal, desnecessária e ineficaz se faz qualquer tipo de audiência com o intuito único e exclusivo de se chegar a uma conciliação. Digo exclusivo porque o magistrado ainda pode realizar o saneamento do processo de forma escrita, após a fase postulatória. Não vejo, assim, qualquer sentido, friso, dada a existência do artigo 125, IV, em se perder tempo marcando uma audiência preliminar que tem como ponto culminante a conciliação se, a qualquer tempo, tem o magistrado o dever de tentar conciliar as partes.


Bibliografia

THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. 44ª ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2006.

MACHADO, Antonio Cláudio da Costa. Código de Processo Civil Interpretado. 6ª ed. – Barueri, SP: Manole, 2007.

Sobre o(a) autor(a)
Hugo Lontra da Silva
Estudante de Direito
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