Direito Ambiental: Dos princípios à sua aplicabilidade

Direito Ambiental: Dos princípios à sua aplicabilidade

Para que o Direito Ambiental tenha aplicabilidade e efetividade, é importante que, além da ciência das legislações ambientais, sejam do senso comum seus princípios, pois são estes as normas que orientarão sua compreensão, aplicação e integração.

1 – Introdução

O Direito Ambiental é um incipiente ramo do direito que surgiu da necessidade do homem proteger a si mesmo, o próximo e o ambiente em que vive das possíveis degradações que suas atividades laborais ou quaisquer outras formas de interação entre ele e a natureza viessem a provocar nesta última.

Derivado do latim principium que quer dizer origem, os princípios são a base do ordenamento jurídico e verdadeiros norteadores dos legisladores na confecção de novas legislações, dos próprios aplicadores do direito no exercício da profissão e das pessoas que se relacionam com o meio ambiente, seja o explorando economicamente ou apenas usufruindo seus bens naturais para o lazer. Assim, para que o Direito Ambiental tenha aplicabilidade e efetividade, é de capital importância que, além da ciência das leis e das demais legislações ambientais, sejam do senso comum seus princípios fundamentais, pois são estes as normas de valor genérico que orientarão sua compreensão, aplicação e integração ao sistema jurídico como um todo, estando tais princípios positivados ou não. Esse trabalho procurará explicitar e definir os princípios do Direito Ambiental, enfocando sua aplicabilidade, visto que nada adiantaria tê-los no mundo jurídico se não fossem respeitados e postos no mundo real.


2 – Princípio do Direito Ambiental

O Direito Ambiental está amparado por princípios próprios, específicos e interligados entre si, devido à relevância e à magnitude de seu objeto de proteção: o meio ambiente. Aqui se enumerarão os mais relevantes.


2.1 – Princípio da supremacia e indisponibilidade do interesse público

Imaginar que o meio ambiente não interfere na vida da sociedade é o mesmo que afirmar erroneamente que não há qualquer relação entre os músculos e os ossos de um ser humano. Os dois convivem sob uma íntima relação de dependência e ajuda recíproca. O ser humano, a partir de sua capacidade de adaptação, de seu instinto de sobrevivência, de seus interesses, necessidades e caprichos, modifica, melhora e degrada o meio ambiente. No entanto, não se pode permitir que o homem degrade ou polua a natureza de forma incondicional e desregrada, pois o meio ambiente tem caráter coletivo, in verbis:

Art.22 da Constituição Federal de 1988 - Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defende-lo e preserva-lo para as presentes e futuras gerações (grifo nosso).

A Constituição vai mais adiante, restringe a atuação do homem, dando parâmetros para seu desenvolvimento quando fala que a ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observado o princípio da defesa do meio ambiente (art.170 da CF/88). Portanto a defesa do meio ambiente, intrínseco interesse público, é ao mesmo tempo direito e obrigação da coletividade, sendo que o Estado não poderá se omitir de tal obrigação, caracterizando assim sua indisponibilidade.


2.2 – Princípio da obrigatoriedade da intervenção estatal, da proteção e educação ambiental

Princípio também ancorado no art 225 da CF vem enfatizar o caráter público da necessidade de um meio ambiente ecologicamente equilibrado, enquadrando as normas ambientais como de ordem pública que devem ser observadas obrigatoriamente por todos, Poder Público e sociedade. No art. 2º da Lei nº 6.938/81, o legislador estabeleceu que o Poder Público deve ter uma Política Nacional do Meio Ambiente justamente para direcionar e organizar essa sua função obrigatória de proteger a natureza, assegurando condições ao desenvolvimento sócio-econômico, aos interesses da segurança nacional e à proteção da dignidade da vida humana.

Não pode a Administração Pública omitir-se de adotar certas medidas de sua competência para proteger o meio ambiente, sob pena de responsabilidade civil por omissão e criminal pelo tipo de prevaricação. Uma das maneiras que o Poder Público pode intervir na preservação do meio ambiente é com a educação ambiental (art. 225, §1º da CF/88). Com ela, o Poder Público, em todos os níveis de ensino, poderá informar como o meio ambiente pode ser utilizado sem que haja sua degradação irreversível, quais os habitats que nunca poderão ser alvos da atividade humana, os modos de preservação da natureza, conscientizando a sociedade para a preservação do meio ambiente.


2.3 – Princípio da participação, da cooperação nacional e internacional.

Como o direito a um meio ambiente sadio é obrigação também da coletividade, esta tem inúmeras formas de defender seus interesses. A participação, conseqüência natural da cidadania, é prevista das mais diversas formas e em vários diplomas legais, por exemplo: na elaboração de leis; nas políticas públicas através de audiências públicas e no controle jurisdicional através de medidas judiciais como ação civil pública, mandado de segurança coletivo, mandado de injunção e ação popular. Não só no âmbito individual deve existir essa participação para a concreção da Política nacional do meio ambiente, as autoridades públicas também terão que participar, na medida de suas competências e atribuições, cooperando para que a preservação ambiental seja uma realidade no âmbito nacional e internacional.

Sendo a proteção do ambiente um interesse coletivo e a amplitude da repercussão do possível dano ambiental incalculável, é imprescindível a cooperação entre os direta e indiretamente relacionados com o objeto a ser preservado, ou seja: todas as esferas do governo nacional, a sociedade, organizações internacionais e Estados estrangeiros.


2.4 – Princípio da prevenção ou precaução e da obrigatoriedade da avaliação prévia em obras potencialmente danosas ao meio ambiente

Devido à dificuldade, à impossibilidade ou, até mesmo, à irreversibilidade de alguns danos ambientais, é preferível que tais danos não ocorram. Portanto é imprescindível que haja a sua prevenção. Várias são as formas de prevenção, por exemplo: o artigo 225, §1º, IV da Constituição Federal exige o Estudo de Impacto ambiental (EIA); em Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento de 1992, se defendeu que “De modo a proteger o meio ambiente, o princípio da precaução deve ser amplamente observado pelos Estados, de acordo com as suas necessidades, assim, quando houver ameaça de danos sérios ou irreversíveis, a ausência de absoluta certeza científica não deve ser utilizada como razão para postergar medidas eficazes e economicamente viáveis para prevenir a degradação ambiental”.

Respaldado no princípio da precaução, o princípio da obrigatoriedade da avaliação prévia em obras potencialmente danosa ao meio ambiente surgiu com o escopo de limitar as obras que irão degradar de qualquer forma o meio ambiente, permitindo somente a efetivação daqueles empreendimentos essenciais para o desenvolvimento econômico e social da coletividade e que não comprometam demasiadamente o meio ambiente, seja por ter menor impacto ambiental ou porque o empreendedor irá adotar medidas que irão compensar tal degradação.


2.5 – Princípios da publicidade e da notificação

Como o meio ambiente é um bem de uso comum e de interesse público, tudo o que for realizado pelo Poder Público em prol de sua proteção deverá ter a ciência de todos. Isso se dá através da publicação obrigatórias de tais atos protetores, por exemplo: publicidade dos Estudos de Impacto Ambiental (EIA) e a existência de audiência pública para análise do Relatório de Impacto Ambiental (RIMA). Já o princípio da notificação defende que, caso ocorra um dano ambiental, o responsável, seja ele particular ou o Poder Público, tem como obrigação, sob pena de agravar sua responsabilidade, avisar a comunidade e as autoridades de sua ocorrência.


2.6 – Princípio da responsabilidade, do poluidor-pagador, compensação e reparabilidade do dano ambiental

Segundo o art.225, §3º da CF/88, “as condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, as sanções penal e administrativa, independentemente da obrigação de reparar os danos causados”. A responsabilidade pelo dano ambiental foi regulada pela Lei 9.605/98, que trata dos crimes ambientais, bem como pela Lei 6.938/81, que trata da responsabilidade objetiva do degradador. Porém seria inócuo tal princípio se somente definisse o responsável pela conduta sem penaliza-lo. Assim, o princípio reparabilidade é corolário do princípio da responsabilidade. Exemplo do princípio da reparabilidade pode-se citar o art. 4º, VII, da Lei 6.938/85 que obriga ao poluidor e ao predador a obrigação de recuperar e/ou indenizar os danos causados, surgindo então o princípio do poluidor-pagador, na qual se defende que independente de culpa ou dolo, o poluidor é obrigado a indenizar e reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros afetados por sua atividade, arcar com os custos direitos e indiretos de medidas preventivas e de controle da poluição.

Embora não expressamente previsto na legislação, o princípio da compensação surgiu como necessidade de se encontrar uma forma de reparação do dano ambiental, principalmente quando irreversível. Procura-se amenizar os danos causados ao meio ambiente com medidas que possam contrabalançar tal dano com ações positivas de preservação, por exemplo: o aterro irreversível de uma lagoa onde há vida selvagem pode ser compensado com medidas de proteção efetiva em um lugar similar, ou mesmo a restauração de uma outra lagoa próxima ou, segundo o art. 8º, da Lei 6.938/81, compete ao CONAMA, entre outras coisas, homologar acordos visando à transformação de penalidades pecuniárias na obrigação de executar medidas de interesse para a proteção ambiental. A isso se chama medida compensatória.


2.7 – Princípio da função socioambiental da propriedade, do desenvolvimento sustentável

Com o advento da Constituição Federal de 1988, a propriedade passou a ter seu uso condicionado ao bem-estar social e a ter assim uma função social e ambiental, conforme consta dos seus arts. 5º, XXIII, 170, III e 186, II. Por isso, não só para o Direito Ambiental, o uso da propriedade só pode ser concebido se respeitada sua função sócio-ambiental. Entretanto, o uso da propriedade não poderá ser degradante às gerações futuras, mesmo que seja compatível com os interesses e necessidades da geração contemporânea, visto que o meio ambiente é um bem indisponível e do uso comum, não pertencendo a ninguém de forma particular, mas a sociedade como um todo. Por isso, não tem a sociedade contemporânea o direito de privar as gerações futuras de um bem indispensável à vida humana e, principalmente, impor ao mundo um fim que poderia ser prevenido.



3 – Conclusão

Os princípios do Direito Ambiental estão, paulatinamente, caindo no senso comum e, principalmente, tendo eficiente aplicabilidade no mundo prático. Inúmeras são as demonstrações desse grande avanço, por exemplo: o zoneamento ambiental; o licenciamento; os incentivos à produção; as unidades de conservação; o sistema de informação do meio ambiente; o cadastro técnico federal de atividades e instrumentos de defesa ambiental; as penalidades disciplinares ou compensatórias  necessárias à preservação do ambiente; o Relatório de Qualidade do Meio  Ambiente anual divulgado pelo IBAMA;  a  prestação de informações; o Cadastro Técnico Federal de atividades potencialmente poluidoras e/ou utilizadora dos recursos naturais; as penalidades administrativas sofridas pelo degradador como multas, perda ou restrição de incentivos e benefícios fiscais concedidos pelo Poder Público e suspensão de atividades e a obrigatoriedade do estudo de prévio de impacto ambiental para a concessão de licenciamento.

Porém muito ainda deve ser feito para que tais princípios sejam realmente inseridos no mundo prático como condição essencial para a realização de qualquer empreendimento de caráter ambiental ou que vá interferir de alguma forma no meio ambiente, por exemplo: intensificando os meios de prevenção do dano ambiental impondo critérios mais seletivos para o licenciamento, ofertando educação ambiental de melhor qualidade, adotando penalidades mais rígidas e inflexíveis para os poluidores e agressores ambientais. Talvez assim o Direito Ambiental se torne mais presente no mundo real.



4 – Bibliografia

SEGUIN, Elida, O DIREITO AMBIENTAL: NOSSA CASA PLANETÁRIA , 2ªEd., Rio de Janeiro, Forense, 2002    

DINIZ, Maria Helena, COMPÊNDIO DE INTRODUÇÃO À CIÊNCIA DO DIREITO, 10ª ed., São Paulo, Saraiva,1998

Lei nº 6.938/1981

Constituição Federal de 1988

Sobre o(a) autor(a)
Rebeca Ferreira Brasil
Funcionária Pública da Justiça Federal no Ceará - lotada na 10ª Vara federal
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