Quebra de sigilo no Orkut: abertura para ações de calúnia, difamação e injúria

Quebra de sigilo no Orkut: abertura para ações de calúnia, difamação e injúria

Versa sobre a quebra de sigilo do site orkut, o que poderá gerar uma enxurrada ações de calúnia, difamação e injúria. Será que nosso ordenamento tem condições de dirimir tais ações? Como identificar os infratores?

NOTA INTRODUTÓRIA

A mídia divulgou no último dia 16 de abril, que, a Justiça Federal de São Paulo quebrou o sigilo de algumas comunidades do Site ORKUT, Site este, que, somente no Brasil, é utilizado por mais de 11 milhões de internautas, conforme dados da empresa americana Google, que comanda o Site. Esta quebra teve o intuito de investigar crimes como: racismo, nazismo e pedofilia na grande rede. Considerada como “terra sem lei”, a policia tem comemorado tal acontecimento.

Acontece que, se esta quebra de sigilo se tornar habitual, vai fazer surgir em nossos tribunais,uma enxurrada de ações de “Calunia, Difamação e Injúria”. Daí, é que, surgem as dúvidas: tem o nosso ordenamento condições de solucionar tais ações, visto que, não existem normas específicas para crimes no universo da internet? Como iremos identificar os autores dos citados crimes?

Tem este breve trabalho o intuito de tentar analisar se, os nossos tribunais poderão utilizar de forma analógica as leis constantes em nosso ordenamento, para dirimir tais litígios.


1. CONCEITUAÇÃO DE CALÚNIA

O nosso código Penal versa sobre a “Calúnia” no Capitulo V, que rege os crimes Contra a Honra, o qual é pressuposto pessoal do indivíduo. Os doutrinadores vêm classificando a honra como Subjetiva (auto-respeito, a auto-estima, o pensamento de si próprio etc.) e Objetiva (é o seu respeito no meio social, o que pensam dele a comunidade). No caso da Calúnia, o crime fere a Honra Objetiva. Consta do artigo 138 do CP, que assim é descrito: “Caluniar alguém, imputando-lhe falsamente fato definido como crime", ou seja, estará cometendo o crime de calunia quem imputar falsamente um crime a outrem, inclusive contra os mortos. Para Mirabete, o conceito de calúnia:

“...é a falsa imputação de fato criminoso a outrem”.

Dito isto, passamos a analisar a Calúnia no universo virtual, onde qualquer pessoa pode no ambiente do ORKUT na Internet, criar uma comunidade e imputar a terceiros um falso crime, este, conforme o CP, poderá pegar uma pena de detenção que vai de 6 meses a 2 anos, e multa. Também, conforme o § 1º do mesmo artigo, pune quem tendo conhecimento da falsa imputação, a propala ou divulga, coisa que na Internet é bastante fácil. Porém, como identificar o calunioso(a)? Em tese, seria fácil identificar o calunioso(a), pois o ORKUT tem na tela as informações referentes ao perfil de quem criou a comunidade. Acontece que este pode criar um perfil fictício, o que certamente dificultaria a identificação do criminoso. No caso de identificado o acusado, este pode a seu favor, utilizar da Exceção da verdade na sua defesa, salvo dispositivos contrários na lei.


2. CONCEITUAÇÃO DE DIFAMAÇÃO

Igualmente como a Calúnia, a Difamação consta do mesmo Capítulo V, e, versa sobre os Crimes Contra a Honra Objetiva, porém, neste caso, a Difamação se consuma quando se imputa a outrem fato ofensivo a sua reputação - veja artigo 139 do CP: “Difamar alguém, imputando-lhe fato ofensivo à sua reputação”, observe que a diferença esta na questão de que, na Calúnia, o fato deve ser crime tipificado no nosso ordenamento, já na Difamação, basta para que o crime seja consumado, que o fato imputado seja ofensivo a reputação de terceiros. Mirabete assim define Difamação: “...é a imputação a alguém de fato ofensivo a sua reputação”.

Como na calúnia o crime de difamação tem um campo vasto na Internet, principalmente no ORKUT, a mídia tem dado exemplos em outros países, como USA, onde mulheres estão criando Sites para caluniar, difamar ex-maridos e ex-namorados. No Brasil não é diferente, basta navegar pelo ORKUT, que vemos comunidades específicas para difamar outras pessoas.

Analogicamente, o nosso ordenamento pode ser utilizado nos crimes ocorridos na Internet, punindo os infratores com a pena de 3 meses a 1 ano de detenção e multa, ficando somente sem solução a questão da identificação do difamador (a). Em regra, este crime não admite Exceção da Verdade, salvo para funcionários públicos, quando a ofensa for relativa ao exercício de suas funções.


3. CONCEITUAÇÃO DE INJÚRIA

Também situado no capítulo V do CP, a Injúria é um crime Contra a Honra, porém, Subjetiva, pois a ofensa é dirigida a dignidade ou ao decoro de alguém. O artigo 140 do CP diz: “ Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro." O professor Paulo Jose da Costa Jr., assim conceitua Injúria: "É a palavra ou gesto ultrajante, mediante o qual se ofende o sentimento de dignidade alheio (honra subjetiva). Não se trata mais, como na difamação de atingir a honra exterior da vítima, a reputação e o conceito de que goza na comunidade. Trata-se, sim, de ofender a dignidade e o decoro.”

Este crime também é bastante praticado no universo virtual, principalmente no ORKUT. O nosso ordenamento pode claramente ser utilizado de forma analógica, neste tipo de crimes no universo da Internet, no qual poderá ser apenado com detenção de 1 a 6 meses ou multa.


4. A IDENTIFICAÇÃO DO ACUSADO NO UNIVERSO VIRTUAL

Na identificação do acusado deste crimes contra a Honra, está o dilema da falta de normatização especifica para os crimes na Internet, pois, como localizar o verdadeiro Caluniador(a), Difamador(a) ou Injuriador(a)?

Para a doutrina, esta identificação necessita de apoio dos provedores, dos donos dos Sites, etc., pois, para conectar-se, o computador deve estar ligado a um provedor, conforme Ricardo Alcântara Pereira que diz: “Portanto, o provedor de acesso é uma espécie de ponte para a Internet, é um computador provendo a conexão entre duas redes, dois sistemas de informática”.

Dito isto, fazer com que a pessoa ao adentrar o site se identifique, é primordial para a solução deste problema jurídico, pois, como irá, a vítima reclamar? Cabe aos provedores e donos de Sites, criarem uma forma de identificar, se não o usuário, o computador onde este acessou a rede, informações que podem levar a policia a localizar tal infrator.


5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Após analisarmos os crimes contra a Honra, vemos que se a quebra de sigilo do ORKUT, transforma-se em jurisprudência, os nossos tribunais receberão uma enxurrada de ações, com o propósito de punir tais abusos, que, rotineiramente, as pessoas que acessam a grande rede, podem presenciar.

Entretanto, necessita o nosso ordenamento, de leis específicas, no que tange à questão de identificar as pessoas que utilizam os Sites, principalmente o Orkut, pois, nos crimes propriamente dito, o nosso ordenamento regula tranqüilamente.

No nosso entendimento, a solução está na exigência por parte dos provedores e donos de Sites de uma prévia identificação dos usuários, e, também, uma forma de identificar o computador no qual o usuário fez a conexão. Desta forma acredito que os usuários da rede irão pensar duas vezes antes de cometer infrações.

Acredito, também, que já passa da hora de fazer com que a internet seja um universo com leis, pois é normal que o Direito espere os acontecimentos para depois tentar regulá-los, porém, no que se refere a Internet , o universo é bastante rápido e se demorarmos ainda mais, pode ser que não consigamos mais controlá-lo.


6. REFERÊNCIAS

MIRABETE, Julio Fabbrine, Manual de Direito Penal, 24. ed. – São Paulo: Atlas, 2006.

BLUM, Renato Opice Coordenador, Ricardo Alcântara Pereira, Direito Eletrônico,Bauru, São Paulo: Edipro, 2001.

REINALDO FILHO,Demóclito, Direito da Informática:Temas polêmicos – Bauru, SP: Edipro, 2002.

COSTA JÙNIOR, Paulo José da, Direito Penal: Curso Completo. 6ª Ed. – São Paulo: Saraiva. 1999.

RAMALHO TERCEIRO, Cecílio da Fonseca Vieira. O problema na tipificação penal dos crimes virtuais – Jus Navigandi, Teresina, ª 6, nº 58, Ago, 2002. Acesso em: 10 Abr. 2006.

VEJA, Editora Abril, edição 1951 – ano 39 – 14, 12 de Abr. de 2006.

www.globo.com/fantastico, programa 16 Abr.2006. Acesso 30 de Abr. 2006.

Sobre o(a) autor(a)
Marlon Nogueira Flick
Bacharel em Direito, ADVOGADO
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